Sr. Presidente Srs. Deputados
Como esta sessão vai decorrer sob o signo dos «resíduos», algumas palavras, não sobre a co-incineração dos resíduos industriais perigosos, mas sobre outros «resíduos» que continuam, perigosamente, a corroer a democracia portuguesa. Estão desde ontem presentes nesta Assembleia da República trabalhadores da Grundig despedidos em 1997. A sua situação foi aqui trazida pelo PCP em 16 de Março último. O escândalo continua. Há necessariamente uma resposta do Tribunal do Trabalho, que tarda, talvez porque um segundo estudo económico, da responsabilidade da Universidade do Minho, confirma um primeiro e nega os argumentos para o despedimento. Mas o problema não pode ser «chutado para o lado», com um lavar de mãos, como fez, recentemente, o senhor secretário de Estado do Emprego, na Comissão Parlamentar do Emprego, afirmando ser esta uma questão dos tribunais. Dois ministros do anterior governo PS, um governador civil nomeado por esse governo, um presidente de Câmara PS «facilitaram», «ajudaram» a administração da Grundig a despedir. Grande parte dos trabalhadores, sendo embora qualificados, têm mais de 45 anos, e logo «deficitários» em empregabilidade. O subsídio de desemprego acabou ou está a acabar. Não podem receber as indemnizações. E o Governo não pode fazer nada?! Nem sequer, senhores deputados, prorrogar excepcionalmente os subsídios de desemprego? Ou espera-se que os trabalhadores levantem as indemnizações e desistam da justiça a que têm direito? Querem, como diz um trabalhador, «obrigar-nos pela fome a sermos injustiçados»?
Se o Governo depressa esqueceu as promessas feitas, se as preocupações do Governo Civil e da Câmara Municipal foram sol de pouca dura, se a Assembleia não os ouve, para que querem os senhores deputados que os trabalhadores votem?
Não é preciso alterar a lei eleitoral, senhores deputados. Os trabalhadores conhecem os deputados que elegeram no distrito de Braga. O que não percebem é a utilidade dessa eleição!
Sr. Presidente Srs. Deputados
Mas a minha declaração política prende-se com os «resíduos» que atingem os agricultores e a agricultura. Também aqui os continuados e graves problemas, a desinformação, a insegurança e o desespero de tantos produtores agrícolas, não são bons para a democracia portuguesa.
[Durante anos, com uma política de concentração da produção leiteira e liquidação acelerada dos pequenos produtores, incentivaram-se alguns a fazer vultuosos investimentos, aumentando produtividades e produções. Ainda há pouco mais de um ano falavam-lhes dos riscos da perda da quota leiteira nacional por não se produzir o suficiente]. Feito o negócio da Agenda 2000/Acordo de Berlim, em Março/Abril do ano passado, descobre agora o país agrícola, com estupefacção, que há quase a certeza de uma ultrapassagem da quota, entre 60 a 100 mil toneladas na campanha de 1999/2000. Logo, uma provável forte penalização dos produtores.
[No distrito de Vila Real, só um agrupamento de 51 produtores apresenta um excesso de 1 milhão de litros, o que pode significar uma penalização média por produtor superior a mil contos!]
Os mesmos que ontem lhes diziam para produzir mais, hoje procuram responsabilizá-los por essa situação. Os mesmos que cantaram vitória em Berlim, onde espanhóis e italianos viram substancialmente reforçadas as suas quotas.
Em 1996, e ainda com o anterior ministro da Agricultura, foi reformada a Organização Comum de Mercado (OCM) das hortofrutícolas. Afirmou então o Governo a importante vitória obtida, em particular por causa dos resultados com a quota do tomate para a indústria. Criticou como infundadas as dúvidas levantadas pelo PCP. Produtores e industriais de tomate descobrem agora que, à redução de 7,3% da quota na presente campanha, se pode acrescentar uma perda de 10% em 2001. Perdas para benefício de outros países produtores, como a Espanha.
[A propósito de Berlim, foi dito então pelo senhor primeiro-ministro que a bola estava a pinchar na grande área quando Portugal rematou, no momento certo, marcando o golo. Ilusão senhores deputados, pelos vistos foi um golo na própria baliza!]
Sr. Presidente Srs. Deputados
É uma evidência o desajuste, a desadequação da PAC, face aos problemas e necessidades da agricultura portuguesa.
É incompreensível e inaceitável a fixação das quotas, quantidades e áreas de referência, não em função das potencialidades e necessidades do País, mas através de médias históricas de produções ou das áreas tradicionais de culturas, amarrando assim a agricultura e o País ao seu próprio atraso, «congelando» a necessária evolução tecnológica e produtiva. A balança comercial continua a afundar-se e nós não podemos produzir, para importar o que os outros produzem.
Mas há outro desajustamento. O de uma política agrícola que, pelos vistos, não recolhe nem sistematiza informação, não intervém informando com rigor os produtores, não procura condicionar e limitar atempadamente as consequências negativas decorrentes das regras da PAC. E, fundamentalmente, não se opõe a esta PAC.
Sr. Presidente Srs. Deputados
A Presidência Portuguesa da União Europeia está prestes a entrar no seu último mês. Sabe-se que, da Cimeira do Emprego, decorreram para o País orientações da Comissão para precarizar ainda mais o emprego e facilitar o despedimento. Soube-se, recentemente, que o ministro Jaime Gama ficou satisfeitíssimo e felicitou o homólogo alemão pelo seu projecto federal para a União Europeia. O que se desconhece é o que a Presidência Portuguesa fez ou vai fazer ainda pela agricultura portuguesa.
Os agricultores esperavam que a Presidência Portuguesa evidenciasse a discordância do País pelo facto de [que, sendo a agricultura portuguesa a mais débil, a mais pobre da União Europeia,] continuar o agricultor português a receber metade, um terço, um décimo, do que recebem outros agricultores da Europa!
Os agricultores esperavam que a Presidência Portuguesa fosse aproveitada para propor a criação de uma OCM da batata, que acabasse com o escândalo de haver na Comunidade quem receba grossas ajudas para essa produção, enquanto os produtores portugueses não conseguem vender a batata que cá produzem.
Os agricultores esperavam que a Presidência Portuguesa fosse aproveitada para emendar o erro negocial do Governo, em Berlim, onde se «esqueceu» de exigir um aumento substancial da quota leiteira para Portugal, pelo menos semelhante ao obtido por espanhóis e italianos.
Os agricultores esperavam que a Presidência Portuguesa fosse aproveitada para lançar uma reforma da OCM do tomate e, assim, impedir o escândalo de o País poder vir a perder quota em virtude do mau tempo que se fez sentir, e de que os agricultores não têm culpa nenhuma.
[Os agricultores portugueses da Cova da Beira, Vagos, Alcobaça, Macedo de Cavaleiros e outros concelhos do País, esperam ainda que a Presidência Portuguesa sirva para solicitar apoios extraordinários da Comunidade, e a fundo perdido, para as calamidades que lhes bateram à porta. Esperavam que fosse o momento certo para exigir o fim imediato do escandaloso embargo à carne de bovino portuguesa.]
Esperavam e ainda esperam. Esperam que o sr. Ministro da Agricultura não os defraude.
É certo que não será o que vai acontecer no Conselho Informal de Ministros da Agricultura da União Europeia, a realizar em Évora durante os próximos dias 28, 29 e 30 de Maio. Como é sabido, três dias de Conselho vão significar duas horas e meia de reunião de trabalhos! Disse.