O texto da Resolução sobre a realidade do aborto em Portugal acabou por incluir aquilo que os defensores da criminalização da mulher que aborta quiseram que a mesma incluísse.Não é difícil detectar nalguns itens, o argumentário dos partidários da penalização das mulheres.Claramente isto pode ser detectado no nº3 do ponto 2 . Com o qual pretendem os movimentos do não suporte para recolher do Orçamento do Estado verbas que servirão os seus desígnios que se cifram na manutenção de um sistema penal repressivo das mulheres. Sabe-se das propostas do CDS-PP relativamente ao chamado mecenato para a vida.“Mecenato” que, alimentando-se dos dinheiros públicos, não vai resolver a situação social das mulheres portuguesas que, segundo os dados oficiais, ocupam uma larga faixa da mancha da pobreza. São as estatísticas oficiais que referem que do universo dos trabalhadores abrangidos pelo salário mínimo nacional, 69% são do sexo feminino. E que dos titulares do rendimento mínimo garantido cerca de 67,5% são mulheres. E são ainda as estatísticas oficiais que revelam as discriminações salariais de que aquelas são vítimas.Ressoam ainda as palavras do actual Ministro do Trabalho, conhecido pela sua misogenia, que no debate do Programa do Governo não teve rebuço em afirmar a sua firme disposição em apoiar os movimentos do “Não à despenalização”, dos quais foi destacado militante.É também conhecido que um dos argumentos destes movimentos se referia ao que consta do item 9 do ponto II da Resolução.Para combater a despenalização muito se falou ( por parte do Não) do chamado síndroma post abortivo. Ora, aquilo para que alerta a OMS é de facto do estado de choque que pode resultar do aborto clandestino, nomeadamente do que é acompanhado de graves lesões na saúde física da mulher.Mas do que não tem dúvidas a Organização Mundial de Saúde é do número elevado de abortos clandestinos em todo o mundo. Das mortes das mulheres em consequência dos mesmos. Das graves consequências para a saúde das mulheres. Table 2. Global and regional annualestimates of incidence and mortality, unsafe abortions, United Nations regions, 1995-2000 Estimated number of unsafe abortions (000s) Incidence rate (unsafe abortions per 1 000 women 15-49) Incidence ratio (unsafe abortions per 100 live ) Estimated number of deaths due to unsafe abortion Mortality ratio (deaths due to unsafe abortion per 100 000 live births) Proportion of maternal deaths (% of maternal deaths due to unsafe abortion) WORLD TOTAL 20 000 13 15 78 000 57 13 EUROPE 900 5 12 500 6 17Do que não tem dúvidas a Organização Mundial de Saúde é de estamos perante um problema de saúde pública. E do que não tem dúvidas é de que as leis restritivas do aborto contribuem para atentados ao direito à saúde e à vida das mulheres. Veja-se, por exemplo, o documento em que a OMS revela as consequências da instauração de uma lei restritiva na Roménia Effects of the introduction in Romania in November 1966 of an anti-abortion law, and legalization of abortion in December 1989 E do que o PCP não tem dúvidas é de que há estudos, alguns oficiais, sobre o número estimado de abortos em Portugal.O último inquérito à Fecundidade do INE contém esses dados.E também um estudo publicado na Revista Portuguesa de Saúde Pública uma revista científica, elaborado por dois médicos com base nos dados hospitalares e nos dados fornecidos ao Ministério da Saúde pela rede dos médicos sentinela, contém dados e taxas sobre a realidade do aborto clandestino que nos coloca na cauda da Europa.Do que o PCP não tem dúvidas é de que por causa do recurso ao aborto clandestino, muitas mulheres portuguesas sofrem graves consequências na sua saúde.E do que o PCP não tem dúvidas é que não foi de ânimo leve que a Comissão para a Eliminação das Discriminações contra as Mulheres das Nações Unidas ( CEDAW) não foi de ânimo leve que recomendou a Portugal, no início do corrente ano que alterasse as leis restritivas do aborto.E também não tem dúvidas de que a recente Resolução do Parlamento Europeu que chamava a atenção para as graves consequências do aborto clandestino, causada pela perseguição penal das mulheres, também não foi tomada de ânimo leve.O PCP não tem de provar às mulheres portuguesas que continua preocupado com o grave problema de saúde pública resultante do aborto clandestino.E não aceita que a direita se esconda atrás de uma Resolução com a qual pretende transmitir a ideia de que está preocupada com a situação.Porque o que direita quer está bem patente no ante-projecto do Código do Trabalho, deste Governo, através do qual o destacado militante do “ Não à despenalização”, o actual Ministro do Trabalho, pretende retirar às mulheres que abortem clandestinamente, o direito à licença especial por aborto prevista actualmente na lei. Sujeitando as mulheres nessas condições a irem trabalhar doentes para não correrem o risco de serem despedidas com justa causa.Do que o PCP também não tem dúvidas, até por declarações expressas de deputados do CDS-PP e do PSD, é de que a direita não quer educação sexual nas escolas.E do que o PCP não tem dúvidas é de que existem- pelo menos no anterior Governo existiam- dados recolhidos pela Direcção Geral de Saúde sobre a situação do Planeamento Familiar.Uma rápida leitura da Resolução demonstra até que o calvário das mulheres portuguesas foi reduzido a números. Sem a preocupação de obter dados clínicos sobre as consequências do aborto clandestino para a saúde das mulheres.Estudos como o que agora se pretende fazer, foram também feitos na Irlanda( com legislação ainda mais restritiva do que a nossa).Tendo servido para que o Governo Irlandês ainda tentasse piorar a legislação, tal como o Supremo Tribunal a interpreta.Nós sabemos o que quer a direita que acabou por liderar o processo que terminou na Resolução que apoiou.