Senhor Presidente, Senhores Deputados,A recente deslocação que a Comissão de Agricultura realizou ao Douro e ao Vale do Mondego, na sequência de uma proposta do PCP, bem como a visita de Deputados Comunistas à mesma região, bem como Águeda, Baixo Vouga e Santarém permite-nos estar hoje aqui a intervir com reflexão própria e com conhecimento concreto de causa não só em resultado das visitas feitas mas também dos contactos e reuniões realizadas com quem, no terreno, tendo sofrido o drama e a violência das intempéries e das cheias conheceu, porventura melhor que ninguém, as razões que ampliaram as consequências da excepcional e concentrada pluviosidade ocorrida em finais de Janeiro e as medidas que é necessário aplicar especialmente ao nível das compensações para a população, agricultores e autarquias atingidas.Com a nossa solidariedade a todos os afectados pelas cheias e pela violência dos temporais importa debruçarmo-nos sobre dois tipos de questões: uma, de ordem estrutural e organizacional em relação aos projectos hidro-agricolas, questão que se coloca particularmente em relação à bacia do Mondego, outra, de ordem mais imediata e que se prende com a necessidade de aumentar, diversificar e agilizar os pagamentos compensatórios, indemnizações e apoios a todos quantos sofreram as consequências dos dramas ocorridos.Quanto à obra hidráulica do Vale do Mondego, obra que evidentemente teve e continua a ter um papel positivo na regularização do "basófias", a questão central que deu lugar, com o rompimento dos diques, ao alagamento de Montemor-o-Velho e Ereira tem a ver, em nossa opinião, com a falta de manutenção da obra hidráulica do Mondego. O complexo (de certo modo notável, para a época) sistema de diques com sifões não funcionou porque o sistema de sifões estava deteriorado e entupido e, portanto, não puderam cumprir a sua função na ponta de cheia. E isto porque a gestão do sistema Mondego e de outros empreendimentos hidro-agrícolas foi, na prática, abandonada, a partir de 1993 com as alterações orgânicas que, então, o Ministério do Ambiente sofreu e que não foram modificadas com o PS. Toda a estrutura de gestão e manutenção no local foi desmantelada. Hoje limita-se, de quando em quando, a um técnico do INAG que passa pelo local em visitas inconsequentes. Isto é, o Estado desresponsabilizou-se e deixou de cumprir e a sua função vital de acompanhamento do sistema.Esta é, seguramente, senhores deputados, uma questão central que explica a dramática dimensão que as cheias atingiram a somar a outras como a da suspensão, por alegada falta de verba, da regularização do Arunca. É certo que o caudal libertado pela Barragem do Aguieira aumentou em apenas três horas para valores na ordem dos 2000 m3/segundo, mas se não tivesse havido a negligência irresponsável de desmantelamento do sistema local de vigilância do INAG as consequências das cheias teriam, pelo menos, sido fortemente minimizadas.No Baixo Vouga as inundações frequentes de Águeda, devem-se, por um lado, à obstrução do leito da foz do rio com várias construções em aterro e, particularmente, junto de uma das pontes construídas que não dispõe de vazão adequada. Quando chove mais, tudo isto funciona como uma barragem e Águeda transforma-se em "albufeira", a que acrescem as escorrências do Caramulo e os erros urbanísticos realizados.No Douro, uma pergunta se coloca. Onde está um plano operacional de redução dos efeitos das cheias nos rios luso-espanhóis, que deveria ter sido desenvolvido na sequência do convénio? Não existe.Como em Santarém podemos perguntar onde está o trabalho periódico de vigilância e conservação das escarpas?Estas são questões de fundo, senhores deputados, que importa aprofundar e onde é claro que os disparates urbanísticos, a irresponsabilidade de se ter liquidado uma estrutura descentralizada de intervenção permanente no terreno, a falta de conservação do património, tudo contribuiu para o avolumar das consequências da intensa e anormal pluviosidade ocorrida.Por isso o PCP apresentou também, juntamente com o Projecto de Resolução que hoje debatemos, um outro, a agendar oportunamente, de "Medidas de Prevenção" onde propomos, entre outras medidas, a instituição e funcionamento de um centro operacional de prevenção, alerta e intervenção para cheias, e a clarificação da utilização do domínio hídrico.Quanto às questões mais imediatas de socorro, apoio e reconstrução, as medidas adoptadas pelo Governo são claramente insuficientes, limitando-se à abertura de linhas de crédito com juros bonificados e a operações de engenharia financeira entre os vários programas disponíveis no âmbito do III QCA. O que é manifestamente pouco.Em primeiro lugar, há populações, agricultores e comerciantes que ficaram, literalmente falando, com a roupa que traziam no corpo, viram os stocks dos seus estabelecimentos perderem-se nas águas, viram os seus campos de milho e as suas vinhas totalmente destruídas. É preciso, no imediato, disponibilizar alguns apoios a fundo perdido.Segundo - Em relação às autarquias, mesmo considerando que o recurso ao crédito para este fim não conta para os limites de endividamento, a verdade é que há autarquias cujo limitado Orçamento não lhes permite assumir grandes encargos para fazer face às estradas e pontes que se abateram ou aos edifícios que ruíram.Terceiro - O seguro agrícola, mais uma vez, não funcionou. É necessário terminar com a sua dependência da ocorrência dos acidentes climatéricos dentro de certos calendários, para que não suceda, como no Douro, em que mesmo aqueles que fizeram seguro não serão indemnizados porque as violentas chuvadas e cheias do Douro ocorreram depois de 31 de Outubro.Quatro - É preciso garantir, no Douro, compensações para os rendimentos perdidos em resultado da destruição das vinhas mas também apoios para suprir os anos que aí virão de falta de rendimentos até que as novas vinhas a plantar (nos casos em que isso é possível e onde deve ser preservado o sistema tradicional de pedraposta) comecem a produzir. Um caminho possível é aumentar para a Região Demarcada do Douro o aumento do plafond para as indemnizações compensatórias.Quinto - Na bacia do Mondego é não só necessário encontrar apoios para a perda de cerca de 400 hectares de milho, mas fazer obras de emergência, mesmo provisórias, de reparação dos diques e do canal de rega principal que garantam o início da campanha do arroz em Abril próximo.Sexto - É necessário que os procedimentos para a apresentação de projectos de reconstrução sejam agilizados e desburocratizados.Sétimo - A protecção civil, onde ainda não o fez, deve repor certas infraestruturas, como pequenos pontões que facilitem a mobilidade de populações que ficaram isoladas pela destruição das redes de comunicação.Finalmente, defendemos a realização de inquéritos, com a participação de entidades locais, que permita apurar e aprofundar causas estruturais e de funcionamento e coordenação dos serviços públicos no terreno.Estas são as nossas reflexões e propostas sérias que trazemos a este debate, responsabilizando o Estado pelas funções de controle das obras hidráulicas de que, também neste sector, se tem vindo a demitir; propondo medidas de prevenção para o futuro e apoios imediatos e eficazes a quem sofreu e sofre na pele os acontecimentos ocorridos.É um debate sério que queremos que se faça. Porque o problema é sério e exige respostas sérias.