Sr. Presidente,Srs. Deputados,Srs. Membros do Governo,A reforma da Pol?tica Agr?cola Comum ? verdadeiramente um dos n?s gordio da Agenda 2000 e do pr?ximo futuro da Uni?oEuropeia. O modo como a reforma da PAC for resolvida permitir? aferir se, mais uma vez, o Governo portugu?s opta por umapolitica de pequenas trocas que acabam por se traduzir em progressivas dificuldades para o aparelho produtivo nacional, no caso,o aparelho produtivo agr?cola, ou por uma postura em que questionando o pr?prio modelo actual da PAC coloca-se ao lado dossectores mais l?cidos e contribui para uma nova estrutura da Pol?tica Agr?cola, garantindo desse modo o futuro sustentado daagricultura portuguesa.Como ? sabido, o actual modelo da PAC mergulha os seus contornos e as suas orienta??es no contexto hist?rico em que foi criada.Concebida numa Comunidade a seis e com o objectivo confesso de aumentar a produ??o agro-pecu?ria numa Europa altamentedeficit?ria em bens alimentares a PAC desde logo foi orientada, na defini??o dos objectivos e no desenho dos apoios, para asgrandes produ??es dos pa?ses que ent?o constitu?am a Comunidade (Fran?a, Alemanha, Holanda, B?lgica, Luxemburgo e It?lia) - eonde s? a It?lia era, ? ?poca, relativamente perif?rica - confirmado posteriormente nos pa?ses do primeiro alargamento (Reino Unido,Dinamarca e Irlanda). Cereais, carne de bovino e leite constitu?ram assim as primeiras grandes produ??es apoiadas. As orienta??esiniciais da PAC tiveram, sem duvida, sucesso quantitativo (a Comunidade passou de deficit?ria a excedent?ria) embora ? custa daliquida??o de centenas de milhares de pequenas explora??es, a uma concentra??o da produ??o e fundi?ria e a uma multiplica??odas despesas agr?colas. S? que, entretanto, os sucessivos alargamentos da Comunidade conduziram a realidade do mundo rural auma agricultura mais diversificada tanto do ponto de vista dos sistemas culturais como do ponto de vista da estrutura dasexplora??es agr?colas. Realidade nova esta que coincidiu com o in?cio de irracionais pol?ticas restritivas do aumento da produ??o,independentemente das responsabilidades de cada pa?s nos alegados excessos de produ??o; com o in?cio de um processo tendentea reduzir as despesas or?amentais da Comunidade ? custa da pol?tica agr?cola e com orienta??es tendentes ? cada vez maiorliberaliza??o dos mercados no quadro da integra??o da agricultura nas negocia??es do GATT/OMC. A reforma da PAC de 1992,defendida e aprovada em pleno consulado do PSD e da Presid?ncia portuguesa, foi o culminar de uma primeira etapa desteprocesso altamente lesivo para os interesses da nossa agricultura e dos nossos agricultores. Porque a verdade ? que a reforma de1992 prejudicou fundamentalmente as agriculturas de pa?ses como Portugal. Enquanto as produ??es e os sistemas agr?colas dosprimeiros tempos da PAC beneficiaram - e continuam a beneficiar - de elevad?ssimas medidas de suporte dos pre?os de mercado ede ajudas directas ? produ??o as chamadas produ??es mediterr?nicas ou n?o beneficiam de nenhum apoio ou o apoio que recebem? infinitamente inferior ao que ? destinado ?s agriculturas dos pa?ses setentrionais da Europa. A irracionalidade da PAC e o facto dese ter, por interesse dos grandes pa?ses exportadores, do Grupo de CAIRNS e dos EUA alargado ? agricultura os mecanismos daultra liberaliza??o do com?rcio mundial, obrigando a uma artificial descida de pre?os s? parcialmente compensados por ajudas aorendimento (o que constitui tamb?m uma das linhas mestras de orienta??o propostas para a pr?xima reforma) conduziu a que hojemais de metade (56%) do rendimento total do sector agr?cola da Uni?o Europeia resulte dos apoios comunit?rios. De 141 mil milh?es de ECUS do Valor Acrescentado Bruto Agr?cola de 1995 as transfer?ncias de rendimento proporcionadas pela PAC atingem os 79 mil milh?es de ECUS. S? que, pelas raz?es que expus, 83% dos apoios foram para tr?s produtos: culturas arvenses (cereais e outros), 29%; leite, 28% e carne de bovino, 26% . Entretanto, os chamados produtos mediterr?nicos tiveram um n?vel de apoios que n?o ultrapassa os 7% (excluindo o tabaco).Alguns exemplos mais concretos. Os cereais beneficiam de ajudas directas ? produ??o correspondente a 58% do respectivorendimento total; as oleaginosas de 12% a carne de bovino de 14%. Em mat?ria de medidas de suporte de pre?os de mercado oscereais beneficiam de 11% de apoios em transfer?ncias geradas pela PAC, o leite 40% e a carne de bovino 31%. Vejamos os produtos mediterr?nicos: o vinho, as frutas e os hort?colas n?o beneficiam de qualquer ajuda directa ? produ??o, o azeite beneficia s?mente de 4% de ajudas e em mat?ria de apoios aos pre?os de mercado as percentagens oscilam entre os 1% e os 3%. Quero dizer que os dados que estou a citar n?o foram inventados pelo PCP. Eles constam de um trabalho elaborado pelo Prof. Francisco Avillez e outros especialistas para suportar a estrat?gia negocial do Governo e s?o confirmados pelos mais diversos analistas a n?vel europeu.Esta distribui??o completamente desequilibrada dos apoios - beneficiando as chamadas produ??es continentais e prejudicando asprodu??es do Sul - ?, ali?s, contradit?rio, com o facto de serem os sectores agr?colas dos pa?ses ditos mediterr?nicos (Portugal,Espanha, It?lia e Gr?cia) que mais contribuem para o VAB agr?cola da Uni?o Europeia: 53% contra 47% dos pa?ses do Centro eNorte da Europa.De todo este quadro resulta que o n?vel de apoios por agricultor (por UTA) dos pa?ses "mediterr?nicos" seja tr?s a seis vezes inferiorao que recebem os agricultores dos pa?ses do Centro e Norte da Europa. Mas mesmo esta realidade j? de si desequilibrada agrava-sequando fazemos uma an?lise mais fina, pa?s a pa?s. Aqui, os agricultores portugueses aparecem como os que menos apoios recebem da Comunidade. 1.100 ECU por activo agr?cola em apoios aos pre?os e 800 ECU por activo agr?cola em ajudas ao rendimento. A m?dia na Uni?o Europeia (a 15) ?, respectivamente, de 6.800 e 3.700 ECU; em Espanha de 3.700 e 4.100 ECU; na Gr?cia de 2.900 e 2.600 ECU; na It?lia, de 2.900 e 1.700 ECU por activo agr?cola. Perdoem-me o excesso de dados estat?sticos mas s? assim conseguimos ter uma vis?o s?ria e fundamentada do que significa a afirma??o tanta vezes repetida que a actual PAC descrimina as agriculturas e os agricultores do Sul. Mas, chegados aqui, ? necess?rio recordar que o Pa?s tamb?m tem culturas continentais - cereais e oleaginosas; carne e leite - que n?o deve abandonar pela sua import?ncia nacional, regional e social e para as quais ? necess?rio continuar a garantir pol?ticas que as n?o inviabilizem.Mas h? mais elementos de diagn?stico a reter. A PAC foi forjada para uma agricultura altamente profissionalizada - de que aHolanda, que est? na sua origem, ? o paradigma - e, portanto, os regulamentos comunit?rios privilegiam os agricultores ditosprofissionais. Os apoios s?o atribu?dos em fun??o da produ??o, da dimens?o das explora??es e do tempo de trabalho que cada umdedica ? actividade agr?cola. S? que em Portugal (e, em geral nos Pa?ses do Sul), a realidade ? completamente outra. N?s temos umaagricultura de base essencialmente familiar, a tempo parcial, policultural. Os regulamentos comunit?rios e a sua repeti??o mec?nicapelos governos portugueses, faz com que, por um lado, os apoios se concentrem nas explora??es de maior dimens?o e que, poroutro, mais de metade dos agricultores portugueses n?o tenham acesso a apoios ao investimento nem aos apoios ?s regi?esdesfavorecidas. S? podem apresentar projectos de investimento os agricultores que dediquem mais de metade do seu tempo deactividade ? agricultura e retirem dela mais de metade do seu rendimento. Tal como s? t?m acesso ?s indemniza??escompensat?rias os agricultores "profissionais". Se soubermos que em Portugal o grau de profissionaliza??o ? de cerca de 25% contravalores que oscilam entre os 58% e os 75% nos pa?ses do Centro e do Norte da Europa ent?o percebe-se porque ? que o grosso dosagricultores portugueses est? fora de qualquer sistema de apoios. E percebe-se tamb?m que o sistema fa?a com que em Portugal osapoios se concentrem particularmente nas explora??es de recorte latifundista que t?m como orienta??o econ?mica predominante oscereais e as oleaginosas. Estas culturas que contribuem somente com 1,7% para o Valor Acrescentado Bruto (a pre?os de mercado)beneficiaram em 1996 de um n?vel de ajudas ao rendimento de 190% nos cereais e de 216% nas oleaginosas quando, em contraste,as explora??es, predominantemente de tipo familiar, assentes na horticultura, na fruticultura e no vinho, que contribuem com maisde 50% para o VAB, tiveram um n?vel de suporte zero.Srs. Deputados,Quando falamos em Agenda 2000 e reforma da PAC ? isto que est? em causa. ? este modelo que acabei de apresentar. Ora, a solu??o desta quest?o n?o ? compat?vel com remendos, com pequenos neg?cios, com moedas de troca em que a agricultura e os agricultores portugueses saem sempre a perder.A solu??o desta quest?o n?o ? compat?vel com a renacionaliza??o dos custos da PAC em que 25% a 30% das ajudas directas ?produ??o seriam suportadas pelos or?amentos nacionais. Independentemente da dimens?o global concreta que este valor assuma - eque est? longe de estar esclarecido - o princ?pio da renacionaliza??o ? inaceit?vel para Portugal e p?e em causa o princ?pio da coes?o e da solidariedade t?o apregoados nos tratados. Porque a renacionaliza??o pode levar a um acr?scimo de encargos para o Or?amento nacional correspondente a cerca de metade das despesas nacionais actuais com a agricultura; porque a renacionaliza??o, tendo presente as capacidades or?amentais de cada Pa?s e o exemplo da dimens?o que j? hoje assumem as ajudas nacionais por agricultor (na Alemanha as ajudas nacionais representam 27,2% do VAB, na B?lgica, 9,2%, no Reino Unido 6,4%, na Dinamarca 4,8%) conduziria a que se acentuasse o desequil?brio entre os rendimentos dos agricultores portugueses e dos restantes pa?ses; porque a renacionaliza??o desequilibraria ainda mais os apoios ?s produ??es com preju?zo para as culturas mediterr?nicas; porque arenacionaliza??o significaria que durante d?cadas os pa?ses setentrionais foram apoiados para que as suas agriculturas sedesenvolvessem e agora os agricultores portugueses teriam de pagar os custos da irracionalidade da PAC.O Governo portugu?s, ali?s, deve dizer claramente qual ? a orienta??o que defende nesta mat?ria e em tudo o que tem a ver com areforma da PAC. A proposta da Comiss?o e a renacionaliza??o ? uma boa base de trabalho como defende o Ministro dos Neg?ciosEstrangeiros e a Secretaria de Estado dos Assuntos Europeus ou ? inaceit?vel como por vezes afirma, para consumo interno, oMinistro da Agricultura que chega a afirmar que esta proposta s? passar? por cima do seu cad?ver ? Fa?o votos para que n?otenhamos brevemente mais uma baixa no Governo!O PCP rejeita qualquer orienta??o baseada em novas e generalizadas descidas de pre?os ao produtor e que sacrifique a agricultura portuguesa no altar das negocia??es como moeda de troca de hipot?ticos ganhos noutras ?reas da Agenda 2000 bem como rejeitamos que a solu??o para o financiamento da comunidade seja encontrada ? custa da agricultura e dos agricultores.Mas o Governo portugu?s n?o pode cobrir-se exclusivamente com as consequ?ncias da PAC. Porque h? responsabilidades nacionaisinilud?veis nas pol?ticas que t?m sido seguidas. Ao longo destes anos, ap?s a integra??o comunit?ria, ontem com o PSD, hoje com oPS, o que se tem feito ? uma gest?o pol?tica e clientelar dos apoios e dos subs?dios. N?o se apostou no que seria essencial: umareconvers?o estrat?gica, tecnol?gica e ao n?vel dos sistemas produtivos, que permitisse reorientar os sistemas culturais para umaagricultura de sucesso e competitiva (o caso do Alentejo ?, a este prop?sito, paradigm?tico). N?o se apoiou prioritariamente aagricultura familiar, que ? o suporte fundamental do nosso tecido agr?cola. N?o se apostou no rejuvenescimento da popula??oactiva agr?cola nem na renova??o da sua forma??o e qualifica??o profissional. N?o se investiu na investiga??o. N?o se estimulounem o associativismo de produ??o nem de comercializa??o para os agricultores poderem fazer face ?s novas exig?ncias do mercadodistribuidor. Deitaram-se aos campos, em particular aos campos dos grandes propriet?rios e do sector agro-alimentar centenas demilh?es de contos sem resultados eficazes. N?o se acompanham as negocia??es externas com pa?ses terceiros que afectam osinteresses nacionais como foi o escandaloso acordo negociado recentemente entre o Comiss?rio Deus Pinheiro e a ?frica do Sulpermitindo que este Pa?s - e outros - continuem a usar a denomina??o Porto num vinho que fabricam. Hoje, a agricultura portuguesaest? mais fragilizada, mais empobrecida, mais desertificada. N?o ? isto a fotografia da fal?ncia de uma pol?tica ?Sr. Presidente,Srs. Deputados,O que fazer ? Avan?amos dez propostas:1? - Recusar o modelo pronto a vestir da PAC que nos querem continuar a impor e defender a aplica??o do princ?pio da coes?o, dasolidariedade e do reconhecimento da diversidade das agriculturas europeias, rejeitando uma reforma feita ?s fatias, produto aproduto, sem uma revis?o global do figurino da PAC;2? - Defender o direito a produzir e o direito de cada povo se alimentar. Reclamar para a agricultura tr?s val?ncias: produtora dealimentos de qualidade para os consumidores; preserva??o da ocupa??o e do ordenamento do territ?rio; preserva??o domeio-ambiente;3? - Recusar a renacionaliza??o dos custos da PAC;4? - Prop?r que seja dado aos produtos mediterr?nicos tratamento similar aos concedidos ?s produ??es dos pa?ses setentrionaisintroduzindo para aqueles o sistema de apoios ? produ??o e de medidas de suporte de pre?os, no respeito, ali?s, pelas conclus?es doConselho Europeu "jumbo" de Setembro de 1993;5? - Defender a modula??o, isto ? a fixa??o de apoios degressivos ao investimento e de um tecto para as ajudas ao rendimentofixando-se um limite m?ximo por explora??o. A modula??o deveria tamb?m permitir uma majora??o dos apoios tendo em conta oemprego gerado e o rendimento m?dio dos produtores europeus;6? - Alargar o acesso aos apoios ao investimento bem como as indemniza??es compensat?rias a todos os agricultores;7? - Estabelecer um sistema de apoios que permita dar resposta a explora??es assentes numa agricultura poli cultural e que estimulem a reconvers?o tecnol?gica e cultural;8? - Ligar os apoios ? produ??o ? fun??o de preserva??o do meio-ambiente e ocupa??o do territ?rio e ? produ??o de produtos regionais de qualidade;9? - N?o aceitar que a agricultura portuguesa fique amarrada aos seus n?veis hist?ricos de produ??o e produtividade porque talsignifica amarrar o atraso da agricultura portuguesa ao seu pr?prio atraso;10? - Recusar o agravamento do processo de liberaliza??o dos mercados agr?colas com o desaparecimento das ajudas e da protec??o existentes para os produtos agr?colas em curso no seio da OCDE e da OMC.Sr. Presidente,Srs. Deputados,Estas s?o a nossa reflex?o, as nossas preocupa??es e cr?ticas, as nossas propostas para um tema de ineg?vel import?ncia nacional edecisivo para a configura??o da Europa que se quer construir. Uma Europa onde recusamos que seja eliminado, em nome dossacrossantos interesses do mercado e das restri??es or?amentais, um sector produtivo essencial ? seguran?a alimentar dosconsumidores, ao futuro dos produtores e ao seu rendimento e ? sobreviv?ncia e desenvolvimento de um mundo rural moderno edinamizador do territ?rio.Disse.