Apreciação Parlamentar N.º 31/XIV/2.ª

Decreto-Lei n.º 55/2020, de 12 de Agosto - «Concretiza a transferência de competências para os órgãos municipais e para as entidades intermunicipais no domínio da acção social»

(Publicado no Diário da República, 1.ª série — N.º 156 — 12 de agosto de 2020)

Exposição de Motivos

Foi publicado o Decreto-Lei n.º 55/2020, de 12 de agosto que “Concretiza a transferência de competências para os órgãos municipais e para as entidades intermunicipais no domínio da ação social”. Este diploma decorre da Lei n.º 50/2018, de 16 de agosto, que determina o quadro de transferência de competências para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais, desrespeitando os prazos nela previstos.

Este diploma determina que as autarquias passam a assumir competências na área da ação social, nomeadamente na garantia do serviço de atendimento e de acompanhamento social, na elaboração das cartas sociais municipais, na implementação de atividades de animação e apoio à família para as crianças que frequentam a educação pré-escolar, na elaboração de relatórios de diagnóstico técnicos e acompanhamento e de atribuição de prestações pecuniárias em situações de carência económica e risco social, no acompanhamento dos contratos de inserção dos beneficiários do rendimento social de inserção, no desenvolvimento de programas nas áreas de conforto habitacional para pessoas idosas, na coordenação da execução de programas de contratos locais de desenvolvimento social e na emissão de parecer, vinculativo quando desfavorável sobre a criação de serviços e equipamentos sociais com apoios públicos.

Para além de não estarem garantidas as condições no plano financeiro e de recursos humanos para a execução destas competências, a transferência das competências na área da ação social contribui para o desmantelamento da Segurança Social.

Pretender que sejam os municípios a realizar o atendimento e acompanhamento social, a atribuir prestações pecuniárias para as pessoas com maior carência económica e a acompanhar os beneficiários do rendimento social de inserção é profundamente errado. Por um lado trata os municípios como se fossem um serviço desconcentrado da administração central, desrespeitando a sua autonomia, por outro lado coloca a resposta pública em situações de grande vulnerabilidade económica e social em função da capacidade de cada autarquia, o que pode aprofundar desigualdades já existentes quando a solução tem de ser universal e contribuir para a superação da situação de pobreza e não assentar em respostas assistencialistas e caritativas.

O diploma em apreço procura também colocar sobre as autarquias, respostas que são necessárias, mas que os governos ao longo de décadas foram-se descartando das suas responsabilidades, como a implementação de atividade de animação e de apoio às famílias.

São ainda transferidas competências da Administração Central diretamente para as entidades intermunicipais, que não são autarquias, nem integram a organização administrativa do Estado, o que discordamos totalmente.

Portanto, está-se perante uma inaceitável desresponsabilização do Governo e não um processo de descentralização, antes de transferência de encargos para as autarquias.

Um processo de descentralização não se resume à transferência de competências entre a Administração Central e Local e deve observar a organização administrativa do Estado como um todo e não de forma parcelar.

Um processo de descentralização implica a preservação da autonomia administrativa, financeira, patrimonial, normativa e organizativa interna das autarquias locais; a garantia de acesso universal aos bens e serviços públicos necessários à efetivação de direitos constitucionais e a universalização de funções sociais do Estado; a coesão nacional, eficiência e eficácia da gestão pública; a unidade do Estado na repartição legal de atribuições entre as entidades públicas e administrativas e a adequação do seu exercício aos níveis de administração central, regional e local; a clareza na delimitação de responsabilidades; a adequação dos meios às necessidades; e a estabilidade de financiamento no exercício das atribuições que lhes estão cometidas.

Um processo de descentralização implica o poder de execução, mas implica igualmente o poder de decisão, planeamento, programação, e quando aplicáveis, de fiscalização e demais de natureza similar necessários à concretização da atribuição, bem assim dos bens públicos, móveis ou imóveis, e demais meios que lhes estejam afetos.

Nestes termos, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP, ao abrigo da alínea c) do artigo 162.º e do artigo 169.º da Constituição e ainda dos artigos 189.º e seguintes do Regimento da Assembleia da República, requerem a Apreciação Parlamentar do Decreto-Lei n.º 55/2020, de 12 de agosto, que “Concretiza a transferência de competências para os órgãos municipais e para as entidades intermunicipais no domínio da ação social”, publicado no Diário da República, 1.ª série — N.º 156 — 12 de agosto de 2020.

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