Apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 90/2011, de 25 de Julho, que elimina os direitos especiais detidos pelo accionista Estado na EDP — Energias de Portugal, SA, na GALP Energia, SGPS, SA, e na Portugal Telecom, SGPS, SA
(apreciação parlamentar n.º 2/XII/1.ª)
(projecto de resolução n.º 47/XII/1.ª)
Quero apresentar três notas representativas da curta história de uma mentira sistemática: o deslizamento estatutário do comando estratégico de empresas estratégicas é uma das mentiras sistemáticas da política de privatizações. De empresas públicas, passaram a sociedades anónimas
de capitais públicos! Mas não havia problema, eram os comunistas sempre no contra… De sociedades anónimas de capitais públicos passaram a empresas SA com participação privada minoritária. Não havia problema, o Estado era maioritário, estava assegurado o comando! Estes comunistas sempre a verem o pior… De participação minoritária, os capitais privados passaram a maioritários, ou mesmo a 100%! Perda de comando público? Que ideia! Lá estavam as golden shares a garantir o comando estratégico!
A garantia dos tais centros de decisão nacional! A tinta que correu sobre o assunto, as declarações solenes, os fóruns e as conferências, a mentira e a fraude no completo despudor do frete ao capital! Sr. Ministro,
Srs. Deputados:
Só o Sr. Ministro das Finanças é que não enxerga, mas não é por defeito ou ingenuidade. Mesmo alguns dos que aceitam as privatizações consideram a dádiva das golden shares um bónus aos accionistas. A PT é assim vendida por 3300 €. O comendador Berardo, em 2007, já aqui foi referido, na PT, ofereceu 200 milhões de euros. O Governo oferece o valor estratégico que essas acções representam sem sequer o tentar vender. As acções, na privatização dessas empresas, tiveram um preço abaixo do seu valor exactamente por causa das golden shares. O Governo não faz nenhum esforço, sequer, para recuperar esse abatimento. Disse um dos novos administradores da CGD, nomeado por V. Ex.ª: «a golden share tem valor. Não o negociar significa transferir esse valor para os accionistas e o Estado está a prescindir desse direito».
O PCP está contra a sua eliminação, com ou sem transacção comercial, mas não deixamos de denunciar, como disse Octávio Teixeira, um inadmissível crime de muitos milhões contra os interesses financeiros do Estado.
Srs. Deputados,
Sr. Ministro:
Os outros estados da Europa são estúpidos. Nós, PS, PSD e CDS, é que somos inteligentes. O representante do FMI e patrão da tróica, o dinamarquês Paul Thompson, é um bom benemérito, um bom conselheiro, só que não toma para a sua terra os bons conselhos que nos vem dar. Mas, já se sabe: os nórdicos, e outros, são outra gente; estes, do sul, uns atrasados – PIGS (Portugal, Italy, Greece, Spain) – que, veja-se lá, até têm golden shares nas empresas de energia, telecomunicações, etc.
Na Dinamarca, não! Têm a DONG Energy, a maior empresa do sector energético do país, com presença no petróleo, gás e electricidade, com uma quota de mercado superior à da GALP e EDP, com 77% de capital do Estado dinamarquês!
Na Alemanha, diz a Sr.ª Merkel que têm de manter a Volkswagen com comando alemão. Dizem: «Já avisámos a Comissão Europeia que não nos ‘chateiem’, há muitos anos». E há muitos anos que este processo se arrasta, sem se resolver. Na Europa, na França, no Reino Unido, na Finlândia, na Bélgica, podem e devem poder manter direitos especiais em empresas de energia, defesa, telecomunicações, automóvel e, calcule-se, até no açúcar, como na Irlanda. E dizem-nos: «Vocês, temos pena, mas têm que privatizar e largar de ‘borla’ as ditas golden shares. São pobres, não podem ter luxos de ricos». A DONG Energy, a EDF, a Total, a RWE e outras matilhas esfaimadas estão à espera!
O Governo PSD/CDS não quer que haja dúvidas. Quer mesmo, de forma decidida e convicta, é um desejo profundo, o capital estrangeiro nestas empresas estratégicas.
Este Governo não só lhes quer vender o que resta da presença do Estado português como lhes escancara a porta, oferecendo as golden shares de desconto. Isto enquanto não somos obrigados a vender a pedido e com comprador predeterminado, como sucedeu na Grécia, em que a OTE – a PT lá do sítio – foi obrigada a vender à Deutsche Telekom, que ficou com 40% do capital, e o Estado grego 10%. Não é por acaso que há quem pense que o melhor é os processos de privatização serem conduzidos por Bruxelas. Eles lá sabem o que é melhor para os protectorados. Srs. Deputados, Sr. Ministro, …
Vou já terminar, Sr. Presidente. Isto tem um nome: traição aos interesses nacionais. É um atentado à soberania nacional entregar o comando estratégico de empresas estratégicas a estrangeiros, empresas com evidentes dimensões de segurança pública e segurança nacional. Com o fim das golden shares, a PT passa, por exemplo, a ser uma das poucas operadoras europeias sem o controlo do Estado. Mas como se trata de direitos inalienáveis, soberanos e constitucionais, queremos afirmar firme e claramente que estes negócios são actos nulos e a todo o tempo anuláveis. Nunca, nunca poderão ser considerados legítimos.