Emanado da Revolução de Abril, o Serviço Nacional de Saúde revela-se de forma indelével como o garante da universalidade no acesso à saúde.
Foi necessário percorrer um longo caminho até à efetivação de um direito fundamental – o direito à saúde, consagrado na Constituição e realizado através de um Serviço Nacional de Saúde universal e geral.
Revelando-se desnecessário ocuparmo-nos dos avanços que o Serviço Nacional de Saúde proporcionou e continua a proporcionar, pois são por demais evidentes e reconhecidos, é cada vez mais urgente e necessário lutar pela sua defesa, sobre tudo perante as políticas do governo PSD/CDS-PP, que mais não visam que o seu desmantelamento.
Embora o governo procure afastar o desinvestimento a que o Serviço Nacional de Saúde tem sido sujeito, nomeadamente através do recurso a “números”, alguns anúncios e medidas propagandísticas, as situações denunciadas todos os dias rapidamente mostram que tais enunciados não têm correspondência com a realidade e contrariam de forma manifesta o afirmado pelo governo PSD/CDS-PP.
Os reflexos desta política sentem-se na população, nos utentes do Serviço Nacional de Saúde que encontram maiores obstáculos no acesso à saúde, quer pelo pagamento de taxas moderadoras quer pelo tempo de demora das consultas, ou pela falta de meios que comprometem o tratamento mais adequado.
Sente-se ainda, embora de maneira diferente, nos profissionais de saúde, que assumindo-se essenciais ao Serviço Nacional de Saúde na prossecução dos seus objetivos e atribuições estão confrontados com o corte dos rendimentos, perda de direitos, agravamento da exploração, insegurança e instabilidade laboral.
Sendo evidentes os efeitos sócio económicos que daí decorrem, esta situação conduz forçosamente à insatisfação e desmotivação destes profissionais, a que acrescem as especificidades da função desempenhada, designadamente o contacto permanente com a doença, o sofrimento e a morte, que contribuem para o elevado desgaste da sua saúde, quer física quer mental, e como tal não é de excluir que tais sentimentos conjugados com a incerteza laboral tenham reflexos na relação com os utentes e na prestação dos cuidados de saúde.
Condições já por si difíceis, agravadas em cada novo Orçamento do Estado da responsabilidade de um governo PSD/CDS-PP que não esconde a sua opção ideológica de esvaziamento das funções sociais do Estado, que não cumpre nem respeita a Constituição da República, que insiste no empobrecimento do país e de todos os portugueses, sobretudo através da retirada de direitos e pela diminuição do valor do fator trabalho.
Tratando-se de uma iniciativa legislativa especialmente dirigida aos profissionais de saúde, às suas condições de trabalho e direitos laborais propomo-nos introduzir algumas propostas que não resolvendo o problema na totalidade visam obviar os efeitos das políticas do Governo PSD/CDS-PP, e em particular as medidas resultantes do Orçamento do Estado para 2014.
Debrucemo-nos sobre o direito ao descanso compensatório que encontra fundamento na prestação de trabalho, para além do seu período normal ou durante o período de descanso (noturno ou semanal) do trabalhador ou ainda, em dia feriado.
Tal direito retira-se da alínea d) do n.º 1 do artigo 59.º da Constituição, e tem como objetivo compensar o trabalhador pelo trabalho realizado nesses termos e garantir-lhe, assim, as condições necessárias à sua plena recuperação física e psíquica.
É dado assente que os profissionais de saúde têm de prestar a sua atividade para além do seu período normal de trabalho, e na maioria dos casos tal revela-se indispensável para assegurar o normal funcionamento dos vários serviços e unidades hospitalares, 24 horas sobre 24 horas, ao longo dos 7 dias da semana e dos 365 dias do ano, dando assim origem ao direito ao descanso compensatório.
O descanso compensatório assume assim uma relevância acrescida junto dos profissionais de saúde.
Propomo-nos ainda alterar os valores correspondentes às remunerações das horas de qualidade, recuperando o disposto no Decreto – Lei nº 62/79, de 30 de março em consonância com o tipo de trabalho prestado.
Assim, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projecto de Lei:
Artigo 1º
Manutenção do pagamento das horas de qualidade aos profissionais de saúde
A presente lei garante o pagamento das horas de qualidade aos profissionais de saúde, e procede à alteração de regimes de trabalho no âmbito do Serviço Nacional de Saúde, aplicando-se a todos os profissionais de saúde que, independentemente da modalidade contratual exerçam funções nos estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde, nos termos da Tabela Anexa que faz parte da presente lei.
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto- Lei n.º 62/79, de 30 de março
São alterados os artigos 7.º, 13.º do Decreto-Lei n.º 62/79, de 30 de março, que passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 7.º
1 – […]
2 – Entende-se por trabalho extraordinário o que ultrapassa o número de horas de trabalho semanal normal a que o trabalhador está obrigado.
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – […]
7 – […]
«Artigo 13.º
1 – […]
2 – A prestação de trabalho em dia de descanso compensatório confere ao trabalhador um acréscimo remuneratório não inferior a 100%.
3 – (anterior nº 2)
Artigo 3º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.
Assembleia da República, em 10 de julho de 2014
Tabela Anexa:
Trabalho
normal Trabalho extraordinário
Trabalho diurno em dias úteis R (a) 1,25 R- Primeira hora
1,5 R-Horas seguintes
Trabalho noturno em dias úteis 1,5 R 1,75 R- Primeira hora
2R- Horas seguintes
Trabalho diurno aos sábados depois das 13 horas, domingos, feriados e dias de descanso semanal 1,5 R 1,75 R- Primeira hora
2R- Horas seguintes
Trabalho noturno aos sábados depois das 20 horas, domingos, feriados e dias de descanso semanal 2R 2,25 R - Primeira hora
2,5R - Horas seguintes
(a) O valor R corresponde ao valor hora calculado para a hora de trabalho normal diurno em dias úteis, com base nos termos legais, e apenas para efeitos do cálculo dos suplementos.