Senhor Presidente da Assembleia Senhores Membros do Governo Senhoras e Senhores Deputados
Com o Decreto-lei 244/2002, de 5 de Novembro, o Governo procede a uma profunda deslocação de unidades territoriais para fins estatísticos (NUTS III).
Como por artes de magia, sem qualquer fundamentação nem explicação credível, o Governo pega em 12 dos 13 municípios da NUT III Oeste, e nos 10 municípios do Médio Tejo, ambas pertencentes à Comissão de Coordenação de Lisboa e Vale do Tejo e remete-as para a Comissão de Coordenação do Centro.
Não satisfeito com esta transferência forçada, o Governo pega em mais 11 municípios da NUT III Lezíria do Tejo e envia-os para a tutela da Comissão Coordenadora do Alentejo.
Seguindo uma inspiração cuja origem se desconhece em rigor, há 33 municípios da actual Comissão de Coordenação de Lisboa e Vale do Tejo que são deslocados. Três das anteriores cinco NUTS III desta região são, assim, quase integralmente deslocadas e integradas noutras regiões plano.
Lisboa e Vale do Tejo tinha 51 municípios, passa a ter 18; tinha mais de 3,56 milhões de habitantes, passa a contar com 2,76 milhões.
O Centro, que já tinha 78 municípios organizados em 10 NUTS III, passa a ter 12 NUTS III com um total de 100 municípios, isto é, passa a ter, só à sua conta, praticamente um terço do total dos municípios portugueses, e vendo a sua população sofrer um acréscimo de cerca de 30%, passando de 1,78 milhões de pessoas para quase 2,34 milhões de habitantes.
Por seu turno, o Alentejo passa de 47 para 58 municípios e aumenta a sua população cerca de 50% (de 535 mil para cerca de 775 mil habitantes).
Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados
Com uma alteração deste tipo, o Governo vai provocar modificações sensíveis na configuração histórica e territorial de regiões plano estabilizadas, quebrando unidades e sinergias há muito sedimentadas. Com esta deslocação massiva de municípios de Lisboa e Vale do Tejo para o Centro e para o Alentejo, o Governo vai quebrar – nalguns casos profundamente – características territoriais e elementos identitários, do ponto de vista demográfico, social e, também, do ponto de vista económico das regiões para onde se pretende remeter tantos municípios, criando o grave risco de se romper a identidade física e geográfica pré existente.
Mas não é só nas regiões receptoras que o Governo vai provocar sensíveis perturbações. É também nas próprias NUTS deslocadas que o Governo vai introduzir perturbações.
A título de exemplo, municípios como Sobral de Monte Agraço, Cadaval, Torres Vedras, Lourinhã, Entroncamento, Abrantes, Alcanena ou Constância, cujas relações quase ancestrais se fazem, do ponto de vista económico, do ponto de vista social, do ponto de vista das relações interpessoais, no fundamental, com Lisboa e a região envolvente, vão agora ter de reconstruir relacionamentos de todo o tipo com uma nova centralidade localizada em Coimbra.
E que dizer dos habitantes de Alpiarça, de Almeirim, de Rio Maior ou Santarém obrigados agora a resolver problemas de natureza administrativa em Évora, coração alentejano.
Mas o que mais choca nesta deslocação forçada de 33 municípios de Lisboa e Vale do Tejo é que o Governo a pretende fazer sem consultar formalmente os municípios das regiões receptoras. Um conjunto de posições de órgãos do poder local, de associações de municípios, de assembleias distritais das regiões plano onde o Governo pretende enxertar esses municípios têm dado nota da indignação que grassa nessas instituições que se vêem confrontadas com uma decisão do Governo profundamente unilateral.
Esta é, portanto, uma decisão que, para além de controversa, para além de inexplicável e inexplicada, é sobretudo e antes do mais, uma decisão totalmente arbitrária.
Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados
A única razão que se vislumbra como motivadora desta decisão do Governo prende-se com argumentos de natureza meramente financeira com o objectivo, eventual, de criar melhores condições para a candidatura de Portugal ao próximo Quadro Comunitário de Apoio, a iniciar em 2007. É portanto uma proposta que traduz um expediente, mas que também confirma não existir da parte do Governo a mínima vontade de se proceder a uma adequada e mais racional organização territorial e administrativa do País.
Mas mesmo sob a óptica do mero expediente financeiro, a proposta do Governo revela uma grande superficialidade e uma elevada dose de voluntarismo.
É que o Governo não sabe, a esta distância, qual o quadro financeiro que será adoptado depois de 2006.
É que o Governo desconhece, com completo rigor, quais os efeitos concretos do alargamento na determinação do valor do Produto Interno Bruto (PIB) de cada uma das regiões plano portuguesas.
Mais grave do que isso, é que o Governo não sabe nem pode saber quais serão os critérios de atribuição dos fundos estruturais depois de 2006, e não sabe mesmo se haverá ou não regiões de objectivo um construídas com os actuais critérios.
Mais grave ainda, e quase irresponsável da parte do Governo, é que não foi demonstrado qual é o efeito estatístico destas deslocações municipais nas regiões plano receptoras.
Isto é: pode o Governo demonstrar, hoje e aqui, que a deslocação da NUT III Lezíria do Tejo para o Alentejo, não vai elevar o seu PIB médio e, deste modo, não vai piorar a situação desta região numa futura candidatura a fundos comunitários?
E pode o Governo garantir que a deslocação das NUTS III Oeste e Médio Tejo para a região Centro não vai produzir o mesmo efeito nefasto nessa região?
E se assim for, o que pretende o Governo com esta alteração? Pretende fazer com que, eventualmente, quer o Centro, quer o Alentejo deixem de pertencer a regiões objectivo um por efeito de acréscimos de PIB que as integrações propostas possam provocar?
Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados
Mas se a situação quanto ao futuro é incerta e o Governo não procurou avaliá-la, já quanto às consequências imediatas, para a gestão do actual Quadro Comunitário de Apoio, a situação reveste aspectos preocupantes.
É que a distribuição regional dos financiamentos dos fundos comunitários foi há muito encerrada e, tanto quanto se sabe, não pode haver transferências financeiras entre regiões.
Deste modo, como é que o Governo vai resolver os problemas inerentes à sua proposta de modificação das NUTS?
Vão diminuir as dotações financeiras da Região de Lisboa e Vale do Tejo e aumentar, na mesma proporção, as dotações afectas ao Alentejo e à Região Centro? E se, eventualmente, for essa intenção, colheu já o Governo o assentimento da Comissão Europeia?
E se tais transferências financeiras não puderem ocorrer? O que vai fazer o Governo? Vai distribuir o “bolo” financeiro afecto ao Alentejo por mais 11 municípios? E vai distribuir o “bolo” financeiro do Centro por mais 22 municípios?
Ou será que o Governo não pensou nisto, de tão leviana que parece a sua proposta?
Senhor Presidente Senhoras e Senhores Deputados
A reorganização de NUTS proposta pelo Governo 244/2002 não está baseada em fundamentos coerentes e credíveis mas pode ter efeitos financeiros contraditórios com os objectivos implicitamente anunciados. Por outro lado, constitui uma decisão de génese arbitrária que não teve como objectivo racionalizar a organização administrativa do País.
O PCP considera que é fundamental alterar a proposta do Governo de forma a encontrar uma solução que não perturbe as actuais regiões plano com epicentro em Coimbra e em Évora.
O PCP considera, por outro lado, que as NUTS III Oeste, Médio Tejo e Lezíria do Tejo apresentam elementos unificadores, económicos, sociais e demográficos muito significativos e integram municípios no fundamental situados no Ribatejo e na influência física e territorial do designado Vale do Tejo.
Constituem uma a unidade geo populacional que na actual configuração da Comissão de Coordenação da Região de Lisboa corresponde à designação Vale do Tejo.
Integram trinta e três municípios e possuem um nível populacional muito significativo, com um total global de mais de oitocentos mil habitantes. Tem, por isso, todas as condições para, em conjunto, se constituírem numa nova unidade territorial de nível II.
Por isso o PCP propõe a criação de uma nova região plano em Portugal, a NUT de nível II, que propomos designar por Oeste e Ribatejo e que passará a integrar as 3 NUTS de nível III que o Governo pretende deslocar para o Alentejo e para o Centro.
A proposta do PCP procura dar também resposta às preocupações financeiras decorrentes da aproximação de um novo quadro comunitário de apoio, sem contudo causar preocupações e /ou perturbações noutras regiões. Visa igualmente dotar a nova Comissão de Coordenação Regional do Oeste e Ribatejo de melhores condições para que os seus municípios possam aceder a fundos comunitários.
Finalmente, a alteração proposta pelo PCP visa também, visa sobretudo, constituir um contributo coerente para uma melhor racionalização da organização administrativa do País.