Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

"Não jogue com as estatísticas, fale da realidade"

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No debate quinzenal realizado hoje na Assembleia da República, o Secretário-Geral do PCP afirmou que a redução do desemprego apregoada pelo governo não significa recuperação económica, significa sim emigração, porque nestes dois anos e meio, foram destruídos mais de 300 mil postos de trabalho e a consequente emigração de milhares de portugueses.

Após o Primeiro-Ministro ter proferido uma intervenção inicial, respondeu às perguntas formuladas pelos Deputados

Sr.a Presidente,

Sr. Primeiro-Ministro,

No anterior debate quinzenal, verificámos o autocontentamento e o autoelogio com aquela fezada que têm de que, finalmente, estamos no bom caminho, agora é que vai ser, incluindo com um milagre económico.

O Sr. Primeiro-Ministro, hoje, veio acenar com a proposta de parceria com vista à aplicação dos fundos comunitários, sabendo o Sr. Primeiro-Ministro que já está tudo determinado pela Estratégia 2020 e pelo impacto da redução do orçamento comunitário, com consequências, naturalmente, em relação à aplicação desses fundos.

Falou aqui de um processo, que teremos tempo de discutir na especialidade, mas fez uma referência a coisas que não deveríamos ter feito em relação à convergência. Quais eram as infraestruturas que não deviam ter sido feitas, tendo em conta as suas preocupações?

Mas, voltando ao tema desta autossatisfação e deste autocontentamento, precisamente no momento em que o Governo anunciava essa perspetiva «do amanhã que canta» já estar aí ao virar da esquina, centenas de milhares de trabalhadores, de reformados e pensionistas recebiam a notícia, através da leitura do seu recibo de vencimento, de mais um corte brutal nos seus rendimentos. Muitos ficaram em estado de choque, e usamos esta expressão concreta porque, de facto, é chocante ouvir esta maioria e um Primeiro-Ministro dizer que agora é que é, agora é que tudo vai ser, quando surge uma nova avalanche nestes cortes brutais sobre os rendimentos das pessoas.

Foi também durante este período que tivemos uma informação que gostaríamos que o Sr. Primeiro-Ministro explicasse, e explicasse de uma forma clara.

Já sabíamos das vossas opções em relação às PPP, em relação aos swaps e em relação aos apoios e aos negócios que têm sido feitos — faz-se por opção! —, mas vêm sempre com argumento da distribuição dos sacrifícios equitativos. Ora, o Tribunal de Contas informou que este Governo ocultou benefícios fiscais no valor de 1045 milhões de euros dados às chamadas SGPS, sociedades gestoras de participações sociais, que controlam as empresas dos grandes grupos económicos. Ou seja, Sr. Primeiro-Ministro, falamos de um valor superior aos cortes nas pensões, nas reformas e nos salários da administração política.

Sr. Primeiro-Ministro, como é que justifica, perante a Assembleia, mais esta escandalosa benesse dada, maioritariamente, a um escasso número de grandes grupos económicos quando, ao mesmo tempo, vem impondo pesadíssimos sacrifícios a quem trabalha ou quem vive da sua reforma e da sua pensão? Não é uma acusação que parte do PCP, é uma afirmação feita pelo próprio Tribunal de Contas. Explique esta contradição! Se não explicar — e pode não o fazer —, acabou essa conversa de que os sacrifícios estão a ser distribuídos equitativamente. Não! Quem sofre é a maioria dos trabalhadores, quem beneficia é o grande capital financeiro.

(…)

Sr.ª Presidente,

Sr. Primeiro-Ministro,

Para poupar despesa ao Estado e para o Sr. Primeiro-Ministro ter esta informação, dar-lhe-ei uma cópia do relatório do Tribunal de Contas que diz, precisamente, «com destaque para a omissão de 1045 milhões em IRC por benefícios atribuídos às SGPS…»

Sr.ª Presidente, fornecerei este documento para que os serviços de assessoria do Sr. Primeiro-Ministro funcionem melhor!

Mas, Sr. Primeiro-Ministro, vai ter de responder, porque esta é uma questão de fundo. O Sr. Primeiro-Ministro pode dizer que é opção política do Governo, que é opção governativa. Seja! Mas, como demonstra este exemplo concreto, não pode mentir aos portugueses quando afirma que os sacrifícios estão a ser repartidos de igual forma por todos.

Quanto às outras questões que levantei, Sr. Primeiro-Ministro, quero dizer-lhe que redução do desemprego não significa recuperação, significa emigração.

A questão de fundo é que, durante estes dois anos e meio, em termos líquidos, foram destruídos cerca de 300 000 postos de trabalho.
Portanto, não jogue com as estatísticas, jogue com a realidade, Sr. Primeiro-Ministro! E aquilo que o senhor está aqui a fazer é, de facto, um exercício estatístico que não corresponde à realidade que vivemos.

Gostaria de terminar com a seguinte observação: o Sr. Primeiro-Ministro veio, mais uma vez, insinuar que não vamos voltar ao que era nem à riqueza ilusória. O Sr. Primeiro-Ministro estava a falar de quem? Quem é que viveu acima das possibilidades? Foram os reformados e os pensionistas? Foram os trabalhadores da Administração Pública? Foram os trabalhadores do setor privado? Foram estes que viveram acima das suas possibilidades? Ou foram aqueles que têm particulares responsabilidades na crise e que, neste momento, como se verifica por esta nota do Tribunal de Contas, os senhores continuam a engordar, a quem os senhores continuam a encher os bolsos, a aumentar as fortunas, exigindo sempre sacrifícios aos mesmos do costume, que nunca viveram acima das suas possibilidades?

É esta a questão de fundo!

O Sr. Primeiro-Ministro é livre de fazer essa opção, mas fique sabendo que consideramos que isto só lá vai com a demissão deste Governo e com uma rutura com esta política.

Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, não faça planos para mil anos. Muitas vezes, o Governo esquece que quem decide, quem tem a última palavra, é sempre o povo português, e essa opção há de sair-lhe cara.

(…)

Por isso é que os 25 mais ricos aumentaram as suas fortunas!…

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