Projecto de Lei N.º 542/XII/3.ª

Define as taxas de IVA de 6% aplicáveis ao consumo de eletricidade e de gás natural, assim como de gás butano e propano

Define as taxas de IVA de 6% aplicáveis ao consumo de eletricidade e de gás natural, assim como de gás butano e propano

Ao longo dos anos o PCP tem vindo a defender a necessidade de reduzir o custo final da energia elétrica e do gás em Portugal. Esta reivindicação assumiu maior relevo no seguimento dos processos de privatização, segmentação e liberalização do setor energético concretizados pelos sucessivos governos, do PS e do PSD, com ou sem o apoio explícito do CDS.

Se numa primeira fase a elevação do preço da energia, tanto elétrica como do gás natural, era apresentada como uma necessidade para atrair capitais e investidores para as anteriores empresas públicas, entretanto transformadas em gigantes monopólios privados pelos processos de privatização, logo os novos monopólios assumiram o poder económico suficiente para impor aos consumidores finais de energia os custos da acumulação de lucros em todas as fases da «nova» cadeia de valor. Assim nasceriam os défices tarifários associados a sucessivos e progressivos aumentos tarifários.

Ao longo de todo este período as famílias e as micro, pequenas e médias empresas, da indústria, do comércio e dos serviços, foram sendo confrontadas com a degradação das respetivas condições de vida e de competitividade resultantes de preços energéticos finais superiores aos praticados na maioria dos países da União Europeia (o espaço económico e social em que Portugal se insere) enquanto os salários e os rendimentos, por opção dos mesmos governos, se mantinham em níveis muito inferiores.

Em 2011, quando o Governo PS de então optou, em articulação com o PSD e o CDS-PP, por sujeitar os trabalhadores e as populações portuguesas à intervenção externa da troica (FMI, BCE e Comissão Europeia), as profundas contradições da política energética dos sucessivos governos ganharam novo relevo.

Se, por um lado, o excessivo preço final da energia impedia a competitividade a largos setores produtivos, nomeadamente aos setores ditos transacionáveis e exportadores, por outro, a tributação do consumo de energia apresentava-se como uma fonte de fácil acesso para gerar receitas públicas, ditas necessárias para reequilibrar o saldo orçamental do Estado.

Nesse sentido, com o acordo do PS, PSD e CDS-PP, o Programa de Assistência Económica e Financeira a Portugal, justamente apelidado de Pacto de Agressão aos trabalhadores e ao povo português, impunha um agravamento da taxa do IVA da eletricidade do gás natural, de 6% para 23%, enquanto, de forma hipócrita lançava promessas de preocupações com as sobre-rendas do setor energético, com especial relevo para o setor electroprodutor.

O paradoxo levou mesmo a que o então chefe da missão da troica em Portugal, Abebe Selassie, abordasse em entrevista à comunicação social nacional a questão dos preços da energia em Portugal, afirmando que uma das principais preocupações da Troica durante as avaliações do Memorando da Troica se prendia com o facto dos preços da energia elétrica e do gás natural em Portugal não terem sofrido desde Maio de 2011 uma contração, que a troica considerava desejável e possível, até por razões de equidade face às “dificuldades que o País atravessava”.

O mínimo que se pode dizer destas afirmações é que elas são absolutamente hipócritas. E são também completamente falaciosas, como é bem evidente e facilmente comprovável. De facto, como se poderia esperar que os preços da eletricidade e do gás natural pudessem ter diminuído em Portugal com a subida da taxa do IVA aplicável ao consumos destes bens essenciais?

Na realidade, no designado Memorando das Políticas Económicas e Financeiras, na parte B – Redução da dívida pública e do défice público, no ponto 7, pode ler-se que “do lado da receita, o enfoque está em aumentar o peso dos impostos sobre o consumo e em reduzir os benefícios fiscais”. Ficou assim determinado que “a partir de Janeiro de 2012, será introduzida uma tributação sobre a eletricidade”, tendo sido concretizada esta “disponibilidade” no Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica, no ponto 5.15, que previa “aumentar a taxa do IVA na eletricidade e no gás (atualmente é de 6%)”.

A parte mais significativa que justifica o aumento dos preços da eletricidade e do gás natural em Portugal, desde 2011, ficou a dever-se ao aumento da taxa do IVA que incidia sobre aqueles produtos, de 6% para 23%. Tal ocorreu a partir do início do último trimestre do ano de 2011 com a entrada em vigor da Lei n.º 51- A/2011, de 30 de Setembro, que por proposta do Governo PSD/CDS e aprovação da sua maioria parlamentar antecipou, em três meses, a subida da taxa do IVA sobre aqueles produtos, prevista no Memorando da Troica.

As consequências para as famílias e para as empresas deste brutal aumento da taxa do IVA, incidindo sobre produtos essenciais como são a eletricidade e o gás natural, são bem conhecidas.

Segundo o Eurostat, desde o início de 2011, o preço do gás natural para as famílias em Portugal, incluindo todos os impostos, aumentou 53%, enquanto na zona Euro aumentou 17,6%. Em relação aos consumidores industriais, o preço em Portugal aumentou 43,7%, enquanto na Área Euro ficou-se pelos 16,2%.

Em relação à eletricidade para as famílias, no mesmo período, o preço em Portugal aumentou 28,8%, enquanto na Área Euro aumentou 11,4%. Em relação aos consumidores industriais o preço da eletricidade em Portugal aumentou 33,3% e na Área Euro 10,5%.

Por outro lado, enquanto o preço médio do gás natural para consumidores domésticos, depois de impostos, antes da entrada da troica em Portugal, correspondia a 108,7% do preço médio na União Europeia, em meados de 2013, passou a corresponder a 128,7%. Na eletricidade, para os mesmos consumidores domésticos passou de 92,2% para 104,4%.

Hoje há milhares de famílias que já nem sequer conseguem pagar as contas mensais de luz ou de gás e a quem a EDP e outras empresas de distribuição de energia elétrica ou de gás natural interrompem os fornecimentos por falta de pagamento. É visível e crescentemente reconhecido que os preços industriais de fornecimento de energia elétrica e de gás natural às empresas em Portugal – em substancial resultado do aumento das taxas de IVA em treze pontos percentuais – é um fator de perda de competitividade real que representa um paradoxo concreto face às constantes afirmações de proclamações de uma estratégia exportadora para a economia portuguesa.

Os problemas sociais dramáticos que o aumento das taxas do IVA na energia tem provocado em Portugal, as consequências profundamente negativas desses mesmos aumentos na estrutura de custos e na competitividade de milhares de micro, pequenas e médias empresas em Portugal, podem e devem ser travados e revertidos.

Não é a primeira vez que o PCP toma a iniciativa de o fazer. Já em 16-11-2012, no contexto do Orçamento do Estado para 2013, este Grupo Parlamentar apresentou a proposta de alteração n.º 255-C, que visava alterar a Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o valor Acrescentado (CIVA), pretendendo repor a taxa de 6% aplicável aos consumos de eletricidade e de gás natural, infelizmente rejeitada pela maioria parlamentar. Há um ano, em março de 2013, o PCP apresentou o Projeto de Lei n.º 386/XII (2.ª) com os mesmos objetivos e resultado – foi rejeitado pelo PSD, CDS e pelo PS.

É altura de retomar esta proposta de fazer reverter a situação e contribuir para uma diminuição que pode ser significativa – em termos médios de cerca de 17% - dos preços da eletricidade e do gás natural, aliviando assim, de forma muito relevante, os encargos energéticos das famílias e a estrutura de custos das micro, pequenas e médias empresas em Portugal.

Face ao agravamento das condições de vida e do contexto económico e ao impacto da utilização de gás butano e propano em milhares de famílias e em muitas micro e pequenas empresas industriais e da restauração, o PCP recupera a proposta de redução da taxa de IVA para o gás butano e propano de 23% para os mesmos 6%, passando a integrar a Lista I anexa ao CIVA.

Assim, ao abrigo do disposto no Artigo 156.º da Constituição da República e do Artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º
Aditamento à Lista I anexa ao Código do IVA

A Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, aprovado pelo decreto-Lei n.º 394 – B/84, de 26 de Dezembro, é aditada com as verbas 2.12 e 2.16, com a seguinte redação:

[….];
2.12. Eletricidade e gás natural;
[…];
2.16. Gás butano e propano;
[…].

Artigo 2.º
Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado para 2015.

Assembleia da República, em 28 de Março de 2014

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