Exposição de motivos
A falta de professores e educadores na Escola Pública tem vindo a ser sinalizada e vivida de uma forma particularmente preocupante em determinados grupos de recrutamento de docentes. Já são muitos os anos que o PCP tem alertado para este problema. Em maio do presente ano, de acordo com os números disponibilizados pelo atual Governo, eram 22 116 alunos sem aulas a uma disciplina e, destes, 939 estavam nessa situação desde setembro, terminando o ano letivo sem professor.
As medidas avulsas tomadas pelo anterior Governo, tal como a alteração do regime de mobilidade por doença, e a negação da mobilidade de estatutária de muitos professores que estavam destacados em vários organismos, ou seja, professores no IEFP, a “professores de educação física que presidem a federações nacionais, como são os casos do Atletismo ou da Patinagem, passando, por estabelecimentos de ensino, incluindo instituições de ensino superior que formam professores, o colégio militar ou hospitais pediátricos, ou centros Ciência Viva”, não só não resolveram o problema que hoje se conhece, como coloca em risco o normal funcionamento de alguns daquelas organizações ou entidades.
Apesar do número de vinculações ter crescido mais do que o número de aposentações, tal não se traduziu num aumento do número de docentes, porque os que vincularam já se encontravam na escola, embora em regime de contratação a termo. Além disso, pesam ainda duas questões: em primeiro lugar, mesmo havendo um aumento no número de docentes dos quadros, com o envelhecimento aumenta também o número dos que já estavam e continuam nos quadros, mas estarão em situação de doença, como se comprava com os números da mobilidade por doença; em segundo lugar, o número de aposentações tem vindo a crescer, com ritmo acelerado a partir de 2019. A previsão é que o número aumente de ano para ano e que, até final da década, saiam mais de metade dos atuais professores. Previsivelmente serão cerca de 458 os professores que se aposentarão só em setembro. Ao mesmo tempo, formam-se apenas 997 alunos por ano em educação básica.
A carência de professores e educadores é um problema para o qual contribuem múltiplos fatores, relacionados, designadamente, com formação inicial, acesso à profissão e valorização da carreira, num quadro de necessidade de criação de condições de atratividade para a profissão docente. Nos últimos 6 anos abandonaram a profissão cerca de 14 500 professores, e a realidade é que não se tomaram quaisquer medidas para que estes docentes voltassem à carreira.
A contratação de escola dificilmente será a solução para este problema se não existem professores ou se os poucos disponíveis não aceitarem horários a que correspondem salários inferiores às despesas de deslocação e fixação fora da área de residência familiar. A contratação de docentes sem habilitação própria também não é resposta a este problema, podendo pôr em causa todo o processo de ensino aprendizagem.
Neste momento estão por colocar cerca de 15 000 professores, contudo destes 71% correspondem a docentes com habilitação para 5 dos cerca de 30 grupos de recrutamento que existem (educação pré-escolar, 1.º ciclo do ensino básico, educação física do ensino básico e secundário e educação especial). Assim, 29% dos professores correspondem aos restantes grupos de recrutamento, o que significa que em muitos dos grupos o número de professores por colocar serão insuficientes face às necessidades das escolas.
O Governo atual apresentou um conjunto de medidas avulsas, que não resolvem nenhum dos problemas estruturais, e que podem aprofundar mais as desigualdades e injustiças. Desde logo, o aumento do número de horas extraordinárias levará à sobrecarga horária, e não tem em conta que a maioria dos docentes já tem um horário de cerca de 50 horas semanais. O apoio à deslocação, a forma como está a ser apresentado, além de insuficiente levará a arbitrariedades pois não será aplicado a todos os docentes deslocados, mas apenas àqueles que sejam colocados em escolas consideradas carenciadas.
O PCP reafirma que há questões de fundo que apenas serão superadas por via da valorização da profissão docente e da alteração do Regime de Seleção e Recrutamento do Pessoal Docente da Educação Pré-Escolar e Ensinos Básico e Secundário. Pela efetiva valorização salarial, vinculação de todos os docentes com 3 ou mais anos de tempo de serviço, pela eliminação das quotas de avaliação e das vagas para acesso ao 5.º e 7.º escalão, pelo respeito pelo horário trabalho de 35 horas que inclui componente letiva e não letiva.
No entanto, podem e devem ser tomadas medidas concretas, no imediato, tal como a criação de incentivos para a deslocação e fixação de docentes em áreas carenciadas.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei define a atribuição de um complemento de alojamento e de deslocação a todos os docentes e técnicos especializados deslocados cuja escola de provimento seja em estabelecimento público de educação e ensino.
Artigo 2.º
Complemento de alojamento
A todos os docentes contratados e técnicos especializados deslocados cuja escola de provimento esteja localizada a uma distância igual ou superior a 50 km da residência habitual é atribuído um complemento mensal de alojamento até ao limite de 700€, comprovado por recibo, comprovativo de transferência bancária ou declaração do senhorio do pagamento do encargo.
Artigo 3.º
Complemento de deslocação
A todos os docentes contratados e técnicos especializados deslocados cuja escola de provimento esteja localizada a uma distância igual ou superior a 50 km da residência habitual é atribuído um complemento de deslocação, efetuado com recurso ao reembolso, de acordo com o previsto na Portaria n.º 1553-D/2008, de 31 de dezembro, na redação atual:
- Do valor das passagens, no caso da utilização de transportes coletivos, ou
- Do valor do número de quilómetros percorridos, no caso da utilização de viatura própria.
Artigo 4.º
Entrada em vigor e produção de efeitos
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeitos financeiros com o Orçamento do Estado subsequente.