É conhecido que em Portugal é fomentada a estigmatização social das mulheres que recorrem ao aborto e prossegue uma utilização abusiva do aparelho policial e judicial, que está a ser posto ao serviço das investigações e julgamentos de mulheres acusadas de aborto clandestino, devido à manutenção de uma lei injusta e iníqua, desajustada da realidade social e das razões que levam as mulheres a recorrer ao aborto.
É neste quadro que se têm desenvolvido importantes acções de solidariedade internacional para com as Mulheres Portuguesas, incluindo a recente tentativa do barco holandês da organização "Women on Waves", que, inadmissivelmente, foi impedido pelo Governo português de entrar nas águas territoriais portuguesas, dificultando, assim, a realização de debates e informação em matéria dos direitos sexuais e reprodutivos.
A situação de intolerância atingiu o ridículo quando o governo português enviou duas corvetas da marinha cercar o barco da associação holandesa.
Ora, com base nas declarações da Conferência das Nações Unidas do Cairo e de Pequim, o Parlamento Europeu, na sua Resolução de 3 de Julho de 2002, recomendou aos governos que desenvolvam políticas nacionais de saúde sexual e reprodutiva de elevada qualidade, em cooperação com as organizações pluralistas da sociedade civil, prestando ampla informação sobre métodos eficazes e de planeamento familiar e garantindo a qualidade de acesso a todas as formas de métodos contraceptivos. O que não acontece em Portugal.
Igualmente se recomendou que, a fim de salvaguardar a saúde reprodutiva e os direitos das mulheres, a interrupção voluntária da gravidez seja legal, segura e universalmente acessível, exortando também os governos a se absterem, em quaisquer circunstâncias, de agir judicialmente contra mulheres que tenham feito abortos ilegais. O que também não acontece em Portugal.
É neste quadro que consideramos que a Comissão Europeia não se pode alhear da situação que se vive em Portugal, de enorme hipocrisia e violência sobre as mulheres, e que, objectivamente, favorece o negócio do aborto clandestino, arrastando as mulheres de menores recursos económicos e com menor acesso à informação, para os circuitos mais inseguros e mais perigosos para a sua saúde sexual e reprodutiva.
Esperamos, pois, que a Comissão Europeia manifeste a sua solidariedade com as Mulheres Portuguesas, se manifeste contra a intolerância e se associe às posições que o Parlamento Europeu já tomou nesta área, promovendo as necessárias acções de sensibilização na defesa e promoção dos direitos e da dignidade das mulheres.