Pergunta ao Governo N.º 3438/XII/1

Ilegalidade e prepotência do Ministério da Educação e Ciência e nota informativa da DGAE sobre identificação da componente lectiva dos horários

Ilegalidade e prepotência do Ministério da Educação e Ciência e nota informativa da DGAE sobre identificação da componente lectiva dos horários

Durante o dia 2 de Julho de 2012 foi colocada em linha, no sítio da Direção Geral da Administração Escolar (DGAE), sem qualquer aviso aos directores, uma nota informativa sobre a identificação da componente lectiva dos horários escolares.
Durante o dia 3 de Julho muitos directores de escolas foram surpreendidos pelo conteúdo dessa nota informativa e confrontados com um conjunto de ordens directas sem qualquer respeito pela legalidade e numa clara afronta e mesmo ameaça aos directores.
O Governo PSD/CDS e o Ministério da Educação e Ciência, na linha da fúria que têm vindo a manifestar contra a Escola Pública e o emprego docente, têm agido manifestamente à margem da lei e da ordem democrática. Antes mesmo de ser publicado o diploma legal sobre a revisão da estrutura curricular, já o Governo e o MEC haviam enviado as matrizes curriculares para as escolas, assim exigindo às direcções que apliquem matrizes sem qualquer respeito pela lei em vigor. A estratégia do Governo é clara: criar uma realidade nas escolas que, apesar de ilegal, materialize o conteúdo de uma revisão da estrutura curricular, retirando à Assembleia da República a capacidade de intervenção atempada por via de Apreciação Parlamentar, tal como o Partido Comunista Português já anunciou ter intenção de provocar.
A exigência agora colocada pela DGAE aos directores das escolas vem consolidar esta forma de actuação política marginal e anti-democrática, bem como manifestamente prepotente.
A nota informativa publicada no sítio da DGAE exige aos directores das escolas que identifiquem a componente lectiva dos horários até dia 6 de Julho, ou seja, quatro dias depois da sua divulgação. Mas igualmente grave é o facto de o fazer sem que existam condições objectivas para que os directores cumpram tais comandos. Como o Governo certamente conhecerá, ainda não são públicos os resultados dos exames nacionais e, consequentemente, não são conhecidas as matrículas, o que impossibilita qualquer previsão minimamente fiável ou aproximadamente real da distribuição do serviço lectivo nas Escolas.
A Associação Nacional de Dirigentes Escolares descreve muito bem o sentimento e as preocupações com que se defrontam os seus associados:
«Trata-se de um exercício primário de autoridade e de irresponsabilidade que a ANDE não pode deixar de verberar e denunciar nos seguintes termos:
A ANDE considera irregular a determinação da DGAE no sentido de os diretores identificarem os docentes para os quais não possuem componente letiva para 2012/13.
Com efeito;
Não foi publicado o diploma que altera as matrizes curriculares e, consequentemente, a definição do serviço letivo a atribuir em cada turma não pode, em rigor, ser identificado Não foram ainda publicados os resultados dos exames nacionais, não se concluíram os processos de avaliação dos alunos do 6º, 9.º, 11.º e 12.º ano de escolaridade nem, consequentemente, os respetivos processos de matrícula/renovação de matrícula;
Não estando concluído o processo de matrícula /renovação de matrícula de todos os alunos não é possível fazer previsões seguras sobre o número de alunos a frequentar cada escola, cada curso e cada disciplina, muito menos responsabilizar aqueles a quem se incumbe essa tarefa.
Pelo que se torna manifestamente impossível determinar com rigor ou com uma aproximação razoável o serviço letivo de cada escola para o próximo ano escolar.
Por conseguinte, a ANDE considera que, apenas por desconhecimento da realidade escolar, sem qualquer sustento legal sólido, antes afrontando o que dispõe a legislação sobre a matéria (data limite das matrículas: 15/06/2012 ou o 3.º dia útil após publicação dos resultados dos exames), se pode entender que venha a DGAE incumbir os diretores das escolas e agrupamentos de escolas da obrigação de identificarem os professores sem serviço letivo para 2012/13, quando, note-se bem, ainda não está nem pode estar definido o serviço letivo para o próximo ano.
A ANDE não pode, também, deixar de verberar e denunciar que a DGAE, retorcendo as mais simples normas administrativas e os mais básicos preceitos éticos pretenda que os diretores adivinhem o serviço que a escola vai ter no próximo ano, ameaçando-os consecutivamente e por três vezes, de que serão responsabilizados disciplinarmente se não executarem as orientações constantes da “nota informativa” atrás referida.»
Também a Fenprof, além de divulgar veemente protesto, levanta um conjunto de legítimas e compreensíveis dúvidas:
“Neste documento divulgado pela DGAE, é omitida a forma de ordenar os docentes para efeitos de distribuição de serviço (graduação profissional), apesar de, hoje, se encontrar devidamente fixada no diploma de concursos recentemente publicado. Ignorando essa disposição legal, há quem continue a adotar critérios diferentes. São também referidas diversas situações passíveis de resultarem em horário-zero, mas nunca se esclarece se a ordenação dos docentes colocados por concursos diferentes (do quadro de escola ou agrupamento, do QZP ou destacados de origem diversa) obedece a alguma hierarquização de situações ou se a graduação deverá ser alheia a esse facto, sendo elaborada uma lista com todos, independentemente da sua origem.
Também não se esclarece como poderá uma escola considerar docentes que nela se encontram ou dela se encontram destacados: qual das escolas deverá declarar, sendo o caso, o horário-zero desse docente?”
Na verdade, torna-se cada vez mais evidente que a estratégia do Governo consiste apenas no despedimento colectivo de professores e na criação de condições para o alastramento da situação de ausência de componente lectiva, assim enviando artificialmente para a mobilidade especial e para o caminho do desemprego milhares de professores.
Neste sentido, ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais aplicáveis, requeiro a V. Exa se digne solicitar ao Governo, através do Ministério da Educação e Ciência, as respostas às seguintes perguntas:
•Por que motivo persiste o Governo na ilegalidade e na marginalidade no que toca ao envio de ordens para as escolas, sem que esteja assegurada a sua cobertura e enquadramento legal?
•Como julga o Governo que pode um Director de Estabelecimento de Ensino realizar uma previsão da componente lectiva dos horários, quando não se encontra ainda distribuído o serviço lectivo e sequer existe uma perspectiva sobre o volume de matrículas, por escola, por ano e por via de ensino?
•O que leva o Governo a ameaçar os directores das escolas e agrupamentos com processos disciplinares em caso de incumprimento de uma ordem ilegal e impassível de cumprimento em condições de respeito pela ordem legal?
•Qual o objectivo do Governo ao exigir que as escolas determinem e identifiquem a componente lectiva dos seus horários antes de estarem criadas as condições legais para a distribuição do serviço lectivo?
•Em caso de necessidade, como será feita a ordenação dos docentes submetidos a “horários zero”, ou seja, aqueles a quem não será atribuída componente lectiva?
•Quando confrontado pelo PCP, em reunião de Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura, e em plenário da Assembleia da República durante o debate temático agendado pelo PCP para o passado dia 22, o Governo disse não ter condições para estimar o número de professores não colocados e de horários-zero em função das medidas tomadas pelo Ministério.
•Como entende o Governo que, não estando habilitado a fazer uma estimativa, estarão os dirigentes escolares habilitados a identificar com rigor tal cálculo no actual contexto?
•Como apurará o Governo o eventual erro na identificação de componente lectiva dos horários
e o que sucederá caso seja declarado por excesso? E por defeito?

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