Exposição de Motivos
Com a aplicação do pacto de agressão, no orçamento de Estado para 2013 o Governo alterou o regime de IVA para os pequenos agricultores, eliminando a isenção de IVA nas transações e na prestação de serviços agrícolas, medida que fez parte do aumento brutal de impostos. Diz o Governo que as alterações fiscais na agricultura se deveram ao facto de o Tribunal Europeu de Justiça ter condenado o Estado Português pela aplicação que fazia do regime de IVA a este setor. Decisão do tribunal europeu que o Governo aproveitou para implementar as suas intenções, uma vez que, como faz com outros processos, não contestou esta decisão, nem desenvolveu junto da Comissão Europeia um processo de alteração ao regime que permitisse um tratamento diferenciado para a pequena agricultura. Teria sido uma boa maneira de assinalar o Ano Internacional da Agricultura Familiar que a ONU instituiu para 2014.
Este foi um regime que o Governo teve dificuldade em aplicar e isso é denotado pelos três adiamentos à sua entrada em vigor, face à gigantesca onda de protestos que motivou dos mais variados sectores, designadamente das associações representativas da pequena e média agricultura. As alterações efetuadas no regime de IVA, correspondendo ao objetivo da política de direita de favorecer o grande agro-negócio e concentrar a propriedade fundiária, aprofundam a tendência portuguesa para a redução do número de explorações e de trabalhadores na agricultura. Com este processo foram mais 15 000 os agricultores que deixaram de apresentar candidaturas para apoios.
O Governo pretende instituir para o próximo ano, e isso foi já aprovado em sede de Orçamento do Estado para 2015, o regime forfetário, a que o Tribunal Europeu de Justiça também faz referência na sua condenação. Este regime, permitindo a devolução do IVA aos pequenos agricultores que o desejem, comprova a inutilidade da obrigatoriedade de inscrição nas finanças, uma vez que bastava que os agricultores que o desejassem se inscrevessem, mas não elimina essa obrigatoriedade, com a necessidade de apresentação das declarações, sendo que uma parte considerável dos agricultores precisará de apoio para a sua elaboração e submissão. Ao que acresce o facto de a inscrição nas finanças implicar a obrigatoriedade de inscrição e pagamento de contribuição para a Segurança Social. Tudo isto somado aos cada vez mais reduzidos preços pagos à produção, tem fortes implicações na rentabilidade das explorações. Os regimes de exceção para pagamento da segurança social não são uma resposta ao problema. Isentar um agricultor que tenha de rendimento da sua atividade até 139€ mensais não é solução para o problema. Com este regime, qualquer agricultor com um rendimento se 140€ mensais ou superior, terá de pagar a contribuição mínima de 117€ mensais. Isto é, a sua atividade pouco mais dará do que para pagar contribuições.
Este é o Ano Internacional da Agricultura Familiar. Este tipo de agricultura tem um papel fundamental na produção de bens alimentares de qualidade e de proximidade. Para além de dar um contributo efetivo para a fixação de pessoas nos territórios, nomeadamente no interior do país. As pequenas explorações continuam a ter uma importância significativa: 77% das explorações tem menos de 5 ha, das quais 22% tem menos de 1 ha. A média etária da população agrícola é de 62 anos. Estas características determinam a necessidade de proteção à pequena agricultura e não o seu ataque. O papel do Governo deveria ser o de afirmação das características e da importância da pequena agricultura e de imposição, em Bruxelas, do respeito por estes agricultores.
O Grupo Parlamentar do PCP defende a pequena agricultura e a agricultura familiar e por isso entende que o regime de isenção de IVA deve ser reposto, a par de outras medidas que deverão ser tomadas.
Assim, nos termos legais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Objeto
1. É objeto da presente lei a criação de medidas fiscais de apoio aos pequenos agricultores e à agricultura familiar portuguesa.
2. Para atingir o objeto definido no ponto anterior, a presente lei:
a) Altera o Código do Imposto Sobre o Valor acrescentado.
b) Prevê a adoção pelo Governo de um conjunto de medidas, legislativas, administrativas ou regulamentares.
Artigo 2º
Alteração ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado
O artigo 9.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de dezembro, abreviadamente designado por Código do IVA, passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 9.º
[…]
[…]:
1) […];
2) […];
3) […];
4) […];
5) […];
6) […];
7) […];
8) […];
9) […];
10) […];
11) […];
12) […];
13) […];
14) […];
15) […];
16) […];
17) […];
18) […];
19) […];
20) […];
21) […];
22) […];
23) […];
24) […];
25) […];
26) […];
27) […];
28) […];
29) […];
30) […];
31) […];
32) […];
33) As transmissões de bens efetuadas no âmbito das explorações enunciadas no anexo A ao presente Código, bem como as prestações de serviços agrícolas definidas no anexo B, quando efetuadas com carácter acessório por um produtor agrícola que utiliza o equipamento normal da respetiva exploração agrícola e silvícola;
34) […];
35) […];
36) […];
37) […].»
Artigo 3º
Norma Revogatória no âmbito do IVA
É revogado o n.º 2 do artigo 199.º da Lei n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, que revoga os anexos A e B ao Código do IVA, repristinando-os.
Artigo 4º
Medidas legislativas, administrativas ou regulamentares
a) Fica o Governo obrigado a, no prazo de 90 dias, adotar as medidas legislativas, administrativas ou regulamentares necessárias a:Eliminar a obrigatoriedade do registo de atividade para os pequenos e médios agricultores, com menos de € 10 000 de volume anual de negócios.
b) Eliminar a obrigatoriedade de faturação das transações dos pequenos e médios agricultores, com menos de € 10 000 de volume anual de negócios, nos mercados agrícolas locais;
c) Eliminar a obrigatoriedade de faturação imediata nas entregas de produção dos membros das cooperativas agrícolas às respetivas cooperativas, assim como nos casos em que a entrega das produções a entidades que transformam e embalam produtos agrícolas não coincide com a definição do respetivo preço independentemente cumprimento das normas que obrigam à fixação do preço do acto da venda.
Artigo 5º
Entrada em vigor
1. Os artigos 1º e 2º da presente lei entram em vigor com a publicação da Lei do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.
2. O artigo 3º da presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.
Assembleia da República, em 5 de dezembro de 2014