Projecto de Lei N.º 310/XII-2ª

Estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado

Estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado

Revoga a Lei n.º 49/2012 de 29 de agosto que procede à adaptação à administração local da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro, alterada pelas Leis n.ºs 51/2005, de 30 de agosto, 64 -A/2008, de 31 de dezembro, 3 -B/2010, de 28 de abril e 64/2011, de 22 de dezembro, que aprova o estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado

Preâmbulo

Na sequência das medidas enunciadas no documento verde, o Governo avançou com a proposta de alteração ao estatuto do pessoal dirigente das câmaras municipais e dos serviços municipalizados, aprovada por PSD, PS e CDS-PP, dando origem à Lei nº49/2012, de 29 de agosto.
A lei estabelece que os municípios têm de aprovar a adequação das suas estruturas orgânicas aos critérios, por esta previstos, até 31 de Dezembro de 2012.
Como tivemos oportunidade de denunciar no período de discussão na generalidade e na especialidade, esta lei tem um único objetivo – reduzir o número de dirigentes na administração local, através da aplicação de critérios exclusivamente quantitativos, desajustados da realidade concreta de cada município e das necessidades das respetivas populações, para satisfazer o compromisso assumido com a troica.
O único critério adotado para a determinação do número de dirigentes por município está diretamente relacionado com a população, escamoteando aspetos como o número de trabalhadores por serviço ou a dimensão territorial. O Governo decidiu ainda introduzir mais uma variável associada às dormidas turísticas, como se os seus impactos fossem tão exigentes como os da população residente.
Aplicando os critérios desta lei, a esmagadora maioria dos municípios disporá apenas de 4 ou menos chefes de divisão (cerca de 2/3 dos municípios) e cerca de metade dos municípios terão somente 1 ou 2 chefes de divisão, para acompanhar áreas tão específicas e distintas como a área financeira, recursos humanos, abastecimento de água e tratamento de efluentes, acessibilidades, espaços verdes, manutenção urbana, urbanismo, educação, desporto ou cultura. É evidente a impossibilidade de um dirigente conseguir dirigir com qualidade e eficácia tantos serviços ao mesmo tempo e com características tão diversificadas. Está bem patente que um dos objetivos é degradar a qualidade técnica da direção dos serviços, da organização e planeamento do trabalho.
Embora surja de uma forma encoberta, a par da redução cega do número de dirigentes na administração local, pretende-se que as câmaras municipais procedam a uma nova reorganização da sua estrutura orgânica, adaptando os serviços municipais ao número de dirigentes. O resultado final será a redução de serviços municipais, o que tem implicações diretas na prestação de serviços públicos às populações. Os municípios mais penalizados são exatamente aqueles que têm privilegiado a gestão direta dos serviços municipais e que exercem diretamente as suas competências, não tendo optado pela externalização.
Por esta via, para além de incapacitar a intervenção dos municípios e degradar a prestação dos serviços públicos, o Governo pretende criar as condições para justificar o caminho da privatização de um conjunto de serviços prestados pelas autarquias, apetecíveis aos grandes grupos económicos e que a esmagadora maioria se encontram na esfera pública.
No período de discussão de lei, o Governo invocou argumentos de possíveis poupanças com a redução dos cargos de dirigentes locais, para manipular e induzir em erro as populações, esquecendo-se (ou fazendo esquecer-se) que a generalidade dos dirigentes são funcionários públicos, pelo que, caso se extinga o cargo de dirigente, estes trabalhadores da carreira de técnico superior, regressam ao seu posto de trabalho, auferindo a remuneração referente à sua categoria. Fica assim demonstrado que o argumento da poupança não colhe nesta análise, pois mesmo que exista poupança, esta será residual.
Esta lei, imposta pelo Governo e com o apoio do PSD, CDS-PP e PS, contra a opinião da Associação Nacional dos Municípios Portugueses, dos autarcas e dos trabalhadores da administração local, constitui uma afronta à autonomia do Poder Local Democrático, consagrada na Constituição da República Portuguesa. Mais uma vez o Governo trata as autarquias como um serviço sob tutela direta da administração central, ingerindo diretamente em matérias que se enquadram na autonomia do Poder Local Democrático.
No quadro da autonomia do Poder Local Democrático, cabe aos órgãos de governo próprio do município criar a estrutura orgânica mais conveniente à realidade do respetivo município, considerando as suas especificidades, para intervir e responder adequadamente às necessidades das populações.
A concretizar-se a aplicação desta lei no terreno, ela desfere um duro golpe no Poder Local Democrático, reflete uma conceção de democracia, claramente, amputada e não permite a adoção de soluções singulares para cada realidade concreta. Significa um forte retrocesso na diferenciação técnica da direção do trabalho, com consequências negativas na prestação de serviços públicos.
Em cumprimento dos princípios constitucionais, o Grupo Parlamentar do PCP propõe a revogação da Lei nº49/2012, de 29 de agosto, repristinando o anterior quadro legislativo quanto ao estatuto do pessoal dirigente da administração local, assegurando assim a operacionalidade e a capacidade dos serviços municipais responderem às expectativas das respetivas populações.

Nos termos legais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1º
Objeto e âmbito
A presente lei revoga a Lei n.º 49/2012 de 29 de agosto que procede à adaptação à administração local da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro, alterada pelas Leis n.ºs 51/2005, de 30 de agosto, 64 -A/2008, de 31 de dezembro, 3 -B/2010, de 28 de abril e 64/2011, de 22 de dezembro, que aprova o estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado, repristinando as normas por esta revogadas.

Artigo 2º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte após a sua publicação.

Assembleia da República, em 24 de outubro de 2012

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