Pergunta ao Governo N.º 4851/XI/1

Enquadramento do processo legislativo que atribuiu “poderes de polícia” às concessionárias na fiscalização das portagens

Enquadramento do processo legislativo que atribuiu “poderes de polícia” às concessionárias na fiscalização das portagens

Em 2006, o Governo apresentou à Assembleia da República a Proposta de Lei n.º 42/X. Tratava-se do regime sancionatório aplicável às transgressões ocorridas em matéria de infra-estruturas rodoviárias onde seja devido o pagamento de taxas de portagem – regime esse que mereceu os votos favoráveis do PS, PSD, CDS e BE e os votos contra do PCP e do PEV. Foi assim aprovada a Lei n.º 25/2006 de 30 de Junho.

Em 2008, o Governo apresentou a Proposta de Lei 213/X, pedindo ao Parlamento autorização para legislar sobre os dispositivos electrónicos de matrícula. Quer no articulado da proposta de lei, quer no ante-projecto de decreto-lei anexo à mesma, não há uma única linha onde se refira a intenção de alterar a Lei n.º 25/2006 de 30 de Junho.

Essa proposta foi aprovada pela maioria absoluta que o PS detinha então na Assembleia da Republica, o que veio a resultar na Lei n.º 60/2008 de 16 de Setembro. No texto dessa lei, nada é dito sobre a alteração do regime de poderes, atribuições e competências das concessionárias e seus funcionários em matéria de fiscalização, e muito menos sobre a alteração da Lei n.º 25/2006 de 30 de Junho.

No uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 60/2008 de 16 de Setembro, o Governo aprovou o Decreto-Lei n.º 113/2009 de 18 de Maio. Tal legislação, elaborada num contexto político muito marcado pela perspectiva de imposição de portagens nas SCUT, altera a Lei n.º 25/2006 de 30 de Junho sem a devida autorização legislativa da Assembleia da República.

Tal alteração atribuía aos funcionários das concessionárias poderes de autoridade que desde sempre foram reconhecidos, apenas e só, às forças de segurança. No entanto, e mais do que isso, previa procedimentos a que nem as forças de segurança recorrem, como seja a alegada faculdade de mandar parar veículos em auto-estradas.

Já na presente Legislatura, com o Projecto de Lei 28/XI/1, o PCP propôs a revogação desse decreto-lei, no âmbito do Sistema de Identificação Electrónica de Veículos e o Dispositivo Electrónico de Matrícula. O Projecto de Lei do PCP foi aprovado na generalidade mas o PS e o PSD negociaram a interrupção desse processo e transformaram a revogação do Decreto-Lei numa alteração, deixando todavia incólume a norma que esse mesmo Decreto-Lei havia introduzido.

Continua assim a estar previsto um cenário em que funcionários destas empresas poderão interceptar e mandar parar os cidadãos que circulem em auto-estradas e pontes com portagem. Mantém-se o problema de fundo, com uma norma que foi aprovada pelo Governo sem o devido enquadramento legal e constitucional e que coloca evidentes implicações ao nível dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.

Assim, ao abrigo do disposto na alínea d) do Artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e em aplicação da alínea d), do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, pergunto ao Governo, através do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, o seguinte:

1. Como explica o Governo que tenha sido atribuído aos funcionários e agentes das concessionárias um quadro de poderes de autoridade típicos de forças de segurança, através de uma alteração à Lei que não teve a devida autorização legislativa da Assembleia da República?

2. Que medidas tenciona o Governo adoptar para corrigir esta situação, garantindo o respeito pela legalidade democrática e o cumprimento da Constituição da República?

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