«O meu povo resiste porque quer viver»

Entrevista a Fayez Badawi, da Frente Popular para a Libertação da Palestina - Avante Edição Nº2233  -  15-9-2016

Libertação da Palestina. Em entrevista ao Avante!, sublinhou que só a unidade das forças de esquerda palestinianas e árabes e a intensificação da resistência popular poderão pôr fim à ocupação israelita e alcançar a independência da sua pátria e a emancipação do seu povo.
Há muito que Fayez Badawi participa na Festa do Avante! enquanto representante da Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP), mas pela primeira vez teve a seu cargo um pavilhão próprio no Espaço Internacional, o que lhe permitiu, e aos camaradas que o acompanharam, contactar com milhares de pessoas.

Como é que a FPLP avalia a actual situação da ocupação sionista da Palestina?
Antes de começar a responder a essa questão, gostava de saudar o povo português pela sua constante solidariedade com a Palestina e, através do Partido Comunista Português, um partido irmão, queria expressar o meu carinho e apoio a este grande povo, o povo de Abril.
A situação da Palestina, como a de Portugal e de todos os outros países, está ligada à actual fase da crise do capitalismo, que recorre à guerra e ataca os trabalhadores e os mais pobres, como é evidente na UE com as chamadas políticas de austeridade. No caso concreto da Palestina, a situação é bastante complicada devido à existência do Estado fascista de Israel que, é bom não esquecer, é uma fabricação do capital concretizada por colonos vindos da Europa. A vida do meu povo é realmente dramática, a todos os níveis.

Podes especificar?
Como bem sabem em Portugal, o meu povo está disperso desde 1948. Há milhares de refugiados na Síria, na Jordânia e no Líbano, muitos dos quais vivem em condições dramáticas. Na Síria, onde os refugiados palestinianos eram tratados exactamente como os sírios e tinham os mesmos direitos à educação e à saúde, eles sofrem hoje precisamente o que sofre o povo sírio: muitos estão uma vez mais refugiados devido à guerra que se trava no país, que não é uma guerra civil, mas uma agressão imperialista sustentada nos seus lacaios do chamado «Estado Islâmico» e da Al-Qaeda.
Existem ainda os designados «árabes israelitas», que na verdade são palestinianos, os que vivem sob ocupação na Cisjordânia e os que estão confinados àquele que é o maior campo de concentração da história, a Faixa de Gaza. E há ainda a fome, o cerco, as perseguições... É uma situação inumana, mas o meu povo resiste porque quer viver.
O que os palestinianos querem é uma paz real e isso choca com a atitude e a existência de Israel. A este respeito, quero condenar – não criticar, mas condenar! – a política da União Europeia, que «mima» o Estado de Israel, apesar de todas as violações e violências que pratica contra a Palestina e o seu povo. Mas posso garantir-te que resistiremos até ao fim!

Como fica claro pelo vosso pavilhão na Festa, a questão dos presos é uma importante vertente da actividade da FPLP. Qual a situação dos presos palestinianos em Israel e que perspectivas existem para a sua libertação?
A situação dos presos é dramática. São tratados pior do que animais, pois não têm direito a nada, e são sujeitos a prisões administrativas, a torturas e a situações de isolamento prolongado. Israel aplica métodos fascistas, como a possibilidade de condenar uma criança a 20 anos de prisão por atirar pedras e de deter administrativamente qualquer pessoa sob qualquer pretexto.
Por exemplo, Bilal Kayed é um jovem de 35 anos, que se encontra preso há 20, e que teve a firmeza de fazer uma greve de fome de 71 dias, à qual se juntaram outros camaradas. O seu lema foi «vitória ou morte» e venceu! Hoje já não se encontra em isolamento e recebe visitas de familiares, o que é uma conquista.
A FPLP vai iniciar uma campanha de apoio aos presos e de exigência da sua libertação, para a qual pede o apoio dos partidos comunistas e de esquerda. Aproveito para agradecer de coração a postura do PCP, que denunciou no Parlamento Europeu a situação do nosso camarada Bilal Kayed e dos restantes presos palestinianos.
Nos últimos anos, alargou-se o reconhecimento da Palestina por parte de vários países e organizações internacionais, como a UNESCO e a própria ONU, na qual tem hoje o estatuto de observador não-membro. Esta realidade teve algum impacto positivo na vida diária dos palestinianos?
O maior êxito não o nomeaste, camarada, e é o facto de termos resistido. É o único verdadeiro sucesso. Apesar de toda a barbárie, vivemos e resistimos. Vivemos no exílio, sob ocupação, com fome, na miséria, mas resistimos como povo e conseguimos proteger a nossa cultura, a nossa língua e a nossa identidade. E isto é muito importante.
Geração após geração, o nosso povo continua zeloso dos seus direitos, as nossas crianças e os nossos jovens estão cada dia mais comprometidos com a causa do seu povo pelo direito a retornar à sua pátria livre. Não haverá paz sem o regresso dos refugiados palestinianos à sua terra. Nós temos uma solução justa: um Estado laico e democrático em todo o território da Palestina para todos quantos aí desejem viver em paz.

Que caminho aponta a FPLP para alcançar a independência da Palestina?
O primeiro ponto essencial para nós é a recuperação da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), que se encontra sequestrada pela direita reunida na Autoridade Nacional Palestiniana que, lembre-se, é uma criação dos Acordos de Oslo [que a FPLP nunca aceitou] e não representa os interesses do povo. A Autoridade Nacional Palestiniana foi criada precisamente para se substituir à OLP.
Uma segunda questão muito importante prende-se com a necessidade de alcançar a unidade do povo palestiniano, o que implica o Hamas e a Fatah deixarem de lado os seus diferendos e esforçarem-se por aplicar um programa comum de defesa do nosso povo. Estamos dispostos a pagar qualquer preço para alcançar pontos de convergência visando a unidade nacional contra a ocupação.

Que pontos serão esses?
Questões muito objectivas, mas essenciais, que se prendam com a forma de realizarmos eleições, de organizarmos a resistência, de desencadearmos o levantamento popular. Na FPLP pretendemos ainda trabalhar para a unidade da esquerda palestiniana, árabe e mundial. Se não houver solidariedade e colaboração internacional estamos todos perdidos, no meu país mas também na América Latina ou na Europa.
Mas acredito que o triunfo final será nosso. Tal como o Vietname derrotou os EUA e a Argélia se livrou do jugo colonial francês, também o povo da Palestina conseguirá libertar-se, através da solidariedade, do boicote e da sua própria resistência.

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