Senhor Presidente, Senhores Deputados, Senhor Ministro e restantes membros do Governo:
Estamos a viver uma situação em que todos os dias os direitos dos trabalhadores são afrontados, argumentando-se com as exigências da competitividade.
O dogma da competitividade justifica hoje todas as actuações que tentam delapidar o que gerações levaram décadas a construir.
Aumenta a falta de qualidade do emprego e o emprego vai-se degradando à medida que os trabalhadores efectivos são substituídos por trabalhadores com vínculos precários, muitos deles em condições de clandestinidade e ilegalidade, sem descontos, nem direitos de Segurança Social.
Os baixos salários, e a extrema precaridade que imperam naqueles sectores e empresas são bem o exemplo da degradação do emprego que vai sendo criado à sombra da desregulamentação a que o Governo fecha os olhos ou até estimula.
Se as estatísticas do emprego e do desemprego vão repetindo que nos tempos que correm este Portugal cor-de-rosa tem cada vez mais emprego e menos desemprego, vendo o que vemos à nossa volta, temos que perguntar - mas afinal, que emprego é este?
A questão do emprego com direitos é de grande actualidade, já que por parte do grande capital, e dos seus centros de decisão, está em curso uma ofensiva geral contra direitos que se julgavam irreversíveis.
Existe hoje de norte a sul do país trabalho ilegal e clandestino, trabalhadores que laboram durante anos sem seguro, sem segurança social e, por conseguinte, sem qualquer protecção social em caso de acidente de trabalho, doença ou desemprego.
E tanto mais grave é quando é o Estado a dar o exemplo. Veja-se o que se está a passar na EPAC.
O Governo decretou extinguir a EPAC. Como resultado desta medida estão cerca de 70 trabalhadores na lista para o desemprego, tendo-lhes já sido dado um prazo até 31 de Maio - ou saem a bem, ou saem a mal!
Não é de surpreender o que se passa em muitas empresas do sector privado quando o Estado tem esta postura. De facto, certos sectores do patronato sentem-se galvanizados e hoje não há sector, não há distrito onde a instabilidade no emprego não se tenha acentuado.
Só no distrito de Lisboa são 256.600 trabalhadores por conta de outrém que não têm vínculo permanente.
Mesmo nas novas empresas das telecomunicações que têm sido apresentadas pelo Governo como nova fonte de qualidade de emprego, existem situações escandalosas. Um exemplo desta situação são empresas do sector que introduzem cláusulas no contrato de trabalho que obrigam os trabalhadores a estarem disponíveis para a empresa durante 24 horas/dia, mediante o pagamento de 67.500$00 mensais.
Outro exemplo, a FERTAGUS, empresa recentemente criada para fazer a travessia ferroviária entre as duas margens do Tejo, tem 144 trabalhadores, 120 dos quais com vínculo precário.
No distrito de Setúbal, com uma elevada taxa de desemprego (mais de 11% de desempregados) é tanto mais preocupante quando a tendência da precarização dos contratos vai crescendo.
O caso da Lear Corporation é um exemplo paradigmático - tem cinco trabalhadores efectivos num total de 2060 trabalhadores.
A NORPORTE, que após promessas eleitorais da parte do Governo, encerrou, colocando no desemprego 500 trabalhadores.
A rapidez da decisão do Tribunal em relação a um dos credores da NORPORTE contrasta, pela negativa, com o que se passa como pagamento dos créditos aos trabalhadores da GEFA e MUNDET, que estão à espera de os receber há cerca de uma dezena de anos.
Se formos aos exemplos dos salários, no distrito de Lisboa, na sequência do encerramento de 165 empresas, milhares de homens e mulheres continuam a aguardar que o patronato lhes pague uma dívida superior a 21 milhões de contos!
No distrito do Porto, as dívidas do patronato em seis sectores atingem os 2.193.000 contos. Só na metalurgia são 1.600.00 contos de indemnizações; e 5.236.000 contos de dívidas à Segurança Social.
Muitos outros exemplos poderiam ser dados.
Numa empresa do sector de electrónica, Roederstein, em Vila Nova de Famalicão, é desencadeado em 1999 um processo de despedimento de trabalhadores com cessação de 120 contratos a prazo, de rescisão de contratos com mais de 100 trabalhadores com desencadeamento de mecanismos de lay off. E logo a seguir, em Novembro e Dezembro, são colocados na empresa, em regime de trabalho temporário, de "aluguer" ao mês, 95 trabalhadores por uma empresa de contratação de mão-de-obra, a maioria dos quais eram os mesmos trabalhadores que tinham sido despedidos poucas semanas ou meses antes.
Senhor Presidente, Senhor Ministro, Senhores Deputados,
Vou fazer uma breve referência ao sector da construção civil, que com cerca de 400 mil trabalhadores, 80% trabalham em regime precário e uma grande parte dos quais nem sequer estão inscritos na Segurança Social. Um sector onde abunda o trabalho clandestino.
Em muitas situações, não se trata tão pouco de trabalho precário, são trabalhadores sem vínculo contratual, é mão-de-obra ilegal, trabalho clandestino negro e explorador.
Os acidentes de trabalho graves e mortais são diários. Só em 1998 verificaram-se 429 acidentes mortais. O trabalhador sujeita-se a trabalhar sem o mínimo de regras de segurança. Para manter o seu emprego, o trabalhador tem que adaptar-se à situação, às directivas que lhe são impostas.
Por paradoxo que pareça, o trabalhador, em muitas situações, perde a vida para viver.
Senhor Presidente, Senhores Deputados, Senhores Ministros:
Este é o retrato a preto-e-branco, mais preto do que branco, que pouco tem a ver com as imagens coloridas que o Governo apregoa aos portugueses.
Senhor Ministro: não são exemplos isolados. São exemplos que ilustram, entre muitos outros, a nossa interpelação e a má qualidade do emprego hoje em Portugal.
Os direitos dos trabalhadores, o seu grau de justiça, o reconhecimento e fiscalização do seu exercício e a sua própria dimensão são sempre factores que caracterizam qualquer sociedade.
Há quem tenha grande habilidade para criar ilusões, desbaratar palavras sem construir soluções para os verdadeiros problemas, como aconteceu na chamada Cimeira do Emprego.
Aquilo que o PCP hoje aqui está a fazer, é denunciar ilegalidades, apontar caminhos e apresentar propostas, para os problemas concretos que afectam milhares de trabalhadores portugueses. É preciso restituir aos trabalhadores o sinal e o chamamento da dignidade e da esperança.