Projecto de Lei N.º 701/XII/4.ª

Define o regime de apoio à frequência dos estágios curriculares do ensino superior

Define o regime de apoio à frequência dos estágios curriculares do ensino superior

A desresponsabilização de sucessivos governos PS, PSD e CDS no financiamento público à educação tem tido como resultado a transferência dos custos de acesso (propinas) e frequência (alojamento, transporte, alimentação e material escolar) do ensino superior para os estudantes e para as famílias.
Esta é uma dimensão concreta da política em curso do desmantelamento das funções sociais do Estado, conforme consagrado na Constituição da República Portuguesa, profundamente agravada desde a subscrição do Pacto da Troika por PS, PSD e CDS.
Entre 2011 e 2014 o Governo PSD/CDS aplicou um corte no financiamento público no Ensino Superior de 141,2 milhões de euros, o que equivale a uma redução de 8%. Este corte tem tido consequências claras na degradação da qualidade do ensino e nas condições materiais e humanas das instituições.
A profunda limitação da atual Lei da Ação Social Escolar, os sucessivos cortes nos apoios diretos e indiretos da Ação Social Escolar (ASE), a ausência de políticas efetivas de apoio aos estudantes e de garantia da igualdade de oportunidades, a responsabilização das famílias pelo pagamento dos custos exorbitantes de acesso e frequência do ensino superior – propinas, transportes, alojamento, alimentação, livros e material escolar – tem conduzido ao abandono e elitização do acesso e frequência do ensino superior.
Há milhares de jovens que não se candidatam ao ensino superior por falta de condições económicas, e muitos outros enfrentam situações dramáticas para não abandonar os estudos. Cada vez mais estudantes são obrigados a trabalhar para pagar os custos do ensino, prejudicando a sua vida e percurso escolar.
Esta realidade é ainda agravada na situação em que o estudante tem obrigatoriamente de frequentar um estágio curricular para a conclusão do ciclo de estudos.
O estágio curricular visa a consolidação dos conhecimentos adquiridos e uma formação em contexto de trabalho. Em grande parte dos cursos de ensino superior ministrados, o estágio curricular é uma condição obrigatória para a conclusão da formação e para a consequente obtenção do grau académico.
No entanto, o regime de frequência dos estágios curriculares não tem tido consideração específica por parte do Estado e das Instituições de Ensino Superior.
Na verdade, as despesas decorrentes da frequência do estágio curricular têm sido suportadas pelos estudantes e suas famílias, nalguns casos confrontados com situações dramáticas de sobrevivência.
Ora, a proposta do PCP assegura que os apoios de frequência dos estágios curriculares devem ser atribuídos, independentemente de qualquer outro apoio, designadamente da ação social escolar.
Por existirem diversas tipologias de estágios no Ensino Superior, o presente Projeto de Lei distingue dois tipos de práticas:
- O estágio curricular, de carácter obrigatório para a obtenção de um grau académico;
- As práticas clínicas, períodos exigidos aos estudantes das áreas da saúde.
Assim, o PCP apresenta propostas para garantir a regulamentação das várias vertentes e configurações dos estágios curriculares existentes no âmbito das instituições de ensino superior, assumindo a importância fundamental de assegurar os apoios de alimentação, alojamento, transporte e material escolar aos estudantes enquanto instrumentos de efetivação de igualdade de oportunidades, cumprindo a Constituição da República Portuguesa.
Nestes termos e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo-assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º
Objeto e âmbito de aplicação
A presente lei tem por objeto a regulação dos estágios curriculares e aplica-se a todas as instituições do ensino superior.
Artigo 2.º
Âmbito Subjetivo
As disposições previstas na presente lei aplicam-se a todos os estudantes de licenciatura, mestrado e mestrado integrados e que frequentem Cursos de Especialização Tecnológica e Cursos Técnicos Superiores Profissionais.

Artigo 3.º
Definições

Para os efeitos previstos na presente lei, entende-se por:

a) “Estágio curricular”: o período de tempo em que um estudante do Ensino Superior desenvolve formação curricular em contexto de trabalho, no âmbito de uma entidade de acolhimento, acompanhada e avaliada pela instituição de ensino superior em que se encontra matriculado, quando tal seja condição para obtenção de diploma e certificado;

b) “Entidade de acolhimento”: a entidade, pública ou privada, que acolhe o estudante estagiário, acompanhando e orientando a formação curricular em contexto de trabalho.

Artigo 4.º
Responsabilidades das instituições de ensino superior e das instituições de acolhimento

É da responsabilidade das instituições de ensino superior quanto aos estágios curriculares:

a) Estabelecer protocolos com entidades de acolhimento e definir as condições de realização e acompanhamento do estágio curricular;

b) Assegurar a colocação dos estudantes nos estágios curriculares, cumprindo os protocolos estabelecidos com as entidades de acolhimento;

c) Garantir a adequação pedagógica dos conteúdos curriculares do estágio ao âmbito e objetivos do grau académico e da formação específica que o estudante frequenta.

Artigo 5.º
Âmbito dos estágios curriculares

1. Os estágios curriculares, independentemente da entidade de acolhimento em que se realizem, correspondem aos objetivos e conteúdos gerais de formação da licenciatura ou mestrado integrado em que os estudantes estão matriculados.

2. Consideram-se equiparados a estágios curriculares os períodos de prática clínica integrados na componente curricular das licenciaturas e mestrados integrados, de carácter obrigatório para a obtenção de grau académico, mesmo que realizados no seio da instituição de ensino superior em que o estudante se encontre matriculado.

3. Os estágios curriculares são considerados, para todos os efeitos, como tempos letivos efetivos.

Artigo 6.º
Apoio aos estudantes

1. O Estado garante a todos os estudantes apoio financeiro específico para o suporte das despesas de transporte, alimentação e, sempre que necessário, alojamento, durante o período correspondente à duração e frequência do estágio curricular.

2. O Estado garante, através das instituições do ensino superior, a gratuitidade dos materiais e equipamentos necessários para a frequência e conclusão dos estágios curriculares, no período correspondente à sua duração.

3. Os apoios referidos no n.º1 são atribuídos a todos os estudantes, sem prejuízo da atribuição de quaisquer prestações sociais.

4. No âmbito do ensino particular, cooperativo e concordatário, os apoios previstos nos números anteriores são da responsabilidade das respetivas instituições de ensino superior.

Artigo 7.º
Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação, produzindo efeitos no início do ano letivo seguinte e devendo ser regulamentada no prazo de 30 dias após a respetiva publicação.

Assembleia da República, em 12 de dezembro de 2014

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