Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral

Jerónimo de Sousa na Festa da Fraternidade


Extracto da intervenção de Jerónimo de Sousa
na Festa da Fraternidade, em Grândola

(...)
Com o governo PS foi desencadeada a mais vasta e diversificada ofensiva contra os trabalhadores.
Os trabalhadores que travaram grandes lutas. Em 2 de Março realizou-se uma das maiores manifestações em Lisboa, envolvendo trabalhadores da Administração Pública e do sector público e privado. Que fazer perante um Governo arrogante que continua a ofender e a atacar a dignidade e os direitos dos trabalhadores? Baixar os braços conformando-nos? Aceitar a restrição e liquidação de direitos como inevitabilidades? Ou prosseguir e elevar a luta? E foi largo o apoio à ideia de que se deveria não só prosseguir mas elevar a forma de luta.

Queremos saudar a CGTP-IN e os trabalhadores que convocaram e participaram na Greve Geral.
Saudar a decisão corajosa da CGTP-IN, porque  quando a convocou tinha a consciência das dificuldades e condicionamentos que resultam de uma relação de forças desfavorável aos trabalhadores, do poder da classe dominante que conta com um Governo que se assume como seu instrumento político, que conta poderosos meios de comunicação social, com um exército de seguidores e figurantes, sempre à mão nestas alturas para dividir. Sabia a CGTP dos efeitos das precariedades, das pressões da repressão sobre os salários, os prémios, as carreiras, sobre o próprio exercício livre do direito à greve no sector dos transportes e na Administração Pública e em muitas empresas do sector privado. Tratava-se de travar uma luta lá onde ela é mais difícil e exigente: na empresa e no local de trabalho.
Saudamos todos os trabalhadores que participaram na greve e em particular todos aqueles que num acto de grande consciência e de grande coragem e dignidade arrostaram e fizeram frente aos poderosos e mandantes, caminharam para além do medo e do conformismo, assumindo também a defesa da liberdade e do próprio direito à greve!

Mistificando e adulterando o apelo à Greve Geral,  propositadamente confundida com greve total, como se isso tivesse acontecido em qualquer parte do mundo, o Governo e os situacionistas manipularam números e percentagens de adesão à greve, logo no dia 30 de Maio – de um balanço que nesse momento ninguém em rigor poderia fazer.

O Governo, destacando 7 governantes para a operação, deu os números “aldrabados”, aliás na linha de outros Governos anteriores confrontados com a Greve Geral. Era importante transformar a comunicação social em caixa de ressonância. Era importante que a posição de rigor da CGTP, que não apresentou números globais, fosse explorada como facto para validar as contas falsificadas do Governo.
Parece que a coisa resultou. Ainda ontem, a Convenção do BE, na linha da UGT, veio validar a tese do Governo e responsabilizar a CGTP por um pretenso fracasso.
Três exemplos da manipulação mentirosa do Governo:

Na Administração Pública pôs logo de fora das contas os cerca de 100 mil trabalhadores da Administração Local que massivamente participaram na greve.
Nos transportes – onde a greve teve mais expressão que em 2002 –contabilizou algumas empresas de Lisboa e Porto (e mesmo essas mal, por exemplo não referindo que só no Norte não se realizaram 148 comboios); silenciou as elevadas adesões dos transportes rodoviários (no Barreiro, em Coimbra, em Viseu, em Braga e em diversas empresas privadas do Norte entre outras), no transporte aéreo (nos Açores, em Faro e também na Portela).

No sector privado centenas de empresas pararam. Mas mesmo nas empresas que não pararam – em sectores como o comércio, a restauração, as telecomunicações – , foram muitos os trabalhadores (incluindo trabalhadores precários das grandes superfícies, dos call-centers das telecomunicações) que fizeram greve pela primeira vez na vida. Que fonte de informação inspirou o Governo? Nenhuma! Transformou a ignorância em percentagem.
Então quantos fizeram greve? Não temos certezas rigorosas, mas há uma coisa que sabemos: Foi a maior e mais forte luta com que o Governo PS foi confrontado nestes mais de 2 anos de mandato. Foi a luta maior com que qualquer governo do PS (e foram muitos, em mais de década e meia de governação) foi alguma vez confrontado.

Esta Greve Geral comprova que uma luta nunca é ponto de chegada. É uma ponte de passagem para outras lutas que não tardarão. Lutas que haverão de contar com muitos trabalhadores que participaram na greve geral e com muitos que estiveram com ela e não a puderam fazer. Luta que reclama o papel ímpar e insubstituível da central sindical dos trabalhadores portugueses – a CGTP-IN. Luta em que o PCP, no renovado compromisso com os trabalhadores, os seus anseios e direitos, não regateará nenhum esforço, no combate em defesa de uma vida melhor para quem trabalha.
Exercitando a manipulação dos números, o Governo e os arautos do neoliberalismo, deram um passo adiante nos objectivos que trazem na cabeça.

Acham que a CGTP e os sindicatos deveriam deixar-se dessa coisa de defender conquistas e direitos de quem os tem. Que é do passado defender o direito ao trabalho e à segurança no emprego, ao horário de trabalho e à contratação colectiva, o direito a ter direitos, porque isso não é moderno e é do século passado.  Que é errado lutar sem a certeza certa de se ganhar imediatamente. 
Moderno seria regressar aos métodos e ao nível de direitos do século XIX. Moderno seria abdicar de todos os avanços e conquistas civilizacionais e laborais do século anterior. E, no nosso caso, “do século onde Abril se deu”, escondendo sempre aos olhos dos trabalhadores que, em última análise, essa conversa da modernidade é só para aumentarem o lucro e a exploração e voltar para trás: hoje seria a precariedade geral, os horários desregulamentados, os salários baixos, amanhã o despedimento sumário e sem justa causa, o direito a férias, ao subsídio de férias e de Natal, à saúde, à segurança social e à educação.

Nos ensinamentos da história aprendemos que o capitalismo sempre fez frente à luta. O seu medo maior é a luta organizada dos trabalhadores sindicalizados e organizados no seu sindicato. E, mais ainda, quando (tendo os partidos que quer, uns assim ou mais ao lado, mais “esquerdista” ou mais “direitista”), lhe é insuportável que os trabalhadores queiram ter no plano político o seu Partido – que comporte no seu projecto e na sua luta o sonho e objectivo de libertação da exploração, do trabalho com direitos, de uma democracia avançada num Portugal mais justo e de progresso.
É verdade, camaradas! Eles sabem que connosco não pegam os cânticos dos que nos querem conduzir (ou dos que já lá estão) para o pântano do conformismo. Há muita luta a fazer, há muita batalha a travar. Duras como punhos, mas assumimos esse desafio com aquela determinação e confiança que nos caracteriza.
(...)