Intervenção

Interven??o do deputado<br />Debate de Urg?ncia sobre

Senhor Presidente, Senhores Membros do Governo, Senhores Deputados,

A seca que tem abalado várias regiões e sectores de actividade do País, como o Alentejo e a agricultura, pode vir a ameaçar igualmente o abastecimento de água às populações nalgumas localidades. A queda de chuva que se registou nos últimos dias não é, de todo em todo, suficiente, para responder à situação criada desde há mais de mês e meio a esta parte e para recuperar os baixeis níveis já visíveis nas albufeiras. Nalguns casos, com a queda forte de granizo (como na zona de Viana do Alentejo e Alcáçovas) foi até contraproducente e conduziu à destruição de muitas culturas hortícolas e do processo inicial de formação dos cachos na vinha (os pâmpanos).

A seca é, em Portugal, um fenómeno periódico e, portanto, não inesperado de todo. Portugal não tem um clima e regimes pluviométricos regulares como acontece, por exemplo, na Europa central, onde quase se pode prever quando e quanto chove.

É por isso que, em Portugal, - como noutros países da bacia e da orla mediterrânea - com a irregularidade do nosso regime de chuvas, as consequências das nossas específicas condições climatéricas só podem ser combatidas - ou atenuadas - com medidas estruturantes, de que destaco três: · na agricultura, uma adequação dos sistemas culturais à especificidade das nossas características edafo-climáticas; · para os agricultores um sistema de cobertura de riscos - um verdadeiro seguro agrícola, pecuário e florestal - construído a pensar na agricultura e não a pensar nos interesses das seguradoras. Só isso permitirá que em situações como se voltam a viver agora os agricultores não fiquem na dependência das medidas pontuais do Governo e da "compreensão" da Comissão Europeia; · em terceiro, a multiplicação da nossa rede de armazenagem de água. Se Alqueva já estivesse construído, como há muito o PCP reclama, seguramente que o Alentejo não se veria periodicamente a braços com as consequências da seca ou, no mínimo, elas seriam extraordinariamente atenuadas.

Aliás, a propósito desta questão tem-se falado muito sobre o Convénio Luso-Espanhol para a gestão dos recursos hídricos e das bacias hidrográficas. Importa dizer que, sem prejuízo de críticas a alguns aspectos do Convénio e ao facto da respectiva Comissão de Acompanhamento ainda não estar a funcionar, a principal crítica reside no facto de Portugal e os Governos portugueses se terem atrasado na construção das suas albufeiras que nos permitisse armazenar os caudais que estão garantidos no Convénio, ficando dependentes da libertação por Espanha de caudais mínimos em determinados períodos do ano que são, exactamente, aqueles mesmos períodos de seca que também afectam o país vizinho. Esta é que é a questão central a propósito do Convénio Luso-Espanhol.

As medidas que propomos atrás são, pois, medidas de fundo. Em vez delas o que temos, sempre que enfrentamos um problema de seca, são medidas avulso, pontuais, anunciadas pelo Primeiro-ministro e pelo Ministro da Agricultura e que mais parecem ter como intenção esvaziar qualquer eventual movimento reivindicativo dos agricultores do que dar respostas de fundo aos problemas existentes.

Não negamos a necessidade, para atenuar os problemas de imediato, de algumas medidas que o Ministro anunciou ir propor à Comissão Europeia como o do alargamento do set-aside voluntário e obrigatório, da possibilidade de pastoreio das áreas de cereais perdidas, sem prejuízo do pagamento dos respectivos subsídios comunitários, bem como a substituição das áreas de cereais por áreas de girassol, dos apoios para o abeberamento dos gados a que propomos que se juntem medidas de apoio ao relançamento da actividade agrícola nas explorações e zonas afectadas, designadamente com o estabelecimento de moratória sobre as dívidas contraídas para a exploração perante o sistema bancário, como, aliás, o PCP propôs para a seca de 1995 e o Governo assumiu, então.

Medidas que, contudo, não podem, como foram as anteriores, ser absorvidas na sua quase totalidade pelas grandes empresas do sector-agro pecuário e agro-industrial. Exigimos do Governo que a regulamentação das medidas crie os mecanismos necessários a que os mais afectados, as pequenas explorações familiares não sejam, como é usual, discriminadas no acesso aos apoios.

Mas medidas que também devem ser alargadas aos pequenos produtores de hortícolas e de vinha afectados pela inesperada queda de granizo que se deu nalgumas zonas do Alentejo.

Mas dito isto, volto ao inicio. São precisas igualmente medidas de fundo como as que propusemos. Neste plano, como todos sabemos, o actual Ministério da Agricultura tem-se caracterizado por uma inaceitável ausência de perspectivas. O que o preocupa é a gestão dos conflitos e, sobretudo, a gestão dos interesses. Nada que aponte para as medidas de fundo que a agricultura portuguesa necessita. E nada nos diz que não continue a ser assim.

Da nossa parte, continuaremos a pugnar por aquele que é o único caminho de futuro da agricultura portuguesa: alterações estruturais que tenham como principais destinatários a grande maioria dos agricultores que são os agricultores de base familiar, como vista a manter um tecido social diversificado no quadro de uma agricultura desenvolvida e ambientalmente sustentável.

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