Intervenção de Honório Novo na Assembleia de República

Estabelece o processo de orçamentação de base zero e cria o registo nacional dos serviços do Estado de todo o sector público administrativo

(projecto de lei n.º 513/XI/2.ª)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Repetimos hoje o debate que já tivemos em Outubro passado sobre a introdução da orçamentação de base zero na elaboração dos Orçamentos do Estado.
Pela mão do PSD propõe-se agora uma alteração directa da Lei de Enquadramento Orçamental para introduzir esta nova metodologia. Mas, à cautela (à cautela, digo eu!), o PSD propõe, mas ao mesmo tempo adia, desde já. Senão, vejamos: em primeiro lugar propõe um método de base zero mas já vai adiantando que só deve ser feito em certas circunstâncias e nos serviços que o Ministério das Finanças, no seu entender exclusivo, vier a indicar. Srs. Deputados, eu acrescento: se o Ministro das Finanças algum dia indicar…!
Em segundo lugar, o PSD propõe a introdução de um método de base zero, mas depois acha que seria desejável que os serviços da administração o adoptassem num prazo de 10 anos. Tudo somado, bem parece que o PSD apresenta este projecto mais para «marcar terreno», mas sem grande vontade de algum dia concretizar seja o que for do que agora propõe.
Sobre o método e o instrumento repetimos hoje o que dissemos em Outubro: primeiramente que não há experiências nacionais de aplicação dos métodos de orçamentação deste tipo; em segundo lugar, o método só teria aplicação na parte bem restrita do Orçamento do Estado.
Em terceiro lugar, é um instrumento que, como qualquer outro, não garante por si só nenhum rigor nem transparência acrescidos, o que importa é que, seja qual for o instrumento usado, o Parlamento disponha de meios eficazes para acompanhar e fiscalizar a execução orçamental, o que lamentavelmente não tem acontecido.
Em quarto lugar, há mais de 10 anos que o Governo está obrigado à aplicação integral do chamado sistema unitário de contabilidade pública e sabemos que ainda o não concretizou nem vai concretizar certamente até 2012!… E há vários anos que estamos a tentar implementar a programação plurianual de despesas sob a forma de programas e continuamos sem o fazer.
Face a isto tudo, o PCP defende uma outra opção, sem recusar naturalmente a ponderação sobre novos métodos e instrumentos. O que para nós é decisivo e mais importante é concretizar plenamente a aplicação dos mecanismos que há anos estão em desenvolvimento e melhorar as condições e eficácia do Parlamento no seu papel fiscalizador de elaboração da execução orçamental, isto para evitar, Srs. Deputados, o que aconteceu hoje de manhã: a publicação dos dados da execução orçamental referentes a mais ou menos um terço do Estado, em termos globais, estrategicamente libertados para alguns órgãos de comunicação social, 18 dias antes do dia normal da publicação dos dados da execução orçamental.
O objectivo é claro, era o de impressionar a Sr.ª Merkel, fazer de conta que o Governo português é, de facto, um bom aluno, que executa tudo a preceito, embora, naturalmente, todo o País não se deixe impressionar com estes resultados porque são perfeitamente esperáveis.
Aqueles que perderam o abono de família, os que não têm subsídio de desemprego, os que viram cortar os seus salários — e foram milhares e milhares, centenas de milhares em Portugal — já estavam à espera que a despesa descesse, pois obviamente eles têm menos dinheiro no fim do mês, menos dinheiro de abono de família, não têm subsídio de desemprego, naturalmente que isso seria esperável. Agora, o que estes dados estrategicamente libertados por alguns órgãos de comunicação social não iludem é que, ao lado desta execução brilhante, segundo o Governo, temos as consequências da austeridade e elas são bem visíveis nos portugueses que mais sofrem e são bem visíveis no País que está novamente na antecâmara da recessão económica.

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