Intervenção de João Oliveira na Assembleia de República

Não tributação em sede de IVA das transmissões de livros a título gratuito

Alarga o âmbito da não tributação em sede de IVA das transmissões de livros a título gratuito, alterando o Código do IVA, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de Dezembro.

Sr. Presidente,
Sr.ª Ministra da Cultura,
Sr.as e Srs. Deputados:
No início deste debate, importa fazer uma chamada de atenção prévia para dizer que a Sr.ª Ministra parece comportarse, no exercício das suas funções, de uma forma que merece algum reparo. Isto porque a Sr.ª Ministra não pode aparecer como solista para recolher os aplausos e as flores e, depois, no momento de crítica, esconder-se na última fila da orquestra.
Sr.ª Ministra, em relação à proposta de lei que aqui hoje nos apresenta — e queria começar por este registo, porque é o do aplauso e das flores —, o PCP está de acordo com ela.
Ainda assim, queremos deixar uma crítica, porque naquilo que diz respeito a esta matéria do livro e apesar da candura com que a proposta de lei reconhece, e cito, que «(…) no quadro da circulação comercial dos livros ocorre frequentemente a prática de destruir os livros que são retirados do mercado por, na óptica das editoras, terem esgotado o seu interesse comercial», impõe-se que, de facto, sejam tomadas medidas para obviar à destruição dos livros. Mas alerto-a para uma outra coisa, Sr.ª Ministra: a destruição dos livros é sinónimo de uma outra realidade mais preocupante, que é a da completa subordinação à ditadura do mercado, perante a inexistência de uma política séria do livro e de promoção do livro e da leitura. Se tivéssemos uma política de promoção do livro e da leitura séria, que não deixasse completamente subordinados à ditadura do mercado e à lógica comercial os livros e a criação literária no nosso País, não nos confrontávamos com a destruição de livros em Portugal.
É, pois, este repto que lhe deixo: atrás desta medida pontual, relacionada com o IVA, deve vir, da parte do Governo, a definição de uma verdadeira, rigorosa e séria política de promoção do livro, da leitura e da criação literária em Portugal.
Mas, Sr.ª Ministra, também não posso perder esta oportunidade de chamar a atenção para a necessidade de esclarecimentos, por parte do Ministério, relativamente àquilo que é, neste momento, a principal preocupação em matéria de política cultural. A Sr.ª Ministra não responde às críticas que vão sendo feitas pelas estruturas e pelos criadores artísticos e culturais no nosso País, particularmente no momento em que é da sua autoria a medida que está a causar justificada preocupação neste sector, a qual tem a ver com as restrições orçamentais e o corte de 10% em todos os apoios garantidos pelo Ministério da Cultura.
Quero informá-la, Sr.ª Ministra, porque, provavelmente não saberá, e é natural que não o saiba, que o PCP acabou de apresentar um voto em relação a estas restrições orçamentais, a estes cortes, o qual será votado, amanhã, nesta Assembleia da República, não só protestando contra os cortes e as restrições impostas mas também, obviamente, manifestando a nossa preocupação em relação às consequências que estas medidas terão no sector da cultura e da criação artística e cultural e a nossa solidariedade com todos os profissionais e estruturas do sector, que serão prejudicados por estas opções governamentais. E sabe porquê, Sr.ª Ministra? Porque entendemos que estas restrições e estes cortes são injustos, representam cortes cegos que em nada resolverão o problema da consolidação orçamental, mas determinarão, decisivamente, dificuldades a todos aqueles que contavam que o Governo cumprisse os compromissos que assumiu.
Sr.ª Ministra, estes cortes e estas restrições que o Governo está a impor poderão levar ao cancelamento de projectos, como já foi assumido, em alguns casos, prejudicando seriamente o funcionamento das estruturas do sector da cultura, e poderão até determinar alguns despedimentos e o agravamento de muitas das dificuldades que, já hoje, os profissionais deste sector sentem.
Aquilo que se impunha, Sr.ª Ministra, era exactamente o contrário: era que, também neste momento de crise, o Governo fizesse pagar pela crise aqueles que a criaram e pudesse dar um sinal de valorização daqueles que, mesmo em tempo de crise, procuram contribuir para que o destino do País possa ser outro.
Eram estes esclarecimentos e estas opções que se impunham ao Ministério da Cultura, mas, infelizmente, do Ministério da Cultura, tem havido pouca disponibilidade quer para esclarecer, quer para assumir outras opções. Mas, Sr.ª Ministra, pode contar que, da parte do PCP, terá não só a exigência desses esclarecimentos mas também a afirmação de opções alternativas, com as quais o Governo tem de ser confrontado.

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