O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP) tem vindo a acompanhar com atenção a projetada intervenção na Cascata da Fecha de Barjas, também conhecida por Cascata do Tahiti, no Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG), aliás a única área protegida em Portugal com a classificação de Parque Nacional.
Localizada no lugar de Ermida, freguesia de Vilar da Veiga, concelho de Terras do Bouro, a Cascata de Barjas, no Rio Arado, pela sua beleza excecional e inserção natural, exerce uma forte atração sobre visitantes, em busca da fruição da Natureza, mas é também um ponto extraordinariamente problemático, desde logo em termos de acidentes, muitos deles graves e obrigando frequentemente a complexas (e dispendiosas…) operações de resgate e socorro.
As inúmeras cascatas, linhas de água, lagoas e “piscinas naturais” do PNG, nas serras do Gerês, Peneda, Soajo e Amarela, são, de resto, atrativos irresistíveis da nossa mais importante área protegida, que colocam sérios problemas em termos de conservação da natureza e de gestão da visitação em segurança, para a qual é indispensável mais investimento público em domínios como a educação para a natureza, a regulamentação e ordenamento da visitação, em particular a definição de trilhos e percursos pedestres, restrições de zonas a aceder, entre outras medidas.
Embora represente uma pequeníssima área de afloramentos de elevado risco (de poucas centenas de metros quadrados) nos cerca de 70 mil hectares do PNPG, a Cascata de Barjas concentra cerca de um terço do total das ocorrências registadas de acidentes com pessoas feridas em todo o Parque Nacional. Em 2023, por exemplo, as estruturas de socorro registaram oito ocorrências; nesta altura do ano, vão já em seis, a última das quais no passado dia 31 de julho.
É, por isso, compreensível que as autoridades locais e regionais, incluindo os responsáveis pelo PNPG, tenham encarado a necessidade de criação de condições para uma visitação mais segura ao local, e que, no âmbito da medida 2.2.2. (“Valorizar dos equipamentos e infraestruturas de apoio à visitação”, com um investimento de quase 9,2 milhões de euros, o Plano de Cogestão do Parque Nacional da Peneda Gerês tenha consagrado uma intervenção destinada ao “Ordenamento da visitação na ‘Cascata de Barjas’”, uma obra estimada em mais de 250 mil euros a suportar pelo Fundo Ambiental.
De acordo com as informações e imagens já divulgadas, a intervenção consiste essencialmente no alargamento da via, na criação de zonas de estacionamento e de estar para os visitantes e na construção de um amplo miradouro projetado sobre as cascatas, em sistema de “passadiço”, incluindo aparentemente uma ponte sobre o rio, e suportado numa estrutura de “estacas” metálicas.
Para o efeito, o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) emitiu um “parecer favorável condicionado”, sujeitando a intervenção “ao cumprimento de um conjunto de requisitos que visam a minimização do impacto causado pela intervenção”, segundo a resposta escrita do seu Conselho Diretivo a um pedido de esclarecimentos do “Jornal de Notícias”, sem, contudo, especificar tais requisitos.
Ainda segundo o referido diário, o ICNF garante que a proposta de intervenção “permitirá o ordenamento e a melhoria das condições de visitação” ao local em causa, “minimizando o impacte da presença humana sobre os valores naturais existentes, bem como eventuais riscos associados à utilização de uma área de afloramentos rochosos, ao mesmo tempo que contribuirá para melhorar as condições de resgate e socorro em caso de acidente”.
Embora se trate de uma área de proteção complementar e ambiente rural, a zona de intervenção em causa apresenta valores naturais que importa preservar, desde logo dos efeitos do acréscimo de pressão – humana, mas sobretudo automóvel – que certamente vai ser gerada pela melhoria das condições de visitação e especialmente potenciada pela implantação de um passadiço/miradouro, estrutura que colhe grande predileção entre os turistas.
O PCP considera que a fruição da natureza pelas populações e a democratização da visitação devem ser garantidas, constituindo aliás importantes contributos para o desenvolvimento sustentável especialmente das populações que vivem no interior das áreas protegidas.
Mas cabe ao Estado assegurar que o acesso a esses locais não compromete nem a conservação dos valores naturais nem a segurança dos visitantes, devendo promover a regulamentação e as medidas de ordenamento e gestão da visitação adequadas.
No caso em apreço, é indispensável garantir que estarão protegidos tanto os valores naturais como a integridade dos visitantes, especialmente nas situações de grande afluxo e face aos riscos, designadamente de queda e de incêndio.
Assim, ao abrigo da alínea d) do artigo 156.º da Constituição e nos termos e para os efeitos do 229.º do Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do PCP solicita ao Governo que, por intermédio das ministras do Ambiente e Energia e da Administração Interna, lhe sejam prestados os seguintes esclarecimentos:
1 – Que impactes da intervenção em causa foram identificados pelo ICNF?
2 – Que requisitos, determinados pelo ICNF, deve cumprir a intervenção proposta?
3 – Tendo em conta que se perspetiva o início da obra, recebeu o ICNF garantias de que os requisitos identificados serão integralmente cumpridos?
4 – Além do ICNF, foram oportunamente consultadas a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) e a Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC), no que tange à gestão do domínio público hídrico e às vantagens e desvantagens em matéria de emergência e socorro?
5 – Em caso afirmativo, que avaliações, reparos e recomendações foram feitos?
6 – Entre os requisitos invocados pelo ICNF na resposta ao “Jornal de Notícias” referida supra, constam restrições de acesso ao ponto crítico, quer normativos, quer físicos, designadamente com a instalação de barreiras e sinalética?
7 – Na ponderação da intervenção em causa, foi considerada a vantagem em promover iniciativas e ações de sensibilização e educação para a visitação em espaços naturais, designadamente em termos de riscos, tipo de calçado e vestuário desaconselháveis e criação e conservação de percursos pedestres devidamente sinalizados e homologados?
8 – Na avaliação dos impactes da intervenção em causa, foi especificamente considerado o aumento significativo da carga de presença humana e automóvel, devido ao efeito de atração do passadiço/miradouro a construir?
9 – Nesse caso, que avaliação foi feita relativamente aos impactes sobre a fauna e a flora?
10 – Qual é a previsibilidade de ocorrência de maior número de acidentes – designadamente quedas diretas do miradouro e resultantes tentação de maior aproximação ao “objecto” observado?
11 – Tendo em conta a evidente escassez de meios do PNPG para as atividades correntes do Parque Nacional, mas considerando também a tendência de aumento da visitação em geral nesta área protegida, que medidas de reforço das equipas de vigilantes da natureza estão a ser tomadas?
12 – Considerando os riscos associados à visitação em locais como a Cascata da Fecha de Barjas, está concretamente prevista a presença permanente no local de vigilantes da natureza que, entre outras funções, assegurem informações e conselhos aos turistas?
13 – Tendo em conta que o Rio Arado se desenvolve num vale encaixado, suscetível de proporcionar o chamado “efeito de chaminé” em caso de incêndio florestal, que ponderação foi feita relativamente aos riscos para pessoas e bens (veículos, por exemplo) ali concentrados em maior número?
14 – A massa de visitantes e a afluência de viaturas automóveis esperadas, sobretudo em certos períodos do ano, é compatível com a plena fluidez das operações de resgate e socorro e de manobra dos meios operacionais exigíveis em quaisquer situações de emergência?