Intervenção de Bernardino Soares na Assembleia de República

Mensagem do Presidente da República sobre os gastos nas campanhas eleitorais

Mensagem do Presidente da República sobre o Decreto da Assembleia da República n.º 66/XI , que reduz as subvenções públicas e os limites máximos dos gastos nas campanhas eleitorais (terceira alteração à Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,
É preciso lembrar, neste momento, que o PCP votou contra esta alteração à lei do financiamento dos partidos por duas razões fundamentais.
A primeira tem a ver com uma insuficiente redução das subvenções aos partidos, quer da subvenção ordinária anual, em relação à qual o PCP era o único a propor a sua diminuição, quer das subvenções eleitorais e dos respectivos limites de despesa de campanha eleitoral.
O facto de PS e PSD só terem permitido que o corte fosse de 10% constitui uma das razões pelas quais não estivemos de acordo com esta alteração.
Mas, pelos vistos, de acordo com a sua mensagem, o Presidente da República está de acordo e considera suficiente este corte de 10%, porque não faz qualquer reparo à sua insuficiência — sobretudo, num momento em que são impostos, também com o apoio do Presidente da República, inaceitáveis sacrifícios à generalidade dos portugueses…!
Cavaco Silva está, portanto, de acordo em que apenas se corte 10% nestas subvenções aos partidos e às campanhas eleitorais!… E bem se compreende que assim seja, porque a campanha de Cavaco Silva, nas últimas eleições, foi de longe a mais gastadora de todas as campanhas presidenciais!
E mesmo agora, com a propaganda de usar só metade do limite das campanhas eleitorais, eu gostaria de dizer que se tivesse sido aprovada a norma do PCP sobre essa matéria, ainda assim, Cavaco Silva estaria acima do limite que propomos para despesas de campanhas eleitorais!
Portanto, quanto a corte na despesa, o Presidente da República tem uma posição recuada, como têm o PS e o PSD.
A segunda razão pela qual votámos contra foi a da falta de alterações essenciais a esta lei. É porque esta lei continua a ser altamente constrangedora e inaceitável para partidos como o PCP, cuja actividade dos seus militantes, as suas iniciativas, como é o caso da «Festa do Avante», gera receitas, as quais são do mais digno e transparente que há em democracia, porque são provenientes da actividade política, de iniciativas que estão à vista de todos, que são fiscalizadas, que são transparentes e que nada têm a esconder.
Depois, o Sr. Presidente da República fez as habituais considerações, em sentido restritivo, em relação à autonomia dos partidos, sempre com o princípio de que os partidos são culpados até prova em contrário — é este o princípio das observações do Presidente da República —,
dizendo, por exemplo, que há um perigo muito grande pelo facto de, agora, os candidatos, em pé de igualdade com os eleitos, poderem contribuir para as campanhas.
Mas, então, o Sr. Presidente da República não reparou que também eles estão obrigados a titular essas receitas, por cheque ou transferência bancária, e que, portanto, elas são todas identificáveis?!…
Mas, então, o Sr. Presidente da República não reparou que também se aplica aos candidatos um limite muito baixo em relação à receita em numerário?!…
Mas, então, o Sr. Presidente da República não reparou que, quando diz que estes candidatos podem injectar nas campanhas dinheiro de terceiros, essa mesma lógica já se podia aplicar aos eleitos, que já constavam da lei? Já se podia aplicar aos donativos de qualquer cidadão, que já estavam previstos na lei?
Então, qual é a diferença entre os candidatos e todas as outras figuras que já estavam previstas na lei?!
Nenhuma!! É uma mistificação esta questão dos candidatos!
Finalmente, eu gostaria de dizer, para terminar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que para o Presidente da República e para os que o apoiam nesta linha contra os partidos, em particular contra o PCP, a transparência está sempre em causa quando se trata de contribuições dos militantes, da sua actividade democrática de participação cívica. Quando se trata de iniciativas como a «Festa do Avante», nesses casos, têm sempre dúvidas em relação à transparência das receitas, mas, por exemplo, a última campanha de Cavaco Silva recebeu dezenas ou centenas de milhares de euros de donativos de presidentes de conselhos de administração de grandes empresas, de accionistas de grandes grupos económicos portugueses…! Aí já não há qualquer problema de transparência, aí já não há qualquer problema de cumplicidade, aí já não há qualquer problema de transparência face à lei!…
É por isso que dizemos, Sr. Presidente, que esta lei continua a ser injusta, pelo que continuaremos a lutar pela sua alteração!

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