Hoje está claro que as contradições fatais da chamada estratégia de Lisboa impediram que se desse qualquer passo no sentido de atingir o ambicioso objectivo para a Europa, lançado há cerca de quatro anos, apontando para o aparecimento, em 2010, do "espaço económico mais dinâmico e competitivo do mundo, baseado no conhecimento e capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos e com mais coesão social".
É que no seu bojo estavam dois objectivos centrais para os grupos económicos e financeiros da União Europeia - a liberalização de sectores básicos e a flexibilidade dos mercados de trabalho - que, a concretizarem-se, necessariamente iriam impedir o objectivo tão propagandeado do espaço económico mais dinâmico e competitivo do mundo, da criação de mais e melhores empregos e de mais inclusão social. Mas foram apenas esses - os ojectivos das liberalizações e da flexibilidade - que avançaram.
Por exemplo, para se atingirem as metas de emprego então apontadas, era necessário criar mais 15 milhões de empregos de qualidade até 2010. Mas, até agora, o escasso emprego criado foi precário e insuficiente para compensar o desemprego, que não cessa de crescer, como em Portugal.
A obsessão neoliberalizadora em que entraram os dirigentes da União Europeia, que tem levado ao desmantelamento sucessivo de sectores públicos básicos e fundamentais para a inovação, para aprofundar a investigação e colocar o conhecimento ao serviço do bem comum, só podia ter o resultado que já é visível - mais desigualdades, menor coesão económica e social e continuação do deficiente investimento na investigação científica, na educação, na formação e na cultura.
A sacralização do mercado, a flexibilidade das leis laborais e a subordinação à concorrência para servir exclusivamente os interesses lucrativos dos grupos económicos e financeiros das multinacionais, de que o Pacto de Estabilidade e os seus estúpidos critérios de convergência nominal têm sido instrumento privilegiado, em que Portugal é exemplo, só podia conduzir à estagnação, ao marasmo, à recessão económica, a empregos mais precários e a um ataque, sem precedentes nas décadas recentes, aos direitos fundamentais dos trabalhadores e aos serviços públicos essenciais, piorando a qualidade de vida da maioria da população, mantendo níveis muito elevados de abandono escolar precoce, que, em Portugal é superior a 45%, e aumentando a pobreza e a exclusão social.
Assim, o que se impõe, não é insistir no mesmo caminho. Há que inverter o sentido da estratégia seguida. Acabar com as liberalizações, privatizações e desmantelamento dos serviços públicos. Pôr fim aos critérios irracionais do Pacto de Estabilidade. Cessar os ataques aos direitos dos trabalhadores e à segurança social. Não insistir no aumento da idade da reforma. Apostar no investimento público e numa nova dinâmica económica e social só possível com a participação e a dignificação de quem trabalha. Dar maior atenção às pequenas e médias empresas e ao sector social da economia. Concretizar a prioridade aos jovens, à educação, à formação e à investigação e considerar a inclusão social como uma prioridade fundamental.
Com o alargamento a mais dez países, cujos rendimentos, em média, são inferiores a 50% da média comunitária do PNB, mais urgente se torna esta mudança de sentido das políticas europeias, designadamente da chamada estratégia de Lisboa, mas também se impõe reforçar as perspectivas financeiras e o orçamento comunitário para garantir uma verdadeira política de coesão social, como ainda esta semana se exigiu no Fórum Social Mundial, em Bombaim, na Índia.
Assim, a questão que se coloca é saber até onde a Comissão Europeia, o Conselho e os Governos dos Estados Membros estão disponíveis para rever as suas políticas visando dar prioridade à Europa social, às pessoas, à melhoria do bem estar colectivo, parando com as liberalizações, acabando com os critérios irracionais do Pacto de Estabilidade e apostando no investimento público para relançar a economia.
Não bastya propagandear estas propostas nas campanhas eleitorais. É preciso apontar as medidas concretas. E a pergunta que coloco é esta: onde estão estas medidas?