Projecto de Resolução N.º 597/XII/2.ª

Elaboração de um Relatório anual sobre abandono escolar e empréstimos bancários no Ensino Superior

Elaboração de um Relatório anual sobre abandono escolar e empréstimos bancários no Ensino Superior

O Ministro da Educação afirmou recentemente que “não há nada neste momento que indique que haja um abandono maior por dificuldades económicas”. Estas palavras são desmentidas todos os dias pela realidade com que os estudantes estão confrontados.

Desde há muito que o PCP vem alertando para o aumento dos custos de acesso e frequência do ensino superior e para as consequências que daqui decorrem para milhares de estudantes que ficam impedidos de frequentar os mais elevados graus de ensino.

Esta realidade não é nova, mas por força da profunda crise económica e social com que o país está confrontado e do agravamento brutal das condições de vida, tem vindo a agravar-se.

Sucessivos governos PS, PSD e CDS desresponsabilizaram-se das suas obrigações constitucionais no financiamento às instituições e, hoje, estudar no ensino superior não é para quem quer é para quem pode pagar.

Só nos últimos 2 anos mais de 15.600 estudantes perderam a bolsa e 12.000 verão o seu valor reduzido. Milhares de estudantes abandonam o ensino superior porque não têm condições económicas para pagar custos exorbitantes para a larga maioria das famílias portuguesas.

No ano letivo 2009/2010 num universo de cerca de 73.000 bolseiros apenas 119 tinham bolsa máxima. No ano letivo 2010/2011 com a aplicação do Decreto-Lei n.º 70/2010, 11.000 estudantes perderam bolsa e 12.000 estudantes tiveram redução no valor da bolsa. Para além disto, o preço do alojamento nas residências e da refeição nas cantinas de Ação Social sofreram aumentos.

No ano letivo 2011/2012 foi negado o acesso à bolsa de ação social a cerca de 15.600 estudantes. Em dois anos, cerca de 26.600 estudantes perderam a bolsa de estudo.

No ano letivo 2012/2013 o Governo PSD/CDS fez alterações de pormenor ao regulamento de atribuição de bolsas a estudantes do Ensino Superior. A manutenção das limitações no acesso às bolsas de estudo é ainda mais grave num momento de acelerada deterioração das condições económicas e sociais das famílias e de aumento dos custos de acesso e frequência ao ensino superior.

Esta situação radica numa política de Ação Social Escolar que apenas garante apoio às famílias que vivem com rendimentos próximos ou abaixo do limiar da pobreza.

A Ação Social Escolar é muito limitada: hoje, num agregado familiar com um membro desempregado, outro a receber o salário mínimo nacional, com dois filhos frequentando um deles o ensino superior, o valor da bolsa a que tem direito é de 2,30€/dia. Um casal que aufira o salário mínimo nacional e tendo dois filhos recebe a bolsa mínima que apenas cobre o valor das propinas.

A consequência desta opção é a exclusão de milhares de estudantes que apesar de viverem com condições económicas e sociais muito difíceis não são sequer elegíveis para efeito de atribuição de bolsa.

Simultaneamente, o anterior Governo PS e o atual Governo PSD/CDS têm vindo a fazer caminho na privatização da Ação Social Escolar ao substituí-la por empréstimos bancários. O PCP considera este caminho inaceitável por representar uma desresponsabilização do Estado na garantia de um direito fundamental e no endividamento sem garantia para as famílias mas com lucros para a banca.

Em 2009, de acordo com números do governo, 48,9% das famílias tinham um rendimento médio/mensal bruto até 849 euros. Os jovens que pedirem o empréstimo, quando chegar o momento em que vão começar a pagar não estão no mercado de trabalho e por isso vão ser as famílias a pagar, não sendo o seu rendimento melhor do que em 2009.

Notícias recentes indicam que estudantes do ensino superior contraíram no 1º trimestre deste ano 1437 empréstimos bancários, no valor total de quase 17 milhões de euros. Dados divulgados por uma holding do sistema de garantia mútua nacional, indicam que o valor total dos novos contratos firmados desde 12 de Janeiro até 31 de Março deste ano, ascende a 16,9 milhões de euros, e que o valor médio dos empréstimos passou de 11,4 mil euros em 2011 para 11,7 mil em 2012.

Desde o ano letivo 2006/2007 foi viabilizada a concessão de crédito a 17.236 estudantes de licenciaturas, mestrados, pós-graduações ou de especialização tecnológica. O recurso aos empréstimos bancários tem vindo a crescer: 3954 empréstimos concedidos no ano letivo de 2009/10 para 4466 no ano letivo 2010/2011.

Nem o anterior Governo PS, nem o atual Governo PSD/CDS apresentaram quaisquer números sobre esta realidade. Consecutivamente confrontado com a necessidade de dar a conhecer estes números, o Governo PSD/CDS nunca divulgou quaisquer estudos ou dados estatísticos sobre o universo, as causas, e os impactos do abandono escolar no ensino superior e no desenvolvimento económico e social do país. O Governo PSD/CDS chega mesmo a negar esta realidade dramática que atinge certamente milhares de estudantes.

Considerando fundamental o combate ao fenómeno do abandono escolar e o reforço da ASE no ensino superior, o PCP entende que é indispensável a Assembleia da República conhecer integralmente esta realidade.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de

Resolução

A Assembleia da República recomenda ao Governo, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República que:

1- Apresente à Assembleia da República, anualmente, um Relatório profundo e rigoroso sobre o abandono escolar no ensino superior;

2- Apresente à Assembleia da República, anualmente, um Relatório de caracterização sócio económica dos estudantes do ensino superior, incluindo a caracterização económica, social, geográfica de origem, dos estudantes que tiveram acesso ao apoio da ASE nos últimos 2 anos letivos bem como daqueles que recorreram ao sistema de empréstimos bancários para estudantes;

3- No prazo máximo de 2 meses, apresente à Assembleia da República os Relatórios referidos nos números anteriores com os dados referentes ao presente ano letivo e aos dois anteriores;

4- Elabore um estudo prospetivo sobre as necessidades de alargamento da rede de residências, de acordo com as necessidades concretas de cada universidade e politécnico, tendo por referência o número de estudantes beneficiários da ação social escolar direta e estudantes deslocados;

5- Na sequência desse estudo, defina um plano de construção de residências de acordo com as necessidades concretas de cada universidade e politécnico, tendo por referência o número de estudantes beneficiários da ação social escolar direta e deslocados.

Assembleia da República, em 31 de janeiro de 2013

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