Intervenção de António Filipe na Assembleia de República

A encomenda ao Fundo Monetário Internacional da elaboração de um relatório com mais medidas de austeridade

Sr.ª Presidente,
Sr.ª Deputada Catarina Martins,

Assistimos ontem a um truque que já é velho, que é o de o Governo pretender esconder as suas próprias opções por detrás de um estudo ou de um relatório que se encarrega de encomendar.

Pouco nos interessa o que é que o FMI escreve ou deixa de escrever, porque o FMI tanto escreve uma coisa como o seu contrário. Às segundas, quartas e sextas há um relatório a dizer que é preciso incentivar o crescimento, tomar medidas de crescimento e de emprego; às terças, quintas e sábados aparece com relatórios a dizer exatamente o contrário, que o que é preciso é austeridade, austeridade e austeridade, cortar no Estado, cortar nas reformas e cortar no emprego.

O mais preocupante, porém, é que, perante este verdadeiro programa de terrorismo social — não tem outro nome — que ontem foi divulgado, tenha aparecido o Sr. Secretário de Estado Carlos Moedas a dizer que se trata de um estudo muito bem feito e que o Governo não pode garantir que não vá tomar nenhuma daquelas medidas, o que, de facto, demonstra que é o Governo o mandante deste tipo de programa apresentado pelo FMI.

Sr.ª Deputada, queria colocar-lhe duas questões, que têm que ver com as grandes mentiras com que estamos a ser confrontados.

A primeira mentira é a de que o Estado social é insustentável, como se houvesse agora menos dinheiro do que havia nos anos 40, após a Segunda Guerra Mundial, quando foram lançadas as bases do chamado modelo social europeu.

Quanto à insustentabilidade, Sr.ª Deputada, importa perguntar o seguinte: o BPN é que é sustentável?! Ou seja, é sustentável que os contribuintes sejam obrigados a enterrar 6000 milhões de euros no BPN? O Banif é que é sustentável?! E lá vão mais 1100 milhões de euros dos contribuintes. Isso é que é sustentável?!

Aumentar o salário mínimo em 15 €? Isso é insustentável! Reformas de 300 € por mês para quem trabalhou uma vida inteira? Isso é insustentável! Sustentáveis são os crimes dos banqueiros?! Insustentáveis são as reformas, os salários, os desempregados, os trabalhadores!

Sr.ª Deputada, não acha que estamos perante uma grande mentira com esta tese da insustentabilidade do Estado social, quando assistimos a uma transferência massiva de dinheiro dos contribuintes para salvar a banca, para salvar os desmandos e os crimes cometidos pelos banqueiros?
Sr.ª Deputada, queria colocar-lhe ainda uma outra questão.

Estamos a assistir a um discurso de que a austeridade nunca é suficiente. As medidas são suficientes quando são adotadas, mas passados 15 dias já não o são, são precisas outras, e isto não para. Sr.ª Deputada, a pergunta com que termino é esta: com que País ficaríamos se estas medidas fossem, alguma vez, levadas por diante? Em que País seriam os portugueses obrigados a viver se este programa de terrorismo social pudesse alguma vez ser levado por diante?

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