Intervenção de Carlos Carvalhas, Secretário-Geral

Encerramento dos Debates "PORTUGAL 2000"

Caros amigos e camaradas,

Queria começar por vos saudar, agradecer a vossa generosa presença e relembrar que a recusa frontal a um rotativismo centrado do PS ou no PSD, que não se distingue nas políticas fundamentais mas que apresenta diferenças apenas em aspectos específicos, conduziu o PCP – na linha das orientações aprovadas no seu XV Congresso e na reunião do Comité Central de Fevereiro do ano passado – a assumir a necessidade de afirmação alternativa de um projecto de esquerda e de poder, que suporte a perspectiva, a possibilidade e a luta pela concretização de um novo rumo democrático para Portugal.

Caracterizámos a realização desse objectivo como processo. Falámos em movimento. E na necessidade de percorrer um caminho.

Um processo assente num alargado e genuíno esforço de diálogo e de debate, à esquerda, respeitador da pluralidade das expressões e das diferenças, em que o PCP assume também as suas próprias posições. E conducente, no seu desenvolvimento, ao apuramento substantivo de políticas, e à construção de pontes e de convergências.

Um movimento aberto à sociedade e às forças, posicionamentos, ideias e aspirações que nela se manifestam criticamente em relação ao neoliberalismo, estreitamente ligado a toda a dinâmica social, com um destaque muito particular para a intervenção e a luta dos trabalhadores e da juventude.

E um caminho para cujo percurso é indispensável assegurar a contribuição activa do PCP, inseparável do seu reforço, bem como a participação de muitos socialistas e de outros democratas, além de importantes forças sociais, que inscrevem a sua intervenção no vasto e diversificado campo da esquerda.

Dissemos também que não concebíamos a afirmação de um projecto de esquerda e de poder para um novo rumo democrático, como um processo limitado no tempo e balizado pelas próximas legislativas.

E ao mesmo tempo que manifestámos a forte disponibilidade da abertura e do empenho do PCP para contribuir para este processo, recordais certamente as garantias que demos – a todos os que se dispusessem a participar nos Debates para uma política de esquerda – da completa ausência de propósitos instrumentalizadores, do total respeito pelos diversos posicionamentos, sem compromissos para além da disponibilidade de cada um para dar opiniões e para escutar e reflectir sobre as opiniões dos outros.

Na hora de procedermos ao encerramento do Portugal 2000 - dos debates para uma política de esquerda, gostaríamos de deixar uma palavra de reconhecimento a todos quantos – e muitos foram –pela sua participação e pela sua intervenção, contribuíram para o sucesso desta iniciativa, apesar da realização dos dois referendos não terem permitido levar este esforço tão longe quanto era inicialmente o nosso propósito.

Pela parte do PCP estamos conscientes de termos dado uma contribuição no sentido de se progredir no debate de um importante conjunto de questões, no reconhecimento das diversas opiniões e sensibilidades existentes, e na consideração de possibilidades de acção comum ou convergente em tal ou tal matéria.

Ficou comprovado que em relação aos problemas colocados pela globalização capitalista, pela construção europeia e pela política seguida, em áreas sensíveis, pelo governo do PS – ao nível da economia e do desenvolvimento regional, da fiscalidade, das questões laborais e do emprego, das principais áreas sociais, da educação ciência e cultura, do ambiente, da justiça, da cidadania e do próprio funcionamento do sistema político – existem largas zonas de convergência das várias análises.

Também se verificam importantes aproximações de pontos de vista no que respeita às orientações e às medidas políticas que foram defendidas.

Onde surgiram, naturalmente, maiores diferenças, foi ao nível da própria intervenção e da convergência das forças, sensibilidades e correntes políticas da esquerda. Se é certo que os processos da globalização capitalista e a agressividade das políticas neoliberais favorecem a compreensão da necessidade da convergência de forças para uma resposta política, social e ideológica, já ao nível da sua concretização nacional as ideias são menos claras e até, em alguns aspectos, pouco coincidentes.

Este é um trabalho de aproximação, que queremos continuar no futuro, de diálogo e de debate, de impulso a novos movimentos de ideias, de vontades e de lutas e que não se traduz em cálculos e engenharias eleitoralistas de curto prazo sempre redutores e divorciados do que é necessário para uma convergência à esquerda.

A maneira aberta e leal como procurámos contribuir para o diálogo e o debate à esquerda, com inteiro respeito pelas posições e pela autonomia e determinação de cada corrente ou sensibilidade, distancia-se radicalmente de qualquer tentativa de utilização e instrumentalização da tão sentida necessidade de convergência de esquerda para uma afirmação estritamente partidária e eleitoral.

Sejamos claros.

O PCP sustentou e continua a sustentar a importância de uma convergência à esquerda, assente num debate sério de ideias e de políticas, e abrangente dos comunistas, de muitos socialistas, de outros democratas da área dos pequenos partidos extra-parlamentares e de muitos independentes.

Mas uma convergência que assenta no respeito pela afirmação das diferentes identidades e objectivos, pelas autonomias de decisão e pelos percursos livremente assumidos, entre as quais a do nosso próprio Partido.

Amigos e camaradas,

As próximas eleições – para o Parlamento Europeu em 13 de Junho, para a Assembleia da República em Outubro – já dominam a vida política nacional e é compreensível que motivem agora a concentração da atenção e de energias por parte do PCP.

O povo português não está condenado a deixar-se aprisionar no falso dilema de escolher entre o PS e a AD quando, como a experiência tem sobejamente demonstrado, em questões políticas essenciais as posições dessas forças não se apresentam fundamentalmente como opostas, mas sobretudo como coincidentes, convergentes ou complementares.

O povo português tem realmente ao seu alcance a possibilidade, através do voto na CDU, de dar força a uma força política que honra sempre os seus compromissos com os trabalhadores, com as restantes camadas laboriosas, com a juventude, que dá voz a quem tem voz, que rejeita e combate as falsas "inevitabilidades" dos dogmas dos mercados, que acredita e tem esperança na capacidade criadora dos povos para rasgarem novos rumos e horizontes de aprofundamento democrático e emancipação humana.

De dar força a quem defende uma política alternativa assente nos valores da esquerda.

E de dar força, ao mesmo tempo, aos que trabalham e lutam de forma consequente e incansável, pela concretização de uma convergência de esquerda, que suporte a concretização de uma verdadeira alternativa de esquerda a actual política.

Se o PS, apoiando-se nomeadamente na utilização ilegítima do aparelho do Estado, lograsse atingir o objectivo de uma maioria absoluta, não é difícil de prever que a construção de uma alternativa progressista e de esquerda enfrentaria acrescidas dificuldades e atrasos.

Situação que será evidentemente a oposta caso esse objectivo hegemónico do Governo não seja atingido e se registe, à esquerda, um reforço da influência política e eleitoral, designadamente por parte da CDU e do PCP.

É com esta última perspectiva que necessitamos, todos, de intervir nas próximas batalhas eleitorais.

Está nas mãos dos trabalhadores e das trabalhadoras, está nas mãos dos homens e das mulheres que entendem que é necessário um outro rumo para a política nacional, darem com o reforço da CDU um forte impulso para uma efectiva viragem à esquerda que faz falta a Portugal.