Intervenção de Paulo Sá na Assembleia de República

Estabelece o regime jurídico a que fica sujeita a atividade de mediação imobiliária,...

... conformando-o com a disciplina constante do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, que transpôs para a ordem jurídica interna a Diretiva 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno
(proposta de lei n.º 89/XII/1.ª)
Sr. Presidente,
Sr. Secretário de Estado,
Srs. Deputados:
Com esta iniciativa legislativa, pretende o Governo conformar a atividade de mediação imobiliária à famigerada Diretiva Bolkestein.
É conhecida a posição do PCP sobre esta Diretiva — peça central da Estratégia de Lisboa —, que visa proceder à liberalização da generalidade dos serviços. Esta é uma Diretiva muito apreciada pelos grandes grupos económicos e financeiros da área dos serviços, pois ajusta-se particularmente bem aos seus interesses, garantindo-lhes um mercado livre, sem quaisquer constrangimentos, num quadro de desregulamentação e de nivelamento por baixo das relações de trabalho. Mas é uma Diretiva que não serve os interesses dos trabalhadores, que veem os seus salários e direitos laborais postos em causa, nem serve os interesses dos consumidores, em geral, e dos micro, pequenos e médios empresários.
A Diretiva Bolkestein, ao estabelecer a liberdade de estabelecimento dos prestadores de serviços e a livre circulação dos serviços, abre as portas ao dumping social, incentiva e facilita a concorrência entre trabalhadores e garante o negócio fácil aos grandes grupos económicos. Subverte também a soberania nacional, ao retirar a possibilidade de definição de normas de financiamento e defesa dos serviços em geral e ao reforçar o poder de entidades supranacionais, como a Comissão Europeia.
No caso em apreço — a aplicação da Diretiva Bolkestein à mediação imobiliária —, são introduzidas alterações ao regime legal que regula o exercício desta atividade, com o objetivo, afirma o Governo, de simplificar procedimentos administrativos.
Obviamente que não somos contra a simplificação, mas algumas alterações suscitam-nos dúvidas, em particular a questão da formação, já aqui referida.
No atual regime, a revalidação da licença requer a realização de um determinado número de horas de formação, com a simplificação introduzida pelo Governo, a licença passa a ter duração ilimitada, pelo que não há lugar a revalidação. Desta forma, cai também a exigência de formação. Entende o Governo que a formação neste setor é desnecessária? Ou foi mero esquecimento de quem está com tanta pressa em conformar a atividade de mediação imobiliária à Diretiva Bolkestein?
Outra questão que nos suscita dúvidas é a eliminação de alguns dos requisitos de licenciamento. Ou ainda a eliminação da necessidade de inscrição no Instituto da Construção e do Imobiliário para o exercício da atividade de angariação imobiliária.
Mas, nesta proposta do Governo, a questão central é a possibilidade de empresas de mediação imobiliária de outros Estados do espaço económico europeu, não estabelecidas em Portugal, poderem prestar serviços em território nacional. Tal como o PCP tem denunciado, relativamente a outros setores de atividade, tal possibilidade facilita o nivelamento por baixo das relações de trabalho e o dumping social. O PCP opõe-se à Diretiva Bolkestein e à sua transposição para a legislação nacional, para todos os serviços, em geral, e para os serviços de mediação imobiliária, em particular.
Para terminar, não podemos deixar de realçar o facto de este Governo, que tanta pressa tem em aplicar a Diretiva Bolkestein à atividade de mediação imobiliária, ser o mesmo Governo que persiste em ignorar os gravíssimos problemas no setor da construção civil, que atingem também o setor da mediação imobiliária, e que se recusa a implementar um programa de emergência para o setor da construção civil, como aquele proposto pelo PCP, no passado mês de maio.

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