Intervenção de

Lei de Programação MilitarIntervenção do Deputado António Filipe

Senhor Presidente, Senhores membros do Governo, Senhores Deputados,

Algumas notas breves, no curto tempo de que dispomos, sobre esta Proposta de Lei de Programação Militar:

Uma primeira nota para salientar as condições inadmissíveis em que a Assembleia da República é obrigada pela maioria a debater esta Proposta de Lei, já explicitadas no Relatório que tive e encargo de alinhavar para a Comissão de Defesa Nacional. Este facto é relevante porque representa uma menorização deste órgão de soberania por parte do Governo e da maioria, para quem, pelos vistos, a aprovação da Lei de Programação Militar pela Assembleia da República não passa de uma mera formalidade.

O Governo, que tinha a obrigação legal de promover a revisão da Lei de Programação Militar até ao final de 2002, não o fez. Atrasou-se pelo menos três meses. Mas quem paga pelo atraso é a Assembleia da República que se vê privada de debater a Proposta de Lei com a profundidade que a matéria obviamente exigia. Não serve de atenuante dizer que os governos anteriores também se atrasaram. Não apenas porque este Governo prometeu aos portugueses ser diferente dos anteriores, mas fundamentalmente, porque compete aos governos dar o exemplo do cumprimento das leis que vigoram no país. Quem exige aos portugueses rigor no cumprimento da lei, tem de ser, em primeiro lugar, rigoroso consigo próprio.

Uma segunda nota, para referir que a Lei de Programação Militar que agora vem proposta não difere muito substancialmente da anterior. Mantém-se o modelo de financiamento, baseado no leasing, que vinha do Governo anterior, apesar de mitigado. Mantém-se no essencial, as opções tomadas pelo Governo anterior, que privilegia as prioridades de investimento não tanto em função das necessidades das Forças Armadas para a prossecução do interesse nacional, mas fundamentalmente, em função das necessidades de integração desses equipamentos em missões e em forças da NATO.

O Governo abre mão da aquisição de um submarino, passando a adquirir apenas dois, e com isso liberta recursos financeiros avultados para outros programas, reduz o peso do leasing nos encargos com o financiamento e os prazos de pagamento, e beneficia de uma taxa de juro mais favorável. Mas a opção é a mesma. Em 2001, o então Deputado Paulo Portas, afirmou nesta Assembleia que discordava do método de financiamento, mas concordava com os objectivos de reequipamento das Forças Armadas. Agora, como Ministro da Defesa Nacional, mantém os objectivos e já concorda com o método.

Convenhamos no entanto que não é uma posição tão incoerente como a do PSD, que nesta Assembleia, pela voz dos senhores Deputados Carlos Encarnação, Rui Gomes da Silva e da Senhora Deputada Manuela Ferreira Leite, verberava a proposta do Governo e o método de financiamento adoptado. Muito mais do que a Lei da Programação Militar, o que se altera nesta revisão é a posição do PSD.

Terceira nota: Compartilhamos o objectivo de reequipamento das Forças Armadas. A nossa discordância em relação a determinadas opções e prioridades e a modelos de financiamento não representa nenhuma discordância quanto à necessidade de reequipar as Forças Armadas conferindo-lhes a capacidade para desempenhar com dignidade as suas funções. O PCP tem o maior apreço pelas Forças Armadas Portuguesas, reconhece as suas justas razões de queixa em matéria de equipamentos e considera que alguns dos Programas constantes da Lei de Programação Militar contam com a nossa concordância, são de interesse nacional, correspondem a reais necessidades das Forças Armadas e só pecam por tardios.

A questão é de prioridades, e com isto deixo a quarta nota: As opções constantes da Lei de Programação Militar relevam mais das exigências da NATO e da Força Europeia de Reacção Rápida do que do interesse nacional. A lei em vigor foi proposta pelo Governo anterior, antes da aprovação do actual Conceito Estratégico de Defesa Nacional, mas teve em conta, não o Conceito Estratégico que estava em vigor e que vinha de 1994, mas o Conceito Estratégico da NATO de 1999, a que o novo Conceito Estratégico de Defesa Nacional prestimosamente se adaptou. Não é por acaso que, apesar de haver um novo Conceito Estratégico, as opções fundamentais da Lei de Programação Militar se mantém inalteradas.

As prioridades vão para a capacidade submarina, para o conceito de projecção de força, para a esquadra de F-16, mas marcam passo os patrulhões oceânicos encomendados a conta-gotas, os meios de combate à poluição ou a aquisição de um draga-minas tão necessária num momento em que o terrorismo se configura como uma ameaça real. É pena que a pressa do senhor Ministro em adquirir aviões de transporte militar norte-americanos, que é tanta que o faz abandonar o projecto europeu do avião A400M que continha uma incorporação nacional não despicienda através das OGMA, não seja extensiva a outras aquisições que seriam verdadeiramente do interesse nacional.

Quinta nota: A opção pelo leasing, apesar de mitigada em relação à Lei actual, representa um acréscimo muito significativo de encargos para o futuro, encarece brutalmente os equipamentos adquiridos e não tem outra explicação que não seja a obediência aos critérios “estúpidos” de que fala Romano Prodi quando se refere ao Pacto de Estabilidade.

Sexta e última nota: A Lei de Programação Militar a aprovar continua a ser, na prática, meramente indicativa. A Assembleia da República vai aprovar os programas e os respectivos encargos, mas depois o Governo pode executar, não executar, alterar, transferir, ou assumir novos projectos ou acções, transferindo verbas mediante despacho e limitando-se a dar conhecimento das suas decisões à Assembleia da República. Até a questão dos saldos, que transitam cronicamente, de ano para ano, em consequência de baixas taxas de execução, deixam de constar dos mapas anexos à Lei de Programação Militar.

Senhor Presidente, Senhores Deputados,

A Lei de Programação Militar que temos não é a que corresponde à defesa do interesse nacional. A revisão que nos é proposta não se afasta dessa matriz e não é susceptível de alterar a nossa posição.

 

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