Intervenção de Jorge Machado na Assembleia de República

"Governo PSD/CDS ataca a Constituição e as obrigações que esta impõe ao Estado"

Aprova a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas
(proposta de lei n.º 184/XII/3.ª)

Sr.ª Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
Na ânsia de privatizar e transferir cada vez mais dinheiro do Orçamento do Estado para meia dúzia de grandes grupos económicos, o Governo PSD/CDS vai concretizando o seu projeto político de reconfiguração do Estado, atacando os trabalhadores e os serviços públicos, uma das principais conquistas do 25 de Abril de 1974.
Usando as portas que o PS abriu para concretizar o seu objetivo político, o Governo PSD/CDS ataca a Constituição e as obrigações que esta impõe ao Estado. A ideia é simples: um Estado mínimo para quem menos pode e tem e um Estado máximo para os mais ricos e poderosos.
Tendo por base um preconceito e objetivos ideológicos contra o setor público, tudo serve para denegrir e atacar os seus trabalhadores.
Primeiro, veio a ideia que os trabalhadores da Administração Pública eram uns privilegiados — estratégia do anterior Governo, do PS, para justificar um brutal ataque aos trabalhadores; agora, ao mesmo tempo que alteram para pior o Código do Trabalho, vem a ideia da dita convergência com os direitos dos trabalhadores do setor privado.
Assim, e ao mesmo tempo, vão atacando os direitos de todos os trabalhadores portugueses!
Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados:
A presente proposta de lei do Governo PSD/CDS não é uma mera compilação de normas. Este diploma encerra um novo ataque aos trabalhadores.
A proposta de lei estipula como regra o contrato de trabalho em funções públicas em detrimento do vínculo público de nomeação.
Importa lembrar que foi o PS que, com a Lei n.º 12-A/2008, lei do contrato de trabalho em funções públicas, consagrou esta separação e retirou o vínculo público de nomeação, fundamental para garantir a estabilidade e a independência a milhares de trabalhadores da Administração Pública.
Nesta questão central, PS, PSD e CDS adotam uma conceção de Estado tipicamente neoliberal, em que o Estado garante ao Exército, às forças de segurança, aos tribunais e pouco mais, o vínculo público de nomeação, sendo que em todas as restantes funções se estipula o contrato de trabalho em funções públicas, um vínculo mais precário, mais frágil e que visa facilitar o processo de privatização dos serviços públicos.
Neste diploma, o Governo consagra o aumento do horário de trabalho e vai mais longe na sua desregulação com as adaptabilidades e os bancos de horas.
Consagra a dita requalificação, a mobilidade especial do PS que, que conjuntamente com um programa de rescisões, visa criar as condições necessárias para forçar a saída de milhares de trabalhadores da Administração Pública.
Este diploma ataca o movimento sindical, diminuindo o número de delegados sindicais, e propõe medidas, não para melhorar a participação dos trabalhadores, mas para tentar fragilizar os sindicatos.
E as medidas que a Sr.ª Deputada do PSD diz que se mantêm só não são eliminadas porque a Constituição não lho permite. O Sr. Jorge Machado (PCP): — Este diploma ataca os salários dos trabalhadores da Administração Pública, reduzindo o valor pago por trabalho suplementar, reduzindo os dias de férias e dá cobertura aos cortes anunciados na tabela única e nos suplementos remuneratórios.
Por fim, entre muitas outras medidas, com este diploma agrava-se a precariedade, permitindo três e não duas renovações dos contratos a termo e não permitindo a sua conversão em contratos sem termo, como acontece no setor privado.
Resumindo, o Governo PSD/CDS aprofunda, com este diploma, o caminho de ataque aos direitos e salários dos trabalhadores da Administração Pública.
Para o PCP, este diploma não visa simplificar, modernizar, como hipocritamente foi aqui dito, ou melhorar a Administração Pública; este diploma é mais uma peça no ataque a importantes serviços públicos, como os da saúde e da educação, que querem há muito tempo privatizar, agravando assim as injustiças.
O objetivo é que o dinheiro que os trabalhadores pagam em impostos não seja gasto em serviços públicos de qualidade, fundamentais para as condições de vida das populações, mas, sim, entregue a privados, que vão cobrar cada vez mais ao Estado e às famílias para prestar serviços de pior qualidade para maximizar os seus lucros.
Assim, travar este caminho de ataque aos direitos dos trabalhadores é fundamental, não só para os trabalhadores da Administração Pública, mas para todos os portugueses, uma vez que só assim se garantem os serviços públicos de qualidade conquistados com Abril.
(…)
Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados,
Sr. Secretário de Estado:
Ficou por explicar uma coisa muito simples, a de saber como é que este diploma, atacando os salários, atacando direitos, fragilizando os vínculos, precarizando as relações laborais dentro da Administração Pública, fazendo a vida dos trabalhadores da Administração Pública dar mais um passo em direção ao inferno, melhora a Administração Pública, Sr. Secretário de Estado?
É uma profunda hipocrisia! Não melhora absolutamente nada, como é óbvio.
Mais: o que importa aqui assumir — e a frase final da sua intervenção assume isso mesmo — é que o que o Governo pretende é atacar os trabalhadores da Administração Pública, é despedir os trabalhadores da Administração Pública para entregar ao setor privado, para privatizar importantes funções que hoje são assumidas pelo Estado. Aliás, o Sr. Secretário assume isso mesmo: ajustar a Administração Pública em função daquilo que é a capacidade financeira.
Isto é a conceção profundamente ultraliberal: entregar ao setor privado áreas de negócios dizendo que o Estado não tem dinheiro para pagar esses serviços, mas depois vai pagar com língua de palmo, porque vai pagar mais caro, as famílias vão pagar mais por serviços piores, porque os grandes grupos económicos querem, como sempre, maximizar os seus lucros e não prestar serviço público.

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