Destinatário: Ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social
Enfrentamos um momento de grande complexidade e incerteza que exige que tudo seja feito para combater o COVID 19, minimizando os seus impactos na saúde e na vida dos portugueses. A situação que o país e o Mundo atravessam, com medidas excecionais para situações excecionais, não poderá justificar práticas, no sector social, de atropelo dos direitos dos trabalhadores que exercem as suas funções nas diversas valências das instituições abrangidas por Acordos de Cooperação, nem tão pouco nas que são responsabilidade do sector privado lucrativo.
Este período excecional não pode servir de argumento para suspender os direitos daqueles que, durante esta fase, têm garantido as respostas sociais nas diversas valências. Não é aceitável que sejam os trabalhadores a pagar os custos desta situação de exceção, como o têm denunciado os sindicatos filiados na CGTP-IN que representam os trabalhadores do setor.
No passado dia 27 de março, o PCP dirigiu uma Pergunta ao Governo relativa à Rede de Equipamentos e Serviços Socias. Nessa pergunta o PCP apresentou, ao Governo, um conjunto de preocupações relativamente aos problemas e exigências que estão colocadas às instituições de solidariedade social que têm de ser equacionadas e supridas, sem atropelos aos direitos dos trabalhadores deste sector.
Não é aceitável que as exigências que estão colocadas às entidades que intervêm no sector social sejam supridas com a violação dos direitos destes trabalhadores, nem tão pouco que as instituições de solidariedade social e o governo aceitem tais violações permitindo e fomentando a “lei da selva”, como está a acontecer por parte do patronato em múltiplas empresas.
Na pergunta que endereçamos ao Governo são colocadas várias matérias relativamente à Rede de Equipamentos e Serviços que devem exigir deste medidas excecionais, designadamente em matéria de salvaguarda dos direitos dos trabalhadores.
Já basta o vírus. Os direitos não estão de quarentena, suspensos ou liquidados. O exemplo de atropelos no setor são vários, nomeadamente:
A imposição de horários de trabalho de 10 e 12 horas, durante 7 ou 14 dias consecutivos;
Regimes internato, de 7 ou 14 dias consecutivos sem que os trabalhadores possam sair das instituições, pretendendo privá-los da sua liberdade e do direito a estar com as suas famílias;
Imposição unilateral do gozo de férias;
Aplicação do regime de lay off, sem que estejam cumpridos os seus requisitos.
O período que vivemos, o estado de emergência decretado, não suspende nem limita a aplicação da legislação laboral, nem tão pouco da contratação coletiva do setor.
Para mais, o Governo determinou, no Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, a suspensão das atividades letivas e não letivas no ensino público, particular e cooperativo e do setor social de educação pré-escolar, básica, secundária e superior e em equipamentos sociais de apoio à primeira infância ou deficiência.
Muitas das respostas que existem atualmente em edução pré-escolar e no apoio à primeira infância são asseguradas por Instituições Particulares de Solidariedade Social, em paralelo com outras valências, nomeadamente o apoio a idosos, quer em lar, quer em centro de dia ou através do apoio e serviço domiciliários.
O PCP teve conhecimento que diversas IPSS’s, possuindo várias valências e devido ao encerramento obrigatório das valências de pré-escolar e de apoio à infância, exigem aos seus trabalhadores que assegurem e reforcem o funcionamento das outras valências, como sejam os lares ou apoio domiciliário. Quando confrontadas pelos trabalhadores ou pelas suas organizações representativas, muitas instituições alegam que o fazem em conformidade com orientação e diretiva advindas da Segurança Social.
As categorias profissionais e respetivos descritivos funcionais dos trabalhadores não são uma simples e mera categorização interna dos empregadores, são no essencial o elemento delimitador das funções para o exercício das quais o trabalhador foi contratado, e circunscreve as funções que podem ser exigidas ao trabalhador pela sua entidade patronal ou por quem a represente. Para mais as valências asseguradas pelas IPSS’s são valências específicas, com características muito distintas entre si e para as quais a formação profissional exigida e necessária é, também ela, bastante diversa. Ainda que não bastasse a impossibilidade legal e convencional de os trabalhadores não poderem exercer tarefas e funções para além daquelas contratualmente definidas, também a formação profissional de que o trabalhador dispõe não se poderá adequar a qualquer outra valência proporcionada por uma IPSS, com os riscos que isso acarreta, quer para o trabalhador, quer para os utentes das próprias valências.
A ser verdade, não se compreende a existência de orientações, por parte da Segurança Social, para que as IPSS violem o disposto na legislação laboral e na contratação coletiva e obriguem os trabalhadores das valências de pré-escolar e de apoio à infância a exercer funções que não lhes correspondem, seja na área dos serviços gerais ou nas valências de apoio a idosos, nomeadamente nas Estruturas Residenciais para Idosos (ERPI) e no apoio domiciliário, função para a qual a maioria não possui formação adequada.
Assim, ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais em vigor, solicitamos ao Governo que, através do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, nos sejam prestados os seguintes esclarecimentos:
- Tem o Governo conhecimento das situações acima descritas de desrespeito pelos direitos dos trabalhadores?
- Tem conhecimento de alguma ação inspetiva da Autoridade para as Condições de Trabalho? Se sim, quais as conclusões?
- Tem o Governo conhecimento das orientações da Segurança Social no sentido alegado pelas instituições?
- Considera que, a existirem, ditas orientações respeitam os direitos dos trabalhadores em causa, nomeadamente a sua categoria e descritivo funcional?
- Sabendo que que existe um número mínimo de trabalhadores no quadro de pessoal para garantir o funcionamento das respostas sociais, designadamente em lares de idosos, que medidas estão a ser equacionadas para reforço dos meios humanos?
- Que medidas e soluções tem o Governo para responder à necessidade urgente de trabalhadores do setor social que possam substituir trabalhadores que, por força de terem sido infetados, deixaram de prestar serviços sociais nas suas instituições?
- Como pensa o Governo corrigir a falta de meios adequados (como máscaras, luvas e líquido desinfetante) para proteger trabalhadores e utentes dos estabelecimentos e equipamentos sociais?
- Que medidas vai tomar o Governo para assegurar o cumprimento dos direitos dos trabalhadores?