Intervenção de Rita Rato na Assembleia de República

"Este governo é uma máquina de fazer pobres"

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Declaração política de critica ao Ministro da Solidariedade e da Segurança Social pela apresentação de uma proposta de baixa do subsídio de desemprego e de outras prestações sociais
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Este Governo não tem política de combate ao desemprego. Este Governo tem uma política de combate ao subsídio de desemprego.
Importa dizer, à cabeça deste debate, que o subsídio de desemprego não é uma esmola que este ou qualquer governo garantam aos trabalhadores, o subsídio de desemprego é um direito que decorre dos descontos dos seus salários para a segurança social no período em que trabalham.
O Governo PSD/CDS andou, nos últimos dias, a brincar com a vida dos desempregados, com a angústia e o desespero com que mais de 1 300 000 desempregados estão confrontados e veio anunciar mais uma brutalidade, que é a redução do subsídio de desemprego e de outras prestações sociais. Lança esta notícia para, depois, vir dizer que talvez vá recuar e só aplicará o corte previsto no Orçamento do Estado.
Ó Srs. Deputados, isto é gozar com a vida dos desempregados e com o desespero em que vivem todos os dias, num momento em que crescem as situações de fome, de carência alimentar, de cortes de água, de luz e de gás na casa de muitas famílias, da perda de casa, de muitas famílias que não têm dinheiro para pagar a creche, para pagar o infantário, para pagar o ATL, para pagar o lar do idoso; num momento em que milhares de trabalhadores e reformados, que vivem do seu salário ou da sua pensão, esgotam o seu rendimento no pagamento da habitação, da água, da eletricidade e que pouco lhes resta para a alimentação; num momento
em que muitos casais jovens regressam a casa dos pais e milhares de famílias não têm mais onde cortar e questões básicas passam a ser um luxo, como, por exemplo, poder comprar peixe ou iogurte para os seus filhos, ou poder ir ao médico, se fosse caso disso.
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Neste preciso momento, o Governo PSD/CDS tem o descaramento brutal de anunciar mais um corte no subsídio de desemprego e anuncia-o aos sete ventos.
É por tudo isto que afirmamos que o Governo PSD/CDS é uma máquina de fazer pobres. Este Governo é uma máquina de fazer pobres porque todos os dias, com a sua política, atira para a pobreza milhares e milhares de pessoas: jovens, menos jovens, idosos e crianças.
É por isso que dizemos que este Governo espezinha todos os dias a dignidade da vida destas pessoas.
Aprofunda o caminho desumano do agravamento brutal da pobreza e da exclusão social num momento em que o desemprego atinge níveis históricos, milhares de trabalhadores têm salários em atraso, o salário mínimo nacional está abaixo do limiar da pobreza e o indexante dos apoios sociais está francamente abaixo deste valor.
O Governo PSD/CDS vem apresentar a proposta de um novo corte nas prestações sociais: 6% no subsídio de desemprego, 6% no rendimento social de inserção, 2,6% no complemento solidário para idosos.
Então, mas este Governo nem há quatro meses anunciou um novo corte e tem o descaramento de vir pedir mais sacrifícios aos desempregados e àqueles que vivem abaixo do limiar da pobreza?!
Convém lembrar, Sr. Presidente, Srs. Deputados, que esta monstruosidade significa que cerca de 150 000 desempregados, que recebem abaixo do valor mínimo, vão passar a ter rendimentos abaixo do limiar da pobreza.
Esta proposta é terrorismo social. Esta proposta tem como único objetivo reduzir, com efeitos imediatos, o valor de um conjunto de prestações sociais, quer do sistema previdencial, quer do sistema solidário.
E não podia faltar, claro está, vindo de quem vem, a perseguição aos beneficiários do rendimento social de inserção, com uma nova descida do valor desta prestação, que passaria a fixar-se nos 178 €, contra os 189 € que estavam estabelecidos em agosto.
Aos idosos, prevê-se o corte do complemento por dependência de 1.º grau e do complemento por cônjuge a cargo, a pensionistas com pensões de valor superior a 600 €, e mais uma redução do complemento solidário para idosos.
Srs. Deputados, nem o subsídio de morte escapa a este Governo, que anuncia também um corte no subsídio por morte e a redução para metade do reembolso por despesas de funeral.
Sr. Presidente, Sr. Deputados: O País está confrontado com um ataque sem precedentes às funções sociais do Estado, conforme estão consagradas na Constituição, e cujo objetivo último é a sua completa destruição. Aliás, ontem mesmo, o Ministro das Finanças, aqui, na Assembleia da República, afirmou que é preciso repensar as funções sociais do Estado. Quer dizer o Sr. Ministro que o que precisamos é de um Estado mínimo na economia e na proteção social e de um Estado que cobra impostos para entregar à banca e ao capital!
O que entendemos é que este Governo bem pode apregoar aos sete ventos que vai sempre beneficiar os mais fracos e desfavorecidos, quando, na verdade, o que faz todos os dias é criar mais pobres e desfavorecidos, numa espiral de agravamento da pobreza sem comparação desde o 25 de Abril.
Em vez de reduzir a má despesa do Estado, reduzindo os privilégios dos mais ricos e do grande capital, este Governo prefere continuar a reduzir a despesa social, retirando direitos sociais e aumentando a pobreza e a exclusão social.
«Quantos pobres são precisos para fazer um rico?». Repito, Srs. Deputados da maioria: «Quantos pobres são precisos para fazer um rico?» — perguntava Almeida Garrett e que pergunta tão atual!
Para este Governo são precisos milhares, milhares de pobres para fazer um rico, e está bem à vista, no nosso País, que é assim que este Governo está a fazer.
É por isso que apelamos daqui a todos para que continuem a lutar pela derrota definitiva desta proposta, pela derrota deste Orçamento, pela derrota deste Governo e desta política, que só assim será possível conquistar um País mais justo e salvar o País, para garantir a dignidade na vida dos portugueses.
(…)
Sr. Presidente,
Sr.ª Deputada Mariana Aiveca,
Agradeço a questão que colocou.
De facto, trata-se das funções sociais do Estado.
Ontem, o Sr. Ministro das Finanças afirmou, com muita clareza, que é preciso repensar o Estado social e as suas funções. Para nós, isto é muito claro: este senhor não quer dizer outra coisa a não ser que este Governo, seguindo o caminho que tem sido seguido pelos sucessivos governos, pretende um ajuste de contas com o 25 de Abril e aquilo que ele representou de justiça e de progresso social.
Este Governo pretende, exatamente, transformar direitos sociais em caridade, pretende o agravamento das condições de vida de milhares e milhares de portugueses e destruir as funções sociais do Estado.
E, quando dizemos funções sociais do Estado, não estamos a dizer os privilégios, por exemplo, que este Governo já deu ao BPN e à banca. Estamos a falar da garantia da escola pública de qualidade, do Serviço Nacional de Saúde, do funcionamento de tribunais, dos serviços de segurança social e de um conjunto de direitos sociais que foram conquistados com a Revolução de Abril e que sucessivos governos pretenderam destruir, e em especial este Governo, com o impulso do pacto de agressão da troica.
Naturalmente que entendemos que seria necessário romper com esta política, seria necessário, designadamente, o Governo retirar esta medida e afirmá-lo em absoluto. Aguardamos ainda uma afirmação, que pode ser que aconteça, uma pergunta do CDS, para nos esclarecer relativamente a isto, porque ainda não estamos descansados perante aquilo que o Governo anunciou, porque no Orçamento do Estado mantém-se um corte de 6% no subsídio de desemprego.
Portanto, é claro que partilhamos a preocupação que aqui coloca, quando diz que é preciso dar resposta a isto.
Ainda hoje, já esta sessão tinha tido início, tive a oportunidade de receber um e-mail, certamente como os Srs. Deputados, pois foi enviado para todos os grupos parlamentares, com o seguinte assunto: fome e miséria.
Perguntava-me este senhor como é possível, perante este corte nas prestações sociais, os Srs. Deputados dormirem descansados e não fazerem nada. É o que vos pergunto, Srs. Deputados: como é que perante o agravamento da pobreza, todos os dias, fruto de aplicação desta política de que são responsáveis, os Srs. Deputados conseguem dormir descansados?
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Deputado Adão Silva,
Agradeço a questão que coloca, que objetivamente foi nenhuma, mas à qual terei todo o prazer em responder.
Ó Sr. Deputado, desgraça?! Tirar o País da desgraça? Desgraçada é a vida que os portugueses levam neste momento, desgraçada é a vida de muita gente que está numa situação de desemprego, a esmagadora maioria da qual já não tem nada, não tem 1 cêntimo, não tem qualquer tipo de apoio, nem de proteção social!
Por isso, quando o Sr. Deputado diz aqui que o Governo está a salvar o País da desgraça, convém recordar que é verdade que PS, PSD e CDS têm responsabilidades na subscrição do Memorando de Entendimento e que, muito justamente, à cabeça, o PCP disse que não era nenhum memorando de entendimento, mas um pacto de agressão ao povo e ao País, pois só está a contribuir para o agravamento da pobreza e das condições de vida.
O Sr. Deputado disse que, no Orçamento do Estado, estão previstos 1800 milhões de euros para a segurança social. Ó Sr. Deputado, quatro vezes mais do que isso já foi enterrado no BPN!
O Sr. Deputado pode dar as cambalhotas que quiser, pode dar as piruetas que quiser, pode até ficar ofendido por dizermos que isto é um roubo. Mas o que é roubar nos rendimentos e
entregar à banca? Quer que digamos que isto é doação?! As pessoas descontam uma quantia dos seus salários, este Governo rouba essa parte e não quer que digamos que é um roubo?
Então, isto é o quê, Sr. Deputado? É uma doação?! É uma oferta?! É uma prenda de Natal?! É, sim, um roubo descarado, que este Governo está a fazer aos pensionistas, aos funcionários públicos e aos reformados.
Sr. Deputado, mesmo para terminar, gostaria de dizer-lhe uma coisa muito séria. O Sr. Deputado, há um ano, quando estava na oposição, falava muito na necessidade de rever os critérios de atribuição.
É caso para dizer: quem o viu e quem o vê! Quem o ouviu e quem o ouve!
É que o descrédito que as pessoas têm neste Governo tem a ver com a falta de palavra: quando estão na oposição, prometem mais apoio, quando chegam ao Governo, é a primeira coisa que cortam.
São 350 milhões de euros! E não estamos a falar de isenções fiscais para o offshore da Madeira. É que o Orçamento do Estado para 2012 previa quatro vezes este montante para o
offshore da Madeira! Como é que vêm aqui «chorar» 350 milhões de euros em prestações sociais que permitem ficar no limiar próximo da pobreza e para o offshore da Madeira são 1200 milhões de euros? Não há dinheiro?! Não há outra coisa! Este Governo e esta maioria é que o «enfiam» na banca, em vez de garantirem dignidade à vida dos portugueses, Sr. Deputado.

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