Encontro de Quadros do Alentejo

 

 

Intervenção de Carlos Carvalhas, Secretário-geral do PCP 

O governo de direita embora ainda com vários disfarces e com palavras de veludo vai mostrando ao serviço de quem está a sua política.

Agora aumenta o IVA não 1 mas 2 pontos percentuais. O IVA é um imposto cego e injusto que taxa da mesma maneira tanto o multimilionário como o que ganha o salário mínimo. E vai ter também efeitos negativos na competitividade da economia e das exportações e desde logo face a Espanha.

Depois da demagogia da campanha eleitoral temos agora a realidade da política do Governo da direita.

Em vez do aumento das reformas e pensões tal como prometeu e designadamente das mais degradadas, o Governo prepara-se para entregar às seguradoras privadas as partes mais rentáveis da segurança social.

O que o PSD e o PP pretendem é que os altos salários não descontem para a segurança social isto é, não tenham a obrigatoriedade de contribuir para o sistema público e que os milhões acumulados pelos descontos dos trabalhadores sejam transferidos da segurança social para o mercado de capitais. É um grande negócio e uma grande negociata.

Estamos a falar de muitos milhões de contos, cerca de 715 milhões (em Dezembro de 2001), que há muito despertam a gula das seguradoras e da Banca, interessados em captar e gerir este capital.

Quanto ao tecto contributivo, o tal plafonamento, a partir do qual (6,7 ordenados mínimos) os altos salários deixariam de contribuir para a segurança social, estima-se que esta medida levaria a uma quebra de receitas da ordem dos 55 milhões de contos!...

São cinquenta e cinco milhões que passarão para os cofres privados das seguradoras. Temos que dar combate a esta negociata e exigir sim, o aumento significativo das pensões mais degradadas bem como, a aproximação ao salário mínimo líquido dos regimes contributivos, tal como está consignado na Lei de Bases em vigor.

A luta por estes objectivos e a luta em defesa do sistema público da Segurança Social, uma conquista do 25 de Abril, tem de ser assumida pelos trabalhadores no activo e pelas novas gerações de trabalhadores bem como, por aqueles e aquelas que consideram essencial preservar e aprofundar a protecção social para todos através de um forte e consolidado sistema público.

A dramatização das contas públicas, o empolamento do défice, chegando-se ao ridículo do Governo ser, nas suas estimativas, contrariado por Bruxelas, está a servir para dar cobertura à política de aumentos generalizados de bens de primeira necessidade e ao "aperto do cinto" para os mesmos de sempre.

No 1º de Maio, o Primeiro Ministro anunciou, com candura, que apesar das dificuldades o seu governo iria aumentar os salários... moderadamente!

Mas como todos sabemos, só há aumento de salários se estes forem superiores à taxa de inflação. Se forem inferiores estamos perante diminuições inequívocas dos salários reais.

Pela nossa parte não deixaremos passar a demagogia, nem as frases dúbias para enganar incautos.

Por isso, ficamos à espera do aumento do salário mínimo, da tributação da Banca e dos Seguros de modo a que a sua taxa efectiva de IRC seja igual à dos demais empresários! Foram promessas feitas em campanha eleitoral e que agora o governo quer deixar no congelador até que o esquecimento as apague...

Temos também que exigir que o Governo tome medidas em relação ao encerramento de diversas empresas e nomeadamente, em relação a várias empresas de confecções que estão a declarar falência para se deslocalizarem para outros mercados.

São empresas que receberam apoios, que tiveram benefícios fiscais e subsídios de diversa ordem e que agora querem abandonar o País em busca de maiores lucros, sobrando para o Estado e para o sistema de Segurança Social os encargos económicos e sociais resultantes das suas decisões.

Recordamos, aqui, exigindo coerência ao PSD e ao PP, que por proposta do PCP, a Assembleia da República aprovou na anterior legislatura uma resolução com os votos a favor daqueles partidos, com vista a alterar a legislação sobre indemnizações por despedimentos, aumentando os valores a pagar aos trabalhadores que perdem o seu emprego em resultado dos processos de deslocalização; aumentando o período com direito ao subsídio de desemprego; defendendo um programa público de apoio às autarquias vítimas de prejuízos decorrentes da deslocalização e a exigência de que essas empresas reembolsem as ajudas públicas outorgadas.

É uma vergonha se o PSD e o PP e o seu governo dão o dito pelo não dito e se continuam como Pilatos, a lavar as mãos perante as sucessivas deslocalizações e encerramento de empresas deixando os trabalhadores e as suas famílias numa situação dramática, como é o caso da ERES no Fundão.

Perante a ofensiva que se desenha e que já está a tomar corpo no governo de direita são de grande significado as comemorações que se realizaram no 25 de Abril e 1º de Maio. Na verdade, as grandes manifestações do 25 de Abril e do 1º de Maio são um importante indicador da disposição de luta em defesa dos valores de Abril, e do combate em defesa de conquistas sociais e dos direitos dos trabalhadores e das justas reivindicações.

Aqueles que ainda recentemente fizeram das eleições legislativas eleições para Primeiro-Ministro, que promovem e defendem políticas de concentração de riqueza, que praticaram o clientelismo e a política espectáculo e que estão agora a meter na gaveta as promessas que andaram a fazer, voltaram de novo com a "reforma do sistema político", para dar combate ao desprestigio da política. O sistema político pode ser aperfeiçoado e há mudanças que podem e devem ser responsavelmente debatidas. Mas não deixa de ser curioso que aqueles que se dizem preocupados com a abstenção, com o desinteresses pela participação cívica e política sejam os que mais têm contribuído para desprestigiar e desacreditar a vida política.

Prestigia-se a vida política com a introdução dos círculos uninominais favorecendo os casos tipo limiano e o caciquismo de círculo, ou diminuindo o número de deputados para estabelecer o bipartidarismo e a redução de escolhas políticas dos largos milhares de cidadãos que não se reconhecem no PSD ou no PS?

É caso para lembrar a França e os fenómenos da abstenção e do ascenso da extrema direita, em que também se fala muito do fracasso do sistema político que, como se sabe, se baseia precisamente em círculos uninominais e como a experiência mostra, deixa milhares de eleitores que não se revêem no deputado eleito sem representação política. Não é com alterações ao sistema eleitoral, visando artificialmente o reforço do PSD e do PS e o silenciamento institucional das vozes que lutam por uma alternativa real, que se prestigia a vida política.

Credibiliza-se e prestigia-se a política e a vida política, honrando os compromissos, dando resposta aos problemas, falando verdade, dando voz aos cidadãos e aos desprotegidos, promovendo o pluralismo e a proporcionalidade, combatendo as injustiças sociais, o poder do dinheiro, o clientelismo e a corrupção.

No jogo de espelhos da reforma do sistema político o que está no centro das preocupações do PS e do PSD é a sua hegemonia, a redução da vida política e das escolhas aos dois partidos e assegurar o rotativismo entre si, de modo que mudem as siglas e as caras permanecendo o que é essencial e mais estruturante à custa dos trabalhadores e dos interesses populares.

É bom que se medite no ascenso da extrema direita xenófoba, racista e fascizante em França, na Áustria, na Bélgica, na Holanda e Dinamarca.

É bom que se medite no rumo da construção europeia e nas políticas levadas à prática pelos partidos socialistas e social-democratas, que estiveram no poder na maioria dos países da União Europeia nos últimos anos e que imprimiram aos seus governos e a partir da Comissão Europeia uma política neoliberal.

É bom que se atente que todos os expoentes da extrema direita são hábeis demagogos, que falam em nome dos mais fracos, dos desempregados, jogando com as frustrações, os desencantos e os medos, tocando a tecla da insegurança e do nacionalismo e que, não raras vezes, têm sido promovidos por partidos no poder e pela comunicação social que lhes é afecta para dividir o campo adversário...

Permitam ainda que, referindo-me à situação internacional, daqui expresse a nossa solidariedade activa ao povo palestiniano e à sua heróica resistência bem assim como, às forças da paz que em Israel lutam com coragem contra a criminosa política do governo de Sharon.

E que, aqui também, deixe uma palavra de solidariedade para com o povo de Timor e a Fretilin, que no próximo dia 20 alcança a sua independência formal, ao povo angolano, ao MPLA e às perspectivas de paz que agora estão abertas e ao povo venezuelano que na rua defendeu o seu Presidente contra as ingerências externas e as forças do grande capital.

Decorre em todo o Partido a preparação da Conferência Nacional. As opiniões diferenciadas, o contraditório, as respostas e caminhos para uma maior afirmação do Partido, a análise dos factores que contribuíram para os maus resultados eleitorais, o melhor conhecimento da realidade onde actuamos, as preocupações com debilidades partidárias e o combate à ofensiva do Governo de direita, têm estado na ordem do dia de um debate que se quer sereno, aprofundado e com respeito mútuo.

Debate que decorre nas diversas organizações, mas também na tribuna do "Avante!" e em múltiplos plenários de militantes o que, só por si, é também um testemunho de que a opinião dos militantes não está confinada à sua célula ou à sua organização.

O debate convoca todos os comunistas que, como temos apelado, têm não só o direito, mas o dever de participarem com a sua opinião, com a sua crítica e a sua proposta.

O grande espaço de debate aberto com a preparação da Conferência deve contribuir para o aprofundamento da nossa intervenção, para uma maior ligação aos problemas e à sociedade, para a dinamização dos movimentos sociais e de massas. E este deve prosseguir, como o estamos a fazer aqui, no quadro do normal funcionamento do Partido, com serenidade, com exigência e rigor sobre as causas e o modo de ultrapassar as nossas dificuldades.

Os trabalhadores, o povo e o país não precisam menos mas sim cada vez mais de um partido comunista que, atento aos novos desafios do tempo em que vivemos, ocupe hoje e amanhã com renovada confiança e determinação o seu destacado lugar na primeira linha de luta contra a injustiça, a exploração e a opressão, de um partido comunista digno do seu nome, da sua história, dos seus ideais e do seu projecto humanista de transformação social, o Partido Comunista Português.

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