Intervenção de

Declaração Política sobre a eleição de deputados ao Parlamento Europeu<br />Intervenção de Bernardino Soares

Senhor Presidente, Senhores Deputados, As eleições do passado domingo tiveram como resultado principal a derrota estrondosa da coligação PSD-CDS, do seu Governo e da sua política. E sendo certo que foram eleições para, a verdade é que não é apenas nessa eleição que se traduz a derrota da direita. O que foi derrotado no domingo foi a política do governo, foi a política anti-social, contra o desenvolvimento e o progresso que tem sido praticada. Foi a política de direita. A direita pode inventar argumentos, pode tentar desvalorizar os resultados com o nível da abstenção, com os acontecimentos dramáticos e a interrupção da campanha ou com qualquer outro argumento de última hora, mas não conseguirá apagar a rejeição esmagadora que a sua política recebeu dos portugueses. Nem vale a pena iludir os portugueses com o estafado discurso do momento difícil, das medidas supostamente necessárias que os portugueses que as sofrem na pele teriam de aceitar, como um sacrifício em prol de um bem vindouro. Os portugueses já perceberam que os sacrifícios não são para todos, que a riqueza está cada vez mais nas mãos de poucos e a pobreza cada vez mais espalhada pelo país. Os portugueses já perceberam que esta política afunda o país e compromete o seu futuro. Se duvidas houvesse bastaria registar a afirmação proferida ontem por um destacado membro da maioria que afirmou que os resultados eleitorais demonstraram que “à data de hoje não estão respondidos os principais problemas dos portugueses”. Foi “apenas” o Ministro Morais Sarmento que o disse. Ele sabe do que fala e certamente não será contrariado por nenhum dos membros da bancada da maioria. A expressão da derrota da coligação de direita está bem patente no facto de só ter conseguido angariar 34% dos votos contra 60% do conjunto dos partidos da oposição. Ainda por cima esta derrota tem agravantes. É que ao contrário do que é costume na nossa história eleitoral, em que as coligações de forças políticas diversas têm normalmente um efeito agregador superior aos votos iniciais, o que aliás se verificou com a anterior AD, esta coligação em vez de agregar desagregou, teve menos votos que os partidos que a constituem. Por outro lado revelou-se infrutífera a politicamente escandalosa tentativa de colagem à simpatia dos portugueses com a selecção nacional de futebol que a campanha da Força Portugal procurou instrumentalizar. Os portugueses não são parvos e não se deixaram enganar pela manobra de propaganda ensaiada. Quando muito o que aconteceu é que tanta colagem à imagem da selecção acabou por transmitir a energia negativa da coligação à selecção de todos nós, que felizmente já se libertou de tão aziaga influência. Nestas eleições a CDU obteve um resultado positivo embora aquém do desejado, sobretudo tendo em conta o valioso e reconhecido papel da CDU e dos eleitos do PCP no Parlamento Europeu em defesa dos interesses nacionais e o seu insubstituível papel na oposição a este Governo. Nestas eleições a CDU ajudou a derrotar a direita. Mas também derrotou claramente as sucessivas sondagens e estudos, palpites e análises de comentadores e analistas que pressurosamente se apressavam a anunciar a derrocada que não existiu a não ser nos desejos de alguns. Por isso dizemos sem arrogância que este resultado cria boas condições para o futuro, para que continuemos a nossa luta para dar mais esquerda à esquerda, mais força ao combate ao Governo, mais vigor à exigência de uma nova política de que o país precisa e que está muito para além da política de alternância que nos tem governado. Estas eleições ficaram também marcados por um elevado nível de abstenção, que não serve para desvalorizar os resultados mas não pode deixar de constituir um factor de preocupação. Após as eleições os portugueses esperam que os seus resultados tenham consequências. Que a vontade que expressaram altere alguma coisa. Os portugueses ouviram o primeiro-ministro dizer que ouviu o recado mas vai manter as linhas essenciais da sua política. O governo não vai mudar a política. Pode mudar de cosmética, pode mudar de discurso, pode até mudar algumas caras mas não mudará o sentido de uma governação que arrasta o país para a crise e os trabalhadores para o desemprego, que aumenta a desigualdade e a pobreza. Por isso não nos conformamos com a suposta inevitabilidade do decurso sem sobressaltos de mais dois anos de Governo PSD/CDS, que seriam mais dois anos de uma política contra os interesses dos portugueses e do país. Pela nossa parte não queremos dar esse seguro de vida ao Governo. Sabemos que outros aceitam como inevitável o mero curso do calendário da legislatura, mas pensamos que isso não dá resposta à inequívoca mensagem das ultimas eleições. Não estamos cá para um mero cumprir de calendário. Por isso consideramos indispensável lutar pela criação de condições políticas e institucionais para pôr fim, o mais breve possível, a esta política e a este Governo e para que os portugueses possam pronunciar-se por uma solução política alternativa. É uma questão de atitude e uma questão de objectivo. Entretanto, ainda o rescaldo dos resultados eleitorais não está completamente feito e já os governos da União Europeia, largamente derrotados nestas eleições, incluindo o Governo de Durão Barroso, se preparam para aprovar um novo tratado da União, a coberto de um falso estatuto de constituição, procurando acentuar o caminho da consagração do neoliberalismo, da militarização e do federalismo. Entre nós o Governo leva já no alforge a pré aceitação da dita constituição feita com a última revisão constitucional, entre PSD, PS e CDS. Na véspera de tais compromissos mais se acentua a exigência de um referendo sobre a vinculação de Portugal ao novo tratado. Um verdadeiro referendo, que permite ao povo português pronunciar-se de facto e com consequências reais, sobre este novo e perigoso passo que nos pretendem impor. A maioria derrotada é a maioria do aumento do desemprego; é a maioria dos baixos salários; é a maioria do pacote laboral; é a maioria do envolvimento de Portugal na guerra; é a maioria da manutenção da penalização das mulheres que abortam, do seu tratamento como criminosas, graças à qual novamente mulheres estão a ser julgadas, agora em Setúbal. Foi esta maioria e este Governo que o povo derrotou nas urnas aproximando-se assim do momento da sua derrota definitiva. O povo português contará com o PCP, com a sua oposição firme em todos os campos da intervenção política, com a sua iniciativa na busca de soluções para os problemas do país, com a sua luta para pôr fim a este Governo e a esta política o mais brevemente possível. Disse.  

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