Intervenção de António Filipe na Assembleia de República

Estabelece o regime jurídico da constituição e funcionamento das sociedades de profissionais que estejam sujeitas a associações públicas profissionais

(proposta de lei n.º 266/XII/4.ª)

Sr.ª Presidente,
Srs. Secretários de Estado,
Srs. Deputados:
O problema principal desta proposta de lei nem tem a ver essencialmente com o seu conteúdo, que é de direito societário, pelo que prevê a criação na ordem jurídica portuguesa de um tipo de sociedade civil que pode adotar a forma de sociedade comercial, composta por profissionais cujo exercício de atividade seja regulado no âmbito de uma associação profissional de natureza pública, vulgo as ordens profissionais.
Só que esta proposta de lei que o Governo aqui traz parte de um pressuposto errado. É que era suposto que já tivessem sido aprovados por esta Assembleia os estatutos das associações públicas profissionais que se colocassem de acordo como disposto na Lei n.º 2/2013.
É que a Lei n.º 2/2013 está em vigor há dois anos e o artigo 53.º, a que aludia, há pouco, o Sr. Deputado Artur Rêgo, tem mais do que aquilo que o Sr. Deputado referiu. É que o Governo tinha um prazo de 90 dias para apresentar à Assembleia da República as propostas de lei de adaptação de cada um dos estatutos das ordens profissionais respetivas.
Então, o Governo já deixou passar há quase dois anos o prazo que se estabeleceu imperativamente na Lei n.º 2/2013, que foi proposta por este Governo e aprovada por esta maioria. Portanto, o Governo deixou passar várias vezes os 90 dias a que estava obrigado e, depois, como se nada fosse, vem à Assembleia da República apresentar uma proposta de lei para aprovar uma lei que só faria sentido se os estatutos das associações públicas profissionais já estivessem aprovados e de acordo com a Lei n.º 2/2013.
Ou seja, o Governo não cumpriu aquilo a que estava obrigado por uma lei que o próprio Governo propôs e que a maioria parlamentar que o suporta aprovou e, agora, faz de conta que não se passou nada, faz de conta que foi tudo aprovado e que as ordens têm os estatutos perfeitamente adaptados à Lei n.º 2/2013. Ora, não é assim.
Mas a trapalhada não fica por aqui. É que o Governo, nas disposições transitórias desta proposta de lei, vem dizer que as sociedades de profissionais que já existam, para se adaptarem a esta lei que há de ser aprovada, têm um prazo de seis meses após a aprovação dos novos estatutos das respetivas associações públicas.
Então, perguntamos: e as que venham a constituir-se no futuro? Essas já não têm de respeitar os estatutos das respetivas associações públicas? São constituídas como sociedades profissionais à revelia ou independentemente daquele que seja o estatuto da respetiva associação pública?
Ou seja, ficamos com sociedades profissionais já constituídas que, se esta lei for aprovada tal como aqui está, são relegadas, não podem adotar este modelo societário aqui previsto, porque os estatutos das ordens em que os respetivos profissionais estão inscritos não foram adaptados. Mas as que forem constituídas posteriormente já não têm nada a ver com isso e tudo se passa como se esse estatuto não existisse, aplicando-se-lhes o novo regime das sociedades de profissionais.
Como dizia aquele velho ditado popular, «há sócios que são sócios e estão sentados e há sócios que são sócios e estão de pé», isto é, há regimes diferentes para sociedades que deveriam ter obviamente a mesma natureza jurídica.
E isto tudo porquê? Porque o Governo se meteu numa trapalhada, ou seja, fez aprovar um regime das associações públicas profissionais, depois, mostrou uma total incapacidade para cumprir aquilo que aprovou, não procedeu à alteração dos estatutos das associações profissionais e agora vem aqui apresentar uma proposta de lei como se nada fosse e que, se for aprovada tal como está, vem somar trapalhada à trapalhada já existente.
Portanto, era bom que os senhores se entendessem, que o Ministério da Economia se entendesse com o Ministério da Justiça e coordenassem alguma coisa para não fazerem, perante a Assembleia da República e perante o País, uma figura como esta que estão aqui hoje a fazer.

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