Como é conhecido, na última década agravaram-se as desigualdades na União Europeia e o número de pessoas a viver com baixos rendimentos é da ordem dos 65 milhões, ou seja, cerca de 18% da população, o que se tornou um verdadeiro escândalo, sobretudo se tivermos em conta as taxas de crescimento económico dos últimos anos. Trata-se de um verdadeiro atentado aos direitos humanos fundamentais dado impedir que milhões de pessoas tenham acesso aos direitos sociais básicos, designadamente de alojamento, saúde, educação, formação e cultura, emprego de qualidade e salários justos. Embora existam grandes diferenças entre os diversos Estados-membros, o certo é que a situação mais grave é a de Portugal com cerca de 24% da população em situação de pobreza, devido, sobretudo, aos baixos salários, ao emprego precário e mal pago e a pensões e reformas de tal modo baixas que não permitem um mínimo de vida digno nem a trabalhadores e suas famílias, nem a pessoas de idade. Esta situação inadmissível de pobreza e exclusão social, que o Conselho Europeu de Lisboa, de 23 e 24 de Março, reconheceu exigir medidas urgentes, implica que haja uma profunda alteração das políticas macro-económicas a nível comunitário e nacional pondo cobro ao primado das políticas monetaristas do Pacto de Estabilidade, a fim de não apenas lutar contra a actual situação de pobreza, mas também de prevenir novos agravamentos no futuro, incluindo na área das novas tecnologias, com especial destaque para as mulheres, as crianças e a juventude, garantindo a todas as pessoas o acesso a níveis de rendimento e a condições dignas de vida e de trabalho. No entanto, apesar de todos os compromissos que o Conselho assumiu ainda recentemente na Cimeira de Lisboa, do sublinhado que fez da correlação existente entre progresso económico e progresso social, as propostas apresentadas pouco mais são do que o salvar da face relativamente às inúmeras promessas de lutar pela erradicação da pobreza. De facto, a proposta de programa comunitário que a Comissão apresentou para incentivar à cooperação entre os Estados-membros em matéria de luta contra a exclusão social, pouco mais é do que um programa de estudos. Assim, é fundamental que se reforcem vários aspectos do programa, designadamente quanto às inovações que se propõem na aplicação do método aberto de coordenação, seja a criação do Grupo de Reflexão a nível europeu, constituído por parceiros comunitários, representantes das ONG com experiência neste domínio, bem como representantes do Parlamento Europeu, do Conselho e dos Comités Económico Social e das Regiões, seja a colocação em rede dos diferentes observatórios ou organismos similares reconhecidos existentes nos Estados-membros, seja ainda uma especial atenção aos problemas da pobreza e exclusão social a nível local, regional e nacional, com envolvimento no programa dos grupos populacionais mais atingidos ou ameaçados de o poder vir a estar. Igualmente importantes são as propostas de aumento do financiamento de 70 para 100 milhões de euros, as que insistem na necessidade da Comissão assegurar a coerência das suas políticas, nomeadamente nos domínios económico, monetário, fiscal, de concorrência, de protecção dos consumidores, das pescas e agrícola, com o objectivo de eliminação da pobreza e da exclusão social que é concretizado a nível nacional, devendo, para tal, proceder a uma avaliação das suas políticas quanto aos seus possíveis efeitos na pobreza e exclusão social. Espero, igualmente, que sejam aprovadas as propostas que visam reconhecer que a qualificação e a integração na vida profissional assumem uma relevância particular, pelo que importa ter em conta o fenómeno cada vez mais importante dos "working poor", ou seja, da exclusão social e da pobreza apesar do exercício de uma actividade profissional remunerada. É fundamental garantir um emprego de qualidade, com direitos e salários dignos e criar condições de acesso a serviços públicos também de qualidade. É essencial que o Conselho cumpra as promessas que fez, não apenas relativamente ao programa, mas também quanto à fixação de objectivos e de metas adequadas a acordar até ao final deste ano, de forma a não defraudar as expectativas que criou com as conclusões da Cimeira de Lisboa relativamente ao seu empenhamento no combate à pobreza, ao desemprego e à exclusão social. Por último, quero agradecer a excelente colaboração dos colegas membros da Comissão do Emprego e Assuntos Sociais, dos Relatores de outras Comissões, dos Comités Económico Social e das Regiões, das ONG sociais e dos técnicos que a nível da Comissão, da Presidência Francesa e do Parlamento trabalharam comigo. Desse trabalho, e tendo em conta que estamos numa matéria de co-decisão, foi possível estabelecer um consenso que visa simplificar o relatório final e facilitar a sua aprovação rápida pelo Conselho, pelo que as propostas que apresentamos para votação amanhã são o resultado do consenso obtido no seio da Comissão, incluindo as novas propostas de substituição e as de supressão de várias emendas com algo de repetitivo. Agradeço, pois, a vossa compreensão para este processo, de forma a contribuirmos para que a União Europeia volte a ter um programa nesta área, apesar das suas limitações e insuficiências. Mas será mais um instrumento para nos mantermos mais alerta na defesa de uma maior justiça social.