Amigos e camaradas,
Nos dias que correm, o mundo, a economia, os estados, os povos, são dominados pelo capital financeiro, por grandes monopólios financeiros. De facto, a crescente concentração e centralização capitalista, resultante da crescente necessidade capital para produzir mercadorias, ganhou tal dimensão que ainda na passagem do Séc. XIX para o Séc. XX, os monopólios industriais sentiram necessidade de fundir o capital produtivo com o capital bancário. O desenvolvimento do comércio internacional, a exploração e controle das fontes de matéria-prima, a expansão da exploração da força de trabalho e o alargamento dos mercados, tiveram como consequência o desenvolvimento de novos monopólios, os monopólios financeiros. Esta mundialização do sistema capitalista (hoje, por muitos denominada de globalização) desenvolveu novos fenómenos de domínio e de sobre-exploração sobre os trabalhadores e os povos que ainda hoje se refletem em diferentes e novas dimensões da vida política, económica, social e cultural.
Todos temos presente vários casos que enchem páginas de jornais que são exemplificativos desse domínio e dos seus efeitos. As notícias sobre as PPP; sobre os contratos swap; sobre os escândalos do BCP, do BPN, do BPP, do BANIF, do BES; sobre a transferência e colocação de ex-governantes em grandes grupos financeiros mundiais; as imposições dos credores e dos grandes fundos de investimento que impõem e controlam as dívidas dos estados, que determinam os grandes investimentos públicos, que determinam as políticas e as opções que deveriam pertencer aos povos.
Todos temos presente os escândalos fiscais do Panamá, do Luxemburgo, dos bancos suíços, de Malta, do Liechtenstein, da Holanda, e de muitos outros paraísos fiscais, que envolvem milhares de milhões de euros de patrimónios, de transações financeiras e de rendimentos que fogem por completo ao controle e tributação pelos estados.
Todos temos presente o chamado PAEF, verdadeiro Pacto de Agressão ao país ou a agressão à Grécia e o conteúdo e imposições políticas, económicas e sociais que os empréstimos financeiros a Portugal e Grécia continham e ainda contém. Todos temos presente a influência política e económica que o Grupo Espírito Santo exercia no país, e não só! Ou a influência que o grupo Jerónimo Martins exerce sobre a produção, sobre o consumo dos trabalhadores e sobre a produção e inovação do saber. Todos temos presente a invasão do Iraque, a agressão à Jugoslávia, a ingerência e ataque à Líbia, à Síria, o cerco ao Irão, à Rússia e à China.
Todos temos presente o processo de destituição da presidente eleita por 54 milhões de brasileiros ou a provocação e ingerência na Venezuela ou, de forma mais generalizada, em toda a América Latina. Todos temos presente as provocações montadas em Angola ou na África do Sul. Não achamos estranho que, numa altura em que as reservas reais de petróleo se vão reduzindo de forma acelerada, o petróleo se mantenha a preços historicamente baixos. Todos temos presente os milhares de despedimentos todos os anos anunciados pelos diferentes grandes grupos monopolistas.
Todos temos presente os milhões de milhões concentrados num punhado de transnacionais e multinacionais e num conjunto de famílias que acumulam e concentram fortunas superiores à riqueza da maioria dos países do mundo e que diariamente compram e vendem títulos, opções, futuros, acções, dívidas, direitos e obrigações e uma miria de produtos financeiros mais ou menos sofisticados.
A título de exemplo deixo-vos apenas dois números que demonstram bem a dimensão e poder que a crescente financeirização da economia atingiu:
1) Em Setembro de 2017, o sector público, as empresas não financeiras e as famílias tinham em dívida um valor que correspondia a 380% do PIB anual português. Dessa dívida, mais de 72% foi financiada ou é contratada pelo sector financeiro ou por entidades externas – no fundamental também do sector financeiro.
2) Também em Setembro de 2017 (e estamos a falar apenas de um mês), o volume de derivados financeiros transacionados em todo o mundo foi superior ao PIB de 2017 de todo o mundo.
Camaradas,
Não poucas vezes, somos confrontados com expressões do género: o capitalismo selvagem, os empresários sem escrúpulos, a gestão danosa ou incompetente, a intervenção interesseira de determinado Estado, a gula dos grupos económicos, o abuso de poder dos monopólios, a ganância dos banqueiros, a Europa dos tecnocratas, a ausência de democracia das instituições da União Europeia, a imposição externa, nomeadamente alemã, o expansionismo americano, o imperialismo norte-americano, a financeirização da economia, a economia de casino, a especulação financeira, etc.
Tal como Marx enunciou e mais tarde Lenine sistematizou, esta realidade resulta do próprio processo de monopolização capitalista, do elevado grau de concentração capitalista e pela fusão há muito concretizada entre o capital bancário e o industrial.
Se há mais de 50 anos, em o Rumo à Vitória, Álvaro Cunhal caracterizou de forma tão detalhada a fusão do capital financeiro com o industrial em Portugal, não devemos desvalorizar que há menos de 100 anos Lénine descrevia o poder dos monopólios financeiros, a sua influência e o poder político, económico e social, pela capacidade dos grupos financeiros determinarem o financiamento e funcionamento das economias, da rede de influências económicas nas administrações do conjunto dos grupos monopolistas sectoriais, da rede de influência de eleitos e detentores de cargos políticos. Ou seja, a monopolização assume-se numa dimensão jurídica de propriedade, mas também numa dimensão de influência financeira e política.
Nesta perspetiva, facilmente enquadramos as PPP nas vias de comunicação e na saúde, as opções políticas dos sucessivos governos, a política de habitação, os constantes ataques à Segurança Social e aos direitos dos trabalhadores e o processo de privatizações e concessões na crescente monopolização e financeirização do nosso país.
Na realidade, se olharmos à nossa volta, se olharmos para o nosso país, para nossa própria realidade verificamos o poder e influência, que certa oligarquia financeira detém sobre as nossas vidas. Poder e influência que não resultam de uma qualquer ausência de ética republicana ou moral cristã dos Ulrich, Soares dos Santos, Salgados, Amorins ou Azevedos. Resultam das necessidades do próprio capital na sua fase actual. Pois se não forem estes, serão outros, portugueses ou estrangeiros. E mesmo estes escondem por trás os poderes da oligarquia financeira mundial, dos países capitalistas mais desenvolvidos e das oligarquias monopolistas desse mundo fora, norte-americanos, alemães, ingleses, franceses, holandeses, sauditas, japoneses, etc.
Esta influência é resultante do grau de monopolização das economias por via do elevado grau de concentração do capital, da transformação do capital bancário de intermediários financeiros em capital financeiro e da criação da oligarquia financeira, da exportação de capitais, da formação e associação internacional de monopolistas e outras instituições ao seu serviço, e da partilha do mundo (de forma mais ou menos formal) pelos diversos pólos e países imperialistas.
Essa influência resulta de uma financeirização tal, que o capital financeiro corrompeu praticamente todos os sectores económicos estratégicos e determinantes. As novas dimensões da vida mercantilizadas, como o entretenimento e o lazer, a saúde, a educação, a cultura e a informação, a investigação científica, a proteção social, o agro-negócio, e os serviços públicos, entre muitos outros, são nos dias de hoje alvo da referida monopolização e controlados pela oligarquia financeira.
Entretanto, o grau de concentração e dependência do capital financeiro, também nestas novas esferas da vida mercantilizadas conduziram, tal como já fora perspetivado por Marx em «O Capital» para a crescente especulação financeira como tentativa, sempre falhada, de superar a baixa tendencial da taxa de lucro resultante da crescente composição orgânica do capital (uma vez mais, gera-se um círculo vicioso, uma pescadinha de rabo na boca) com a concentração e monopolização do capital, com a aprovação de novas esferas da vida, nova concentração e monopolização... Crescente monopolização e financeirização que alarga o poder e influência da oligarquia financeira em todas as esferas económicas e sociais ultrapassando as fronteiras nacionais e sectoriais e dominando o mundo «globalizado» em constante partilha e confronto, umas vezes de forma aparentemente pacífica, outras através da violência, da agressão e da guerra, como nos exemplos que atrás referi.
Esta contradição inalienável entre a crescente monopolização e financeirização e a necessidade de cada vez mais capital para assegurar a produção, enquanto instrumento da própria acumulação, reduzindo tendencialmente a emuneração do capital investido tem conduzido e estado na origem de graves crises, tanto nas suas consequências económicas – com a destruição de capacidade produtiva e de produções –, como nas respetivas consequências sociais – com a proliferação de desemprego, dos baixos rendimentos e da própria fome.
A superação da crise e das contradições que resultam da crescente financeirização da economia, da sua crescente monopolização é o verdadeiro desafio que Marx nos deixou quando afirmou que não basta compreender o mundo, há que transformá-lo. Esta é a luta que assumimos!
A luta que promove a profunda alteração da correlação das forças socias, a luta que retira poder aos monopólios e que o transfere para os produtores, para os trabalhadores, para os povos. A construção de uma verdadeira política alternativa assente na valorização dos trabalhadores, do trabalho, dos salários, da produção, de uma economia não monopolista, de um setor empresarial público ao serviço do desenvolvimento do país, de serviços públicos ao serviço do povo, da soberania, da segurança das populações e da paz, a política patriótica e de esquerda, contributo essencial para a construção de uma democracia avançada, assente nos valores de Abril, embrião do projeto maior de construção do socialismo e do comunismo.