Reforça os direitos dos trabalhadores em caso de procedimento disciplinar
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O direito ao trabalho e à segurança no emprego é um direito fundamental consagrado na Constituição da República Portuguesa. A protecção da segurança no emprego é a protecção contra a arbitrariedade dos despedimentos e o desemprego com todas as suas consequências, mas é ao mesmo um elemento de defesa da dignidade dos trabalhadores, da recusa destes a preceitos salariais, de horário, de condições de trabalho indignos, suscitados por entidades patronais que usem a chantagem "ou aceitas ou és despedido".
Ao longo dos anos a acção das confederações patronais e de sucessivos governos ao seu serviço têm tentado impor a facilitação dos despedimentos sem justa causa. Ao longo dos anos a luta dos trabalhadores tem impedido que tal se concretize, sempre com a intervenção e o apoio do PCP.
Tal foi tentado com a aprovação do Código do Trabalho da responsabilidade do PSD e CDS-PP em 2003, norma declarada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional, tal foi tentado pelo Governo PS, obrigado a recuar na fase das alterações ao Código do Trabalho. No entanto há alterações ao Código do Trabalho da responsabilidade do Governo PS que visam fragilizar os direitos de defesa e protecção dos trabalhadores em processos de despedimento.
Ao invés de corrigir os aspectos negativos do Código do Trabalho, num momento em que mais é necessário promover a elevação dos salários e rendimentos dos trabalhadores e da população, quando é mais necessário proteger os direitos dos trabalhadores, o PS impôs alterações que visam fragilizar esses direitos.
Num quadro de profunda agudização das condições de vida dos trabalhadores, da diminuição dos salários e do poder de compra, de aumento significativo do desemprego e da pobreza, as opções legislativas deveriam, na esteira dos princípios constitucionais, reforçar a protecção e os direitos de quem trabalha, concretizando o direito ao trabalho, o princípio da segurança no emprego, a liberdade sindical, os direitos das associações sindicais e a contratação colectiva, os direitos dos trabalhadores plasmados na Constituição da República Portuguesa. O PS fez precisamente o contrário do que prometera e que era essencial na actual conjuntura económica e social, ao mesmo tempo que assume responsabilidades acrescidas pelo desinvestimento deliberado na Autoridade para as Condições do Trabalho e pela debilitação da justiça laboral.
Dizia o PS, em 2003, que o Código do Trabalho "torna lícito o despedimento ilegítimo" e "inclui normas que põem em causa níveis mínimos de segurança e estabilidade no emprego (vg. duração da contratação a termo, despedimentos e oposição à reintegração de trabalhadores) e conflituam, nessa medida, com princípios constitucionalmente consagrados.".
Num país que conta com cerca de 600.000 desempregados, o Governo PS preconiza o despedimento sumário, aligeirou os processos e a possibilidade de defesa do trabalhador e limitou a possibilidade de reintegração do trabalhador despedido, mesmo em caso de despedimento sem justa causa e pretende diminuir o valor das indemnizações.
Ora, o Governo PS eliminou a fase de instrução, determina que a falta de audiência prévia deixe de se configurar como nulidade e se transforme em contra-ordenação grave, isto é: viola o artigo 53º da Constituição da República Portuguesa, viola o princípio do contraditório, viola o princípio do direito de defesa, desvaloriza o procedimento disciplinar, inviabiliza a suspensão judicial do despedimento, desprotege trabalhadores membros de estruturas de representação colectiva.
As normas sobre a cessação do contrato revestem-se de interesse e ordem pública social, sendo a segurança no emprego um princípio fundamental na ordem jurídica portuguesa, garantindo que o trabalhador não seja privado do seu emprego, através da proibição dos despedimentos sem justa causa.
O ordenamento jurídico contém regras que determinam que a cessação do contrato por iniciativa da entidade patronal seja precedida de um conjunto de formalidades destinadas, em regra, a dar prévio conhecimento ao trabalhador dos respectivos motivos e a possibilitar-lhe a sua defesa quando estes lhe sejam imputáveis.
A supressão da obrigatoriedade da instrução viola, assim, o princípio do contraditório, representando em si mesma um acto de desvalorização do procedimento disciplinar, num reforço visível dos poderes patronais - a parte mais forte da relação laboral - e viola o direito de defesa, acarretando, desde logo, consequências evidentes para o trabalhador: por um lado, inviabiliza a suspensão judicial do despedimento, uma vez que após a nota de culpa o trabalhador pode ser, antes decorrido o prazo legal, notificado imediatamente da decisão do procedimento disciplinar (em que não se defendeu!), por outro lado, o trabalhador pode ser imediata e liminarmente afastado do seu posto de trabalho.
Assim, a entidade patronal transforma o procedimento disciplinar num mero ritual farisaico para poder despedir mais rapidamente.
O PS manteve ainda a possibilidade de oposição à reintegração do trabalhador por parte da entidade patronal, norma que permite, na prática que um despedimento, depois de declarado ilícito por um tribunal, seja, afinal, confirmado, e o trabalhador privado do seu posto de trabalho.
Assim, esta norma permite exactamente o que o artigo 53º da Constituição visa proibir: que o trabalhador seja efectivamente despedido apesar da ilicitude do despedimento. E fá-lo em relação à generalidade dos trabalhadores, pois que se encontram maioritariamente empregados em microempresas.
Face a este cenário, o PCP propõe a alteração das normas que enfraquecem o direito de defesa dos trabalhadores, repondo a obrigatoriedade da instrução, eliminando a possibilidade de oposição à reintegração por parte da entidade patronal, determinando o montante de 30 a 45 dias de retribuição por cada ano completo ou fracção de antiguidade em caso de indemnização em substituição de reintegração a pedido do trabalhador, retoma-se a nulidade do procedimento disciplinar em caso de não cumprimento das suas formalidades, reforçando-se os direitos dos trabalhadores em matéria de procedimento disciplinar.
Assim, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projecto de Lei:
Artigo 1º
Alteração ao Anexo da Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho
Os artigos 352º, 353º, 356º, 357º, 381º, 382º, 387º, 389º e 391º da Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho, passam a ter a seguinte redacção:
«Artigo 352º
(...)
Caso o procedimento prévio de inquérito seja necessário para fundamentar a nota de culpa, o seu início suspende a contagem dos prazos estabelecidos nos n.ºs 1 ou 2 do artigo 329.º, desde que ocorra nos 30 dias seguintes à verificação de indícios fundamentados da existência de comportamentos irregulares, o procedimento seja conduzido de forma diligente e a nota de culpa seja notificada até 30 dias após a conclusão do mesmo.
Artigo 353º
(...)
1 - ...
2 - ...
3 - A notificação da nota de culpa ao trabalhador suspende a contagem dos prazos estabelecidos nos n.ºs 1 ou 2 do artigo 329.º.
4 - ...
Artigo 356º
(...)
1 - A entidade patronal, por si ou através de instrutor que tenha nomeado, procede às diligências probatórias requeridas na resposta à nota de culpa, a menos que as considere patentemente dilatórias ou impertinentes, devendo, nesse caso, alegá-lo fundamentadamente por escrito.
2 - A entidade patronal não é obrigada a proceder à audição de mais de 3 testemunhas por cada facto descrito na nota de culpa, nem mais de 10 no total, cabendo ao trabalhador assegurar a respectiva comparência para o efeito.
3 - Concluídas as diligências probatórias, o processo é apresentado, por cópia integral, à comissão de trabalhadores e, no caso de o trabalhador ser representante sindical, à associação sindical respectiva, que podem, no prazo de cinco dias úteis, fazer juntar ao processo o seu parecer fundamentado.
4 - Constitui contra-ordenação muito grave o despedimento do trabalhador com violação do disposto neste artigo.
Artigo 357.º
Decisão
1 - Decorrido o prazo referido no n.º 3 do artigo anterior, a entidade patronal dispõe de 30 dias para proferir a decisão, sob pena de caducidade do direito de aplicar a sanção.
2 - A decisão deve ser fundamentada e constar de documento escrito.
3 - Na decisão são ponderadas as circunstâncias do caso, a adequação do despedimento à culpabilidade do trabalhador, bem como os pareceres que tenham sido juntos nos termos do n.º 3 do artigo anterior, não podendo ser invocados factos não constantes da nota de culpa, nem referidos na defesa escrita do trabalhador, salvo se atenuarem ou diminuírem a responsabilidade.
4 - A decisão fundamentada é comunicada, por cópia ou transcrição, ao trabalhador e à comissão de trabalhadores, bem como, caso o trabalhador seja representante sindical, à associação sindical respectiva.
5 - Anterior n.º 7
6 - Constitui contra-ordenação muito grave o despedimento de trabalhador com violação do disposto neste artigo.
Artigo 381º
(...)
Sem prejuízo do disposto nos artigos seguintes, o despedimento por iniciativa da entidade patronal é ilícito:
a) ...
b) ...
c) Se não for precedido do respectivo procedimento, ou este for inválido;
d) ...
Artigo 382º
(...)
1 - ...
2 - ...:
a) Faltar a nota de culpa ou se esta não tiver sido elaborada nos termos do artigo 353º;
b) ...;
c) ...;
d) ...
Artigo 387º
(...)
1 - A ilicitude do despedimento só pode ser declarada por tribunal judicial em acção intentada pelo trabalhador.
2 - A acção de impugnação tem de ser intentada no prazo de um ano a contar da data do despedimento, excepto no caso de despedimento colectivo ou por extinção do posto de trabalho, em que a acção de impugnação tem de ser intentada no prazo de seis meses contados a partir da data em que cesse efectivamente a relação laboral.
3 -...
4 - Eliminar
Artigo 389º
(...)
1 - ...
•a) ...;
•b) Na reintegração do trabalhador, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade.
2 - Eliminar
3 - ...
Artigo 391º
(...)
1 - Em substituição da reintegração, o trabalhador pode optar por uma indemnização, até ao termo da discussão em audiência final de julgamento, cabendo ao tribunal determinar o seu montante, entre 30 e 45 dias de retribuição por cada ano completo ou fracção de antiguidade, atendendo ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381.º.
2 - ...
3 - A indemnização prevista no n.º 1 não pode ser inferior a três meses de retribuição.»
Artigo 2º
Norma revogatória
São revogados os artigos 388º e 392º do Anexo da Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprova a revisão do Código do Trabalho.
Artigo 3º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Assembleia da Republica, em 19 de Junho de 2009