Pergunta ao Governo N.º 73/XV/2

Ilegalidade e Imoralidade nos aumentos das Taxas de Segurança e de PMR promovidos pela ANA- Aeroportos de Portugal

O Tribunal de Contas, nos seus pareceres à Conta Geral do Estado, tem sucessivamente alertado que «... à revelia do princípio orçamental da unidade e da universalidade consagrado na Lei de Execução Orçamental e em desrespeito do disposto na Lei Geral Tributária, o valor dessas taxas é faturado, recebido e contabilizado como prestação de serviços por uma empresa privada desde 17/09/2013 (ANA), sem a intervenção de qualquer entidade pública como administradora dessa receita pública ou como responsável pela entrega do seu produto e pela respetiva contabilização na despesa pública. Com a omissão da receita, é lesado o direito dos tributados à garantia pública de o valor exigido ser o devido e com a subsequente omissão na despesa, é lesado o direito de os cidadãos serem informados da receita e despesa públicas relativas à concessão de serviço público aeroportuário.» (in. Parecer à CGE 2021)

Mais recentemente, são os sindicatos quem justamente se tem queixado da falta de transparência dessa cobrança, apontando para um facto inegável: a ANA está a transformar em lucro e dividendo direto aos seus acionistas algumas das taxas cobradas nos Aeroportos nacionais, nomeadamente na Taxas de Segurança e na Taxa de Passageiros de Mobilidade Reduzida (PMR). Taxas que existem para suportar os investimentos necessários e remunerar devidamente os trabalhadores ligados a estas duas atividades.

A Taxa de PMR está colocada pela ANAC no valor de 0,69€ por passageiro taxável, o que a ser aplicada aos 31,2 milhões de passageiros dos Aeroportos Nacionais no 1º semestre de 2023 deveria ter garantido uma receita superior a 10 milhões de euros. A ANA/Vinci tem depois essa função subcontratada à Portway (detida a 100% por si própria) impondo um regime laboral particularmente agravado a esses trabalhadores (baixos salários, repressão agravada) que chegou a tê-los afastados da contratação coletiva.

As Taxas de Segurança, colocadas pelo Governo nos 3,54 euros até 20 de junho de 2023 (a partir desta data, é parcialmente revertido o aumento de 77% imposto em 2022), no mesmo universo teriam gerado uma receita semestral superior a 50 milhões de euros no primeiro semestre de 2023.Ora é sabido que estas tarefas estão, no essencial, subcontratadas, e que esses subcontratos exigem cada vez menos trabalhadores para mais trabalho, com degradadas condições laborais.

Não é por acaso que a ANA foge a dar conta pública destas receitas desagregadas, e ainda mais em compará-las com as despesas efetivas em cada uma das funções. Isso acontece para esconder o abuso que estas taxas representam.

Em 2022, no Relatório e Contas da ANA, apenas se informa que a ANA realizou 102,1 milhões de euros em «Taxas de Segurança e PMR», sem desagregar esses valores. Sabendo que as despesas com os PMR são quase exclusivamente com a força de trabalho, é preciso comparar esses valores (cerca de 20 milhões em 2023 só para PMR, 102,1 milhões em 2022 para PMR e segurança) com o que a ANA pagou a todos os trabalhadores do Grupo (incluindo os que fazem as funções PMR, mais os cerca de 1000 trabalhadores da ANA mais os cerca de 1000 trabalhadores da Portway que não estão ligados a tarefas PMR), que foi 126,6 milhões de euros, para se ter uma ideia do brutal abuso.

Similarmente, sabendo-se que as funções de Segurança estão essencialmente subcontratadas e são realizadas por trabalhadores APA das prestadoras de serviço, é preciso comprar o valor do total de receitas das taxas de PMR/Segurança (102,1 milhões) com o gasto total em Fornecimentos e Serviços Externos do grupo (176,4 milhões, dos quais apenas 35 milhões aparecem catalogados como «Vigilância e Segurança») para se ter uma ideia do grau de sobretaxação e sobre-exploração.

Estes números deixam à vista, com perfeita clareza, que a ANA/Vinci retira lucros diretos das taxas recolhidas em nome da Segurança e dos PMR, o que não só é imoral como ilegal, e que o faz por sobre-exploração dos trabalhadores nestas funções e por abuso do poder de taxar os que para Portugal viajam apesar da péssima gestão dos nossos Aeroportos.

Não por acaso, de um volume total de negócio do Grupo ANA/Vinci de 903,1 milhões de euros, esta consegue um resultado líquido de 333,9 milhões: 37% de margem, algo perfeitamente extraordinário.

Ano após ano o Governo vai ignorando os alertas do Tribunal de Contas, aceitando decidir Taxas abusivas e ilegais e pactuando com a sobre-exploração dos trabalhadores que realizam as funções.

Assim, e ao abrigo da alínea d) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa, e nos termos e para os efeitos do artigo 229.º do Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do PCP solicita ao Governo os seguintes esclarecimentos:

1. O Governo vai continuar a ignorar os sucessivos alertas do Tribunal de Contas sobre uma prática onde «... com a omissão da receita, é lesado o direito dos tributados à garantia pública de o valor exigido ser o devido e com a subsequente omissão na despesa, é lesado o direito de os cidadãos serem informados da receita e despesa públicas relativas à concessão de serviço público aeroportuário»?

2. Em 2023 a ANA vai novamente bater o recorde de lucros nos Aeroportos Nacionais atingido em 2022. Em vez de remunerar devidamente quem trabalha no grupo (direta ou indiretamente) tem apostado no aumento da exploração e no aumento da repressão. O Governo vai continuar a ser cúmplice desta prática?

3. Que medidas vai adotar o Governo para impor à ANA que preste informação pública desagregada sobre as receitas e despesas relativas às Taxas de PMR e Segurança?