Intervenção de

Emprego e qualidade de emprego - Intervenção de Jorge Machado na AR

Emprego e qualidade de emprego

 

Sr. Presidente,
Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social,

Não chegavam 3, 6 ou mesmo os 11 minutos de que dispomos para relatar todas as empresas do nosso País que se deslocalizaram, nem chegava um dia inteiro de Plenário para relatar o desespero e os problemas sociais provocados pelas saídas de multinacionais a que temos assistido.

Ao contrário do que o Governo vai anunciando, o modelo de desenvolvimento assente em baixos salários e com baixos níveis de incorporação nacional continua a ser uma triste realidade.

O Governo pode anunciar uma mão-cheia de medidas que visam mudar o perfil e o modelo de desenvolvimento, só que quando chegamos à prática, às medidas em concreto, estes anúncios e boas intenções parecem areia a fugir entre os dedos da mão.

A título de exemplo, basta lembrar que o Sr. Ministro da Economia e da Inovação tentou captar investimento estrangeiro fazendo alusão aos baixos salários praticados em Portugal.

Além de tomar efectivamente medidas para mudar o modelo de desenvolvimento económico, o Governo deveria, no plano imediato, tomar medidas visando regulamentar o processo de deslocalização destas empresas.

Desde Janeiro de 2003, pelo menos, que o PCP apresenta, nesta Câmara, propostas que visam regulamentar o processo de deslocalização e de encerramento de empresas.

As nossas propostas passam, entre outras, pela obrigatoriedade de um contrato escrito; pela definição de mínimos de incorporação nacional, o que dificulta a deslocalização e pode constituir um acrescento para a nossa economia; pela determinação do valor e do perfil de emprego; e por uma duração de investimento nunca inferior a cinco anos.

Entre outras, as medidas que apresentamos passam pela proibição destas empresas de apresentarem novas candidaturas a ajudas públicas nos cinco anos subsequentes à deslocalização; por uma majoração das indemnizações para os trabalhadores; pela existência de um fundo extraordinário de apoio à criação de emprego para minorar os efeitos da deslocalização; e pela obrigatoriedade de comunicar à Comissão Europeia e a outras instituições a deslocalização, para impedir que essas empresas beneficiem de um qualquer outro apoio num qualquer outro país da comunidade europeia.

A questão que lhe coloco, Sr. Ministro, é se o Governo vai continuar a assistir a este flagelo das deslocalizações sem impor o mínimo de regras que visem combatê-las ou, pelo menos, minorar os seus efeitos.

Vai o Governo continuar a apostar na atracção deste tipo de investimento estrangeiro «beduíno», «sanguessuga», que vive à custa dos apoios públicos?

E escusa de dizer, Sr. Ministro, que somos contra o investimento estrangeiro. Não somos, queremos é investimento estrangeiro sério, que crie emprego e desenvolva a nossa economia de uma forma estruturada.

(...)

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados:

A Inspecção-Geral do Trabalho desempenha hoje um papel extremamente importante. Na verdade, a crescente desregulamentação das relações de trabalho, o uso e abuso dos «falsos» recibos verdes, a utilização de contratos a prazo para tarefas permanentes e, entre outras, o uso abusivo de trabalho temporário levam a que hoje tenhamos de assistir a níveis muito preocupantes de trabalho precário. Na verdade, hoje a precariedade atinge mais de 21% dos trabalhadores.

Face a este contexto de elevado incumprimento da lei, a Inspecção-Geral do Trabalho desempenha ou deveria desempenhar um papel importante neste mundo de ilegalidades.

A verdade é que, devido à falta de meios e recursos humanos, a Inspecção-Geral do Trabalho não tem respondido de forma adequada. No ano de 2006, segundo dados da própria Inspecção-Geral do Trabalho, transitaram de 2005 mais de 10 000 pedidos de intervenção, isto é, ficaram mais de 10 000 pedidos por responder.

Se, no passado, chamávamos a atenção para o facto de apenas existirem 286 inspectores ao serviço e que o reforço de 38 inspectores - anunciados na altura - não era suficiente, neste ano de 2007 regista-se um agravamento dos problemas. Na verdade, dos 38 inspectores que o Governo anunciou como reforço nem todos chegaram à categoria de inspectores e os que conseguiram não chegaram para colmatar os inspectores que se aposentaram.

Os resultados da acção do Sr. Ministro são os de que se, em 2006, tínhamos só cerca de 280 inspectores, hoje temos menos de 200 inspectores. Ou seja, temos apenas 187 inspectores que acumulam serviços administrativos com serviços de inspecção no terreno. Mesmo que entrem os 100 inspectores hoje anunciados e não saia nenhum inspector para aposentação, ficamos apenas com 287 inspectores, praticamente o mesmo que tínhamos em 2006, um número, mesmo assim, verdadeiramente vergonhoso se tivermos em conta que a Inspecção-Geral do Trabalho tem um quadro de 538 inspectores e que, de acordo com os rácios europeus, deveríamos ter cerca de 750 inspectores.

A leitura que tiramos é a de que o Governo, incluindo o Sr. Ministro, não quer que a inspecção funcione, beneficiando assim os infractores e criando um sentimento de impunidade.

 Já apresentámos um projecto de resolução que cria um plano de emergência para a resolução dos pedidos de inspecção pendentes na Inspecção-Geral do Trabalho e um outro projecto de resolução que determina o reforço dos meios desta Inspecção.

Vai o Governo garantir os meios e os recursos humanos suficientes para uma Inspecção-Geral do Trabalho que esteja à altura dos desafios que lhe são colocados? Ou vai permitir que a Inspecção-Geral do Trabalho continue sem meios e com uma perspectiva de mediação dos conflitos e não intervenção efectiva na resolução destes?

Sr. Presidente,
Sr. Ministro do Trabalho e da Solidariedade Social,
Sr.as e Srs. Deputados:

Depois do alinhamento por parte da Comissão Europeia, depois do «tiro de partida» dado pelo Sr. Presidente da República, o Governo entrou na corrida da «flexi-insegurança».

Face aos problemas que a globalização coloca, a Comissão Europeia, o neoliberalismo, diz que a solução passa por mais precariedade, menos direitos e liberalização dos despedimentos em troca de segurança, mas no desemprego.

Em Portugal, Sr. Ministro, já reina a flexibilidade: são os recibos verdes, os contratos precários, o outsourcing, o trabalho temporário, é a facilidade que hoje os patrões têm em promover despedimentos colectivos.

Sr. Ministro, quanto à flexibilidade, diga lá aos senhores da Comissão Europeia que já estamos bem servidos, que já temos é flexibilidade a mais! A prová-lo estão os 21% de trabalhadores com vínculos precários.

O que faz falta, em Portugal e no mundo, Sr. Ministro, é a segurança no emprego, é emprego com direitos, são salários dignos para os trabalhadores, são condições de trabalho adequadas, é formação e qualificação dos trabalhadores.

Sr. Ministro, quanto à protecção no desemprego, não podemos deixar de referir que o caminho seguido pelo seu Governo vai no sentido oposto à protecção no desemprego. Hoje, os trabalhadores têm pior protecção, menos tempo de subsídio de desemprego e recebem menos. Assim, quanto à segurança, quanto à protecção no desemprego estamos piores.

Sr. Ministro, depois de Lisboa ter ficado associada à destruição do Estado social, Portugal vai assumir um papel importante no âmbito da Presidência da União Europeia quanto à discussão deste tema. Qual vai ser o sentido, a orientação do Governo? Vai o Governo defender a alteração do conceito de justa causa para liberalizar os despedimentos? Vai apostar na desregulamentação das relações de trabalho, dos horários de trabalho, com os graves impactos que isso acarreta para a vida dos trabalhadores?

Vamos assistir a um Governo do Partido Socialista que não só não corrige como agrava o Código do Trabalho de Bagão Félix?

 

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