Senhor Presidente, Senhores Deputados, Antes de iniciar a apresenta??o do Projecto de Lei que agend?mos para a Ordem do Dia de hoje, permitam-me que, em nome do Grupo Parlamentar do PCP, comece por enviar uma forte sauda??o aos trabalhadores portugueses que, hoje mesmo, correspondendo ao apelo da CGTP/IN, se manifestam em Lisboa, contra as propostas do Governo para alterar a legisla??o laboral que, tomando o partido pelo grande patronato, procuram reduzir e desregulamentar ainda mais o direito ? seguran?a no emprego, aos sal?rios e hor?rios, ?s f?rias, ? seguran?a social. As propostas de lei sobre o trabalho a tempo parcial, sobre o direito ?s f?rias, sobre o conceito de retribui??o e sobre o trabalho nocturno, que suscitam o justo protesto dos trabalhadores, s?o propostas, em primeiro lugar contra os jovens e contra as mulheres trabalhadoras, mas que mais cedo ou mais tarde, seriam, se fossem aprovadas, contra os interesses e direitos de todos os trabalhadores. O PCP est? inteiramente solid?rio com os trabalhadores que hoje se manifestam e afirma a sua disposi??o de tudo fazer nesta Assembleia para que n?o v? por diante mais esta ofensiva contra os direitos de quem trabalha. Senhor Presidente, Senhores Deputados, O Grupo Parlamentar do PCP utilizou o seu direito potestativo para a fixa??o da Ordem do Dia desta Assembleia para promover o debate que hoje realizamos sobre o projecto de lei destinado a prevenir e combater a discrimina??o racial. Este facto ? significativo da import?ncia que atribu?mos a esta mat?ria. Desde que em 1982 a Assembleia da Rep?blica aprovou a ades?o do nosso pa?s ? Conven??o Internacional sobre Elimina??o de Todas as Formas de Discrimina??o Racial, adoptada em 1965 pelas Na??es Unidas, ? hoje a primeira vez que este ?rg?o de soberania ? chamado a pronunciar-se sobre uma iniciativa legislativa concreta, tendo por objectivo dotar a Ordem Jur?dica Portuguesa com um instrumento legislativo destinado a combater todas as pr?ticas de discrimina??o com base na ra?a, na cor, na nacionalidade ou na origem ?tnica. O Projecto de Lei do PCP que hoje tenho a honra de apresentar ? a primeira iniciativa legislativa apresentada em Portugal com esse objectivo. Iniciativa necess?ria e insistentemente reivindicada, designadamente pelos movimentos anti-racistas, pelas associa??es de defesa dos direitos humanos e pelas associa??es representativas dos imigrantes, existentes em Portugal. Cumpre-me por isso agradecer, em nome do PCP, a todas as associa??es que aceitaram o nosso convite para contribuir com as suas opini?es e sugest?es sobre este projecto, e particularmente ? ? Lisboa Azul e ? Frente Anti-racista, que tiveram a am?vel iniciativa de entregar simbolicamente o CD "todos diferentes, todos iguais" a todos os grupos parlamentares, como express?o do seu apoio ? aprova??o desta lei, ? Associa??o Cabo-verdiana que expressou publicamente o seu apoio aos projectos hoje em debate, e tamb?m ao SOS Racismo e ? Associa??o Portuguesa dos Direitos dos Cidad?os que em 1996 dirigiram uma peti??o a esta Assembleia apelando ? aprova??o de uma lei contra a discrimina??o racial. Quando em Novembro de 1997 aqui debatemos essa Peti??o, tive oportunidade de afirmar, em nome do PCP, que consider?vamos inteiramente pertinentes as preocupa??es que a motivavam e que as propostas dela constantes deveriam merecer desta Assembleia a melhor pondera??o. Relativamente ? mat?ria a inserir na chamada "lei de estrangeiros" e no diploma regulador do trabalho de estrangeiros em territ?rio nacional, dei conta das propostas legislativas j? nessa altura assumidas pelo PCP. E no que se refere a outras mat?rias, comprometemo-nos a ponderar a sua pertin?ncia e a estudar a viabilidade da sua inclus?o nos diplomas legais adequados. Comprometemo-nos e cumprimos. A necessidade da aprova??o de uma lei contra a discrimina??o racial n?o suscita qualquer d?vida. A Conven??o Internacional Sobre a Elimina??o de Todas as Formas de Discrimina??o Racial, a que Portugal se vinculou, obriga os Estados partes, nomeadamente, a proibir e a eliminar a discrimina??o racial, sob todas as suas formas, e a garantir o direito de cada um ? igualdade perante a lei sem distin??o de ra?a, de cor ou de origem nacional ou ?tnica. No ?mbito desta Conven??o, o Comit? das Na??es Unidas para a Elimina??o da Discrimina??o Racial apreciou um relat?rio sobre a sua aplica??o em Portugal, tendo recomendado a intensifica??o das medidas no sentido de evitar o cometimento de actos de discrimina??o racial e xenofobia. Ali?s, tamb?m muito recentemente, em artigo publicado no Di?rio de Not?cias, o Alto Comiss?rio para a Imigra??o e as Minorias ?tnicas referiu a inten??o da Comiss?o Europeia de propor duas directivas-quadro no sentido de combater as situa??es discriminat?rias em v?rios campos, admitiu que o combate ? discrimina??o racial venha a ser em breve objecto de iniciativas legislativas por toda a Uni?o Europeia, e concluiu que "faz sentido continuar a procurar aperfei?oar a legisla??o existente em cada Estado-Membro". ? esse tamb?m o nosso entendimento. Faz todo o sentido aperfei?oar a nossa legisla??o de combate ? discrimina??o racial. N?o para aliviar a consci?ncia pesada da Uni?o Europeia pelas muitas malfeitorias que comete em mat?ria de direitos dos cidad?os n?o comunit?rios. Mas porque pensamos que esse aperfei?oamento ? justo e adequado. A proibi??o da discrimina??o racial tem em Portugal pleno acolhimento constitucional. Desde logo no artigo 13? da Lei Fundamental, que se refere ao princ?pio da igualdade, segundo o qual, "todos os cidad?os t?m a mesma dignidade social e s?o iguais perante a lei" e "ningu?m pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em raz?o de ascend?ncia, sexo, ra?a, l?ngua, territ?rio de origem, religi?o, convic??es pol?ticas ou ideol?gicas, instru??o, situa??o econ?mica ou condi??o social". Mas tamb?m no artigo 15?, que disp?e que "os estrangeiros e os ap?tridas que se encontrem ou residam em Portugal gozam dos direitos e est?o sujeitos aos deveres do cidad?o portugu?s", exceptuados os direitos pol?ticos, o exerc?cio de fun??es p?blicas que n?o tenham car?cter predominantemente t?cnico e os direitos e deveres reservados pela Constitui??o e pela lei exclusivamente aos cidad?os portugueses. Acontece por?m que o tratamento legislativo da discrimina??o racial, definida na Conven??o Internacional como "qualquer distin??o, exclus?o, restri??o ou prefer?ncia fundada na ra?a, cor, ascend?ncia na origem nacional ou ?tnica que tenha como objectivo ou como efeito destruir ou comprometer o reconhecimento, o gozo ou o exerc?cio, em condi??es de igualdade, dos direitos do homem e das liberdades fundamentais no dom?nio pol?tico, econ?mico, social e cultural ou em qualquer outro dom?nio da vida p?blica", tem sido disperso e lacunar. Por isso, apesar da aplicabilidade directa do texto constitucional e de alguns progressos legislativos verificados aquando da ?ltima revis?o do C?digo Penal e da elimina??o de algumas, que n?o todas, as restri??es injustificadas no acesso de estrangeiros ao emprego, subsistem situa??es em que a viola??o do princ?pio da igualdade e a pr?tica de discrimina??es de origem racial, n?o se encontram expressamente previstas e sancionadas na legisla??o portuguesa. Neste, como noutros aspectos, a realidade vivida pelos cidad?os fica muito aqu?m do que disp?e o texto constitucional, verificando-se que um vasto leque de pr?ticas discriminat?rias, por n?o merecerem qualquer previs?o expl?cita na legisla??o ordin?ria, permanecem impunes, tornando muitas vezes ineficazes as garantias constitucionais dos cidad?os. Da? que o primeiro objectivo do projecto de lei do PCP seja precisamente tipificar pr?ticas discriminat?rias, no emprego e no acesso ao emprego, no acesso ? sa?de, ? habita??o, ? educa??o, na presta??o de bens e servi?os, no exerc?cio de actividades econ?micas, no funcionamento da Administra??o P?blica e prever as san??es adequadas perante a sua eventual viola??o. Senhor Presidente, Senhores Deputados, Apresentamos este Projecto de Lei sem dramatismos. Portugal n?o ? um pa?s racista. N?o temos, felizmente, no nosso pa?s, problemas de cariz racista com a dimens?o e a gravidade dos problemas que se manifestam nos Estados Unidos, na Alemanha, ou mesmo em Fran?a. Mas temos problemas que n?o podemos negar. Com as dificuldades na integra??o social de algumas comunidades, com os obst?culos existentes no acesso de todos os cidad?os ao exerc?cio de direitos econ?micos, sociais e culturais em condi??es de igualdade, e com tend?ncias que se manifestam em alguns sectores da sociedade portuguesa para culpabilizar minorias ?tnicas, no seu conjunto, por problemas de criminalidade, pelos quais esses cidad?os s?o tanto respons?veis e s?o tanto v?timas como quaisquer outros. A nossa atitude perante esses fen?menos, perante quaisquer pr?ticas ou atitudes discriminat?rias, n?o ? a de fazer espect?culo pol?tico ? sua custa, n?o ? a de empolar artificialmente a sua dimens?o, n?o ? a de culpabilizar todos os portugueses pela sua ocorr?ncia, mas tamb?m n?o ? a de encolher os ombros ou de fechar os olhos perante a sua gravidade. A nossa atitude perante quaisquer pr?ticas ou atitudes discriminat?rias ? a de as enfrentar com firmeza, de as impedir, de evitar a sua repeti??o. A n?o admiss?o de um trabalhador, a recusa injustificada de acesso a um qualquer local aberto ao p?blico, ou a discrimina??o de uma crian?a na escola, com base na cor da pele ou no lugar onde nasceram, s?o atitudes inaceit?veis, cuja censura social tem de ser assegurada por todos e cuja censura legal compete exclusivamente a esta Assembleia assegurar. ? precisamente disso que hoje tratamos. O Projecto de Lei apresentado pelo PCP, visa prevenir a discrimina??o racial sob todas as suas formas e sancionar a pr?tica de actos que se traduzam na viola??o de quaisquer direitos fundamentais, ou na recusa ou condicionamento do exerc?cio de quaisquer direitos econ?micos, sociais, ou culturais, por quaisquer cidad?os, em raz?o da sua perten?a a determinada ra?a, nacionalidade ou origem ?tnica. Considerando-se como pr?ticas discriminat?rias, para efeitos desta lei:
- A subordina??o da oferta de emprego, a cessa??o de contrato de trabalho ou a recusa de contrata??o;
- A discrimina??o entre trabalhadores;
- A recusa de fornecimento de bens ou servi?os;
- O impedimento ou condicionamento, por ac??o ou por omiss?o, do exerc?cio normal de uma actividade econ?mica;
- A recusa ou condicionamento de venda, arrendamento ou subarrendamento de im?veis;
- A recusa de acesso a locais p?blicos ou abertos ao p?blico;
- A recusa ou limita??o de acesso a cuidados de sa?de por parte de estabelecimentos de sa?de p?blicos ou privados;
- A nega??o, condicionamento ou limita??o da admiss?o em estabelecimentos de ensino p?blicos ou privados;A constitui??o de turmas ou a adop??o de outras medidas de organiza??o interna segundo crit?rios discriminat?rios;
- A recusa, condicionamento ou limita??o no exerc?cio de direitos perante a Administra??o directa ou indirecta do Estado, as regi?es aut?nomas ou as autarquias locais;
- A produ??o ou difus?o de an?ncios de ofertas de emprego, ou outras formas de publicidade ligada ? pr?-selec??o ou ao recrutamento, que contenham qualquer especifica??o ou prefer?ncia racial;
- E ainda, qualquer acto em que, publicamente ou com inten??o de divulga??o ampla, qualquer pessoa singular ou colectiva fa?a uma declara??o ou transmita uma informa??o por meio da qual um grupo de pessoas seja amea?ado, insultado ou aviltado por motivo da ra?a, cor, nacionalidade ou origem ?tnica.
Para al?m de estabelecer as san??es contra-ordenacionais correspondentes a estas pr?ticas e o elenco dos direitos e garantias dos lesados, o Projecto do PCP prop?e ainda a cria??o de um Observat?rio sobre a Discrimina??o Racial, tenha ou n?o esta designa??o, a funcionar junto do Alto Comiss?rio para a Imigra??o e as Minorias ?tnicas, com a participa??o designadamente de representantes dos sindicatos, das associa??es de imigrantes e das associa??es anti-racistas.? que, para combater com efic?cia a discrimina??o racial n?o basta conden?-la juridicamente. ? preciso tamb?m criar instrumentos de recolha de dados sobre situa??es reais e sobre a aplica??o das leis, sobre as queixas apresentadas pela sua viola??o, e que centralizem, trabalhem e encaminhem propostas para uma ac??o mais eficaz de combate ? discrimina??o racial.Senhor presidente,Senhores Deputados,A apresenta??o de um Projecto de Lei do PS que converge com o nosso no objectivo de combater a discrimina??o racial ? um facto que saudamos e foi com gosto que aceit?mos associar ao nosso agendamento o debate deste projecto, tal como far?amos a prop?sito de quaisquer outros que fossem apresentados sobre esta mat?ria.Queremos por?m registar desde j? algumas diverg?ncias que teremos oportunidade, segundo espero, de debater mais aprofundadamente na especialidade e que dizem respeito, por um lado, ? excessiva latitude com que o projecto do PS consagra as excep??es ? regra da n?o discrimina??o e a excessiva governamentaliza??o da composi??o da Comiss?o Contra a Discrimina??o Racial que ? proposta.Senhor Presidente,Senhores Deputados,Esta iniciativa n?o ? um acto isolado na interven??o pol?tica e parlamentar do PCP. Num quadro marcado por retrocessos profundos em mat?ria de direitos dos cidad?os n?o nacionais, decorrentes dos Acordos de Schengen e das orienta??es xen?fobas prevalecentes na Uni?o Europeia, de que s?o exemplos as altera??es ? legisla??o sobre estrangeiros aprovadas pelos Governos do PSD e do PS, o PCP tem desenvolvido uma ac??o intensa e permanente pelo reconhecimento dos direitos dos imigrantes residentes em Portugal e por um posicionamento do Estado Portugu?s que respeite a dignidade de todos os seres humanos e que seja compat?vel com as nossas responsabilidades como pa?s de imigra??o e de emigra??o.N?o posso a este respeito deixar de referir que o decreto-lei em vigor sobre a entrada, perman?ncia, sa?da e expuls?o de estrangeiros do territ?rio nacional, cuja aprecia??o parlamentar est? pendente para discuss?o por iniciativa do PCP, ? um exemplo da pol?tica negativa seguida pelo Governo em rela??o aos imigrantes e aos estrangeiros em geral. Pol?tica que se inspira numa submissa aceita??o dos compromissos para a cria??o de uma Europa fechada; que n?o valoriza a especificidade da rela??o de Portugal com os pa?ses de l?ngua portuguesa; que trata como potenciais delinquentes todos os imigrantes que demandem o nosso pa?s; que esquece que a fus?o de povos e culturas faz parte da g?nese do povo portugu?s e foi e ? um factor de enriquecimento e vitalidade da sociedade portuguesa.Mas voltando ? quest?o que hoje nos ocupa, e para finalizar esta interven??o, relembro a excelente iniciativa que esta Assembleia tomou, de assinalar de forma memor?vel a passagem do 50? anivers?rio da Declara??o Universal dos Direitos do Homem. Essa Declara??o que, no seu artigo 1?, proclama que "todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos" e que "dotados de raz?o e consci?ncia, devem agir uns para com os outros com esp?rito de fraternidade."? em nome dessa raz?o e dessa consci?ncia, que propomos ? Assembleia da Rep?blica a aprova??o desta lei contra a discrimina??o racial.Disse.