Intervenção de

Estado da democracia - Intervenção de Jorge Machado na AR

Interpelação do Governo sobre  política geral centrada no estado da democracia e nas condições do exercício de direitos e liberdades fundamentais

 

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados,

Sr. Ministro da Administração Interna,

São muitos os casos de violação concreta dos direitos fundamentais no mundo do trabalho. São os casos de violação do direito à greve, de violação do direito à liberdade sindical, são, entre outros casos, os processos-crime contra quem legitimamente se manifesta.

O tempo não me permite elencar todos os casos de violação dos direitos, liberdades e garantias que conhecemos e deixarei para uma intervenção a abordagem destes casos. Queremos concentrar esta pergunta num dos aspectos mais gravosos desta ofensiva contra os direitos, liberdades e garantias, que diz respeito à utilização das forças de segurança nos momentos mais tensos da luta de classes.

Referirei apenas quatro dos muitos exemplos que podíamos dar, mas são bem ilustrativos da intervenção das forças de segurança.

Durante a greve geral de 30 de Maio - e há dezenas de situações como esta -, na Grundig, unidade de Braga, a pedido da administração, a PSP impediu ilegalmente o funcionamento dos piquetes de greve. Nos CTT, em Guimarães, em 28 de Agosto de 2007, a pedido da administração, a PSP entrou nas instalações e tentou impedir um plenário do sindicato, legalmente convocado pelo sindicato, e identificou o dirigente sindical.

Em Outubro de 2007, no Freeport de Alcochete, a GNR colocou-se ao lado do patrão e tentou impedir a distribuição do CESP Notícias, um jornal do Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal.

E mais recentemente, em Novembro de 2007, na Valorsul, a mando da administração, a PSP ocupou a empresa e tentou intimidar os trabalhadores.

São muitas as situações em que é a polícia, a mando e com instruções concretas dos patrões, que diz como é que funcionam os piquetes de greve, que impede o acesso às instalações das empresas e que tenta intimidar os trabalhadores.

Há uma dualidade de critérios óbvia e que demonstra, também aqui, a opção de classe deste Governo: mal as empresas chamam as forças de segurança estas vêm depressa e em força mas, quando são chamadas pelos trabalhadores, a maior parte das vezes, pura e simplesmente, não aparecem.

A leitura é uma e só uma, Sr. Ministro: o Governo pôs as forças de segurança ao lado dos patrões e não ao lado da lei.

Diga, Sr. Ministro, por que razão é que as forças de segurança tomam o partido de uma das partes na luta de classes! Sr. Ministro, as forças de seguranças servem a lei ou servem os patrões?!

(...)

Sr. Presidente,
Srs. Ministros,
Sr.as e Srs. Deputados:

É no mundo do trabalho que se têm desferido os mais rudes golpes contra os direitos, liberdades e garantias.

O Governo, pela sua acção, directa ou indirecta, tem vindo a atacar a democracia dentro das empresas, ataca o direito à greve, ataca os sindicatos, ataca o direito ao acesso à justiça laboral, tenta intimidar os trabalhadores, interfere nas alturas em que a luta de classes está mais tensa, sempre ao lado dos patrões, e tem vindo a desenvolver uma acção persecutória contra os dirigentes sindicais.

Os factos demonstram esta realidade. Quanto ao ataque à democracia dentro das empresas e à liberdade sindical, são vários os exemplos em que a acção dos sindicatos dentro das empresas é condicionada ou mesmo impedida.

É o caso do CESP, que enfrentou a administração do Freeport de Alcochete e a GNR, que tentaram impedir a distribuição de um jornal do sindicato; são plenários que são impedidos dentro das empresas e dirigentes sindicais identificados pela polícia.

A título de exemplo, além do já referido caso dos CTT, em Guimarães, o mesmo aconteceu na Escola Prática de Engenharia de Tancos, tutelada pelo Ministério da Defesa, onde foi impedida a realização de um plenário dos trabalhadores; é o caso do Sindicato dos Metalúrgicos, em Beja, onde, além de ter sido impedido plenário, o dirigente sindical foi identificado; é também o caso da Comissão de Trabalhadores da Renault, em Cacia, onde foi impedida a realização do plenário, entre muitos outros.

No ataque ao direito à greve, o Governo, dentro dos seus próprios serviços ou de mãos dadas com o patronato, tem vindo a estipular serviços mínimos que, na prática, são serviços máximos e, assim, limitam ou inutilizam o direito à greve. São os casos da Metro, da Transtejo, da Valorsul, nos transportes rodoviários, entre muitos outros exemplos.

É o Governo que cria uma base de dados da Administração Pública que visa dissuadir os trabalhadores de exercerem o deu direito à greve. É a intimidação aos sindicatos quando preparam greves, com várias «visitas» aos sindicatos e às uniões de sindicatos. São a PSP ou a GNR a deslocarem-se às câmaras municipais e juntas de freguesia para intimidar os piquetes de greve ou mesmo situações em que as forças de segurança impedem o funcionamento destes piquetes, tal como aconteceu na Valorsul, na Grundig, na Agere, na Moveaveiro, sempre a pedido do patrão e seguindo as suas instruções. É o ataque ao acesso à justiça no mundo do trabalho, com custas que impedem os trabalhadores de recorrerem à justiça, impedindo os trabalhadores de impugnarem um despedimento ou mesmo de exercerem direitos com os quais, muitas das vezes, sobrevivem.

É o enfraquecimento das actividades inspectivas, nomeadamente da Inspecção-Geral do Trabalho, que conta com poucos recursos humanos e financeiros. É a diminuição do número de juízes nos tribunais do trabalho que atiram os julgamentos para «as calendas gregas», ao contrário do que o Sr. Ministro aqui afirmou, medidas que beneficiam largamente o patronato. É a tentativa de intimidação e a deriva persecutória contra os sindicatos. O Governo fomenta um clima de suspeita à volta dos sindicatos e da sua actividade. É a forte e desproporcional presença das forças de segurança, com claros objectivos intimidatórios, uma vez que não são conhecidos quaisquer casos de distúrbios da ordem pública aquando das manifestações ou das greves.

Só no distrito de Lisboa e desde 2002, foram instaurados cerca de 50 processos-crime contra dirigentes sindicais!

Se tivermos em conta que o movimento sindical português é verdadeiramente exemplar no que diz respeito à organização de manifestações e de greves, se tivermos em conta que não há memória de distúrbios ou quaisquer problemas para a ordem pública, percebemos que estes processos-crime são um instrumento de intimidação que este Governo tem utilizado com abundância.

Agravando o desequilíbrio das relações laborais, o Governo interfere na luta de classes, sempre ao lado do patrão. De facto, as forças de segurança estão a ser instrumentalizadas pelo Governo, na luta de classes.

Quando chamadas pelos patrões, as forças de segurança aparecem depressa e em força, cumprindo as ordens do patrão, mesmo que sejam ilegais, como seja impedir o funcionamento dos piquetes de greve. Mas, quando chamadas pelos trabalhadores, ou não aparecem ou não intervêm, como, por exemplo, nas situações de substituição ilegal de trabalhadores em greve. Queremos deixar bem claro que a culpa não é dos agentes das forças de segurança! A culpa é de quem dá ordens, de quem dá as orientações para que tal aconteça, ou seja, a culpa é do Governo e só do Governo!!

As forças de segurança existem para cumprir e fazer cumprir a lei e não são nem podem ser um instrumento de opressão dos trabalhadores.

Sr. Presidente,
Srs. Ministros,
Sr.as e Srs. Deputados:

Todas estas situações não são casos isolados, de excessos ou factos que o Governo não controla.

Não! Trata-se, sim, de um conjunto de medidas e de ataques a direitos fundamentais que visam enfraquecer os sindicatos para, assim, mais facilmente atacar os direitos dos trabalhadores.

Este Executivo tomou descaradamente o partido dos patrões, criando as condições e sendo ele próprio um interveniente na ofensiva contra os trabalhadores.

O PCP, ao contrário do Governo, considera os sindicatos e a liberdade sindical como uma peça essencial para o desenvolvimento do nosso país e consideramos que não pode haver, verdadeiramente, uma democracia sem que os direitos dos sindicatos e dos trabalhadores sejam respeitados.

 

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