Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, A mobilidade das populações constitui um eixo fundamental de uma política coerente de desenvolvimento integrado e sustentável. Sendo indispensável garantir este direito elementar de todos os cidadãos, é também por uma evidente razão de desenvolvimento económico e social que o País não pode prescindir de uma política correcta, justa, eficaz, para a mobilidade, transportes e acessibilidades.O País, e as Áreas Metropolitanas, sofreram profundas transformações nas últimas décadas. Novos desafios, particularmente exigentes, têm vindo a colocar-se, com alterações estruturais nos padrões de mobilidade. E aquilo a que temos vindo a assistir é a degradação dos serviços públicos – linhas e carreiras encerradas, circulações suprimidas, deficiente (ou inexistente!) informação ao público. É a exploração dos trabalhadores do sector atingindo a desumanidade, em matéria de horários de trabalho e não só, como acontece no escandaloso caso da Fertagus.Mas é também o encarecimento dos preços no tarifário, superiores à taxa de inflação – e muito acima dos aumentos salariais. Veja-se os três aumentos que em dez meses se registaram, entre Março de 2002 e Janeiro de 2003. Uma subida de preços acumulada que corresponde a 7,6% para o Passe L123 (o mais utilizado na região de Lisboa), ou a 7,5% para o pré-comprado da Carris. Ou ainda a 18% para a tarifa do Metropolitano de Lisboa.Somos o único país da Europa onde baixaram os salários reais. E somos o país da Europa onde os passageiros pagam a maior percentagem dos custos dos transportes públicos, com o preço dos bilhetes e passes. Com um salário mínimo nacional de cerca de um terço do praticado na Grã-Bretanha, por exemplo, pagamos exactamente o mesmo valor (um euro) para comprar um bilhete de autocarro em Lisboa ou em Londres!Há poucos meses, perante a evidência de que seriam muitos os cidadãos e as empresas a recorrer às circulares rodoviárias exteriores de Lisboa e do Porto, para evitar o congestionamento dos centros das cidades, eis que o Governo tirou um coelho da cartola e aí estão as portagens na CREL e na CREP – contra todas as promessas do PSD, contra tudo e contra todos. Aliás, contra quase todos… mas a favor da Brisa!São situações como estas que colocam em evidência a visão casuística, economicista e tacanha que tem vindo a imperar na política de transportes e acessibilidades. Não temos uma política de portagens que constitua, em igualdade e coerência, um instrumento de gestão da mobilidade digno desse nome. Temos sim uma orientação política que penaliza as populações e a economia e que favorece objectivamente a lógica do lucro máximo.Mais recentemente, na passada sexta-feira, o Governo anunciou um aumento de quatro cêntimos para o preço do gasóleo. E os operadores privados de transporte colectivo vieram imediatamente a público para afirmar que, perante este aumento nos combustíveis, a resposta virá rapidamente, com a supressão de mais carreiras e serviços, nomeadamente aquelas que hoje não garantem as margens de lucro que estes procuram no seu negócio.Mas por outro lado, também é preciso recordar que, para os grupos económicos e os interesses privados, qualquer área de negócio é justamente isso: um negócio. Com uma lógica de lucro que tantas e tantas vezes se tem sobreposto ao interesse público – e à lógica do serviço público. Pois é em defesa do serviço público que o Governo tem nesta matéria o dever de intervir, e impedir que as populações vejam os seus direitos e os seus interesses outra vez postos em causa.O que a realidade nos vem demonstrar é que mais uma vez o PCP tinha razão, quando denunciou a estratégia errada e lesiva do interesse nacional que tem presidido à privatização do sector dos transportes. E é bom que o Governo tire as devidas conclusões desta experiência, mantendo o que ainda existe de gestão pública, e não prossiga com a irresponsável intenção de privatizar o que resta neste sector.Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,Agora, de modo coerente com a posição que sempre assumimos nesta matéria, apresentamos na Assembleia da República um conjunto de projectos de lei, com os quais pretendemos contribuir para uma efectiva política de mobilidade, ao serviço de um desenvolvimento sustentável e solidário.Assim, apresentamos um projecto-lei que visa isentar de portagem a rede viária principal de acesso e de circulação no interior das Áreas Metropolitanas. Com esta proposta delimitamos um anel rodoviário em torno destas Áreas, que no essencial corresponde respectivamente ao IC-18 (CREL) para Lisboa e IC-24 (CREP) para o Porto, vias estruturantes que devem ficar isentas de portagens, e no interior das quais nenhuma portagem deve ser cobrada.Propomos também que seja retirado o regime de portagens da Ponte 25 de Abril, pondo fim àquele que é hoje um exemplo crasso de discriminação territorial. A Ponte 25 de Abril está paga e mais que paga e não tem nenhuma alternativa para quem a utiliza. É uma política de flagrante discriminação e injustiça a que urge pôr fim, consagrando um indispensável e elementar princípio de igualdade nas acessibilidades e rede viária metropolitanas.Consideramos que a política de portagens tem de ter coerência, equilíbrio e justiça. Não pode servir para penalizar as populações. E tem que ser considerada num âmbito mais geral de uma política integrada de promoção da mobilidade. A par, designadamente, da defesa da utilização do transporte colectivo – de que as políticas tarifárias são vertentes fundamentais. Por isso o PCP apresenta outros dois projectos de lei, referentes neste caso ao Passe Social Inter modal. Confirmando-o como título de transporte para a Área Metropolitana de Lisboa e recusando os ataques que lhe têm sido dirigidos pelos operadores, com o beneplácito do Governo.E consagrando o Passe Social como título válido em todos os operadores de transporte colectivo, públicos e privados, na respectiva área. Só assim será possível ordenar a impraticável profusão de títulos de transporte (mais de 450 bilhetes e passes na região de Lisboa), e permitir que um único passe permita a utilização de todos os meios de transporte colectivo – situação que inexplicavelmente hoje não acontece.Com este projecto-lei, propomos o alargamento do âmbito territorial da utilização destes passes, respondendo assim às novas necessidades de mobilidade que as populações passaram a sentir nas últimas décadas. Finalmente, ainda no plano do Passe Social Inter modal, o PCP apresenta um projecto-lei que vem instaurar este Passe para a Área Metropolitana do Porto. Atendendo às características próprias daquela região, aos seus próprios padrões de mobilidade, defendemos que também as populações daquela Área Metropolitana tenham o direito a um título de transporte que não se restrinja a um ou dois operadores, ou a uma determinada zona.A mobilidade é um direito que não pode ser considerado apenas como o direito a ir de casa para o trabalho ou para a escola, e depois regressar. O direito à cultura, ao desporto, ao lazer, ao tempo livre, é também o direito de nos podermos deslocar com esses objectivos. E não podemos pensar que, para essas deslocações, a única alternativa seja… ir de carro.O Passe Social deve ser uma realidade efectiva. Ao dispor dos seus utilizadores. Com um âmbito de utilização alargado e diversificado. Devidamente quantificado, e com fórmulas de financiamento actualizadas e aplicadas com transparência.Só assim, Senhor Presidente e Senhores Deputados, se poderá promover verdadeiramente a utilização do transporte colectivo. Só assim a utilização do transporte individual deixará de ser a única opção real (para aqueles que o possuem). Só assim poderemos contar com uma política de mobilidade, transportes e acessibilidades que garanta o desenvolvimento, a qualidade de vida e a defesa do ambiente.Disse.