Debate preparatório do Conselho Europeu, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 4.º da Lei de Acompanhamento, Apreciação e Pronúncia pela Assembleia da República no âmbito do Processo de Construção da União Europeia
Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro:
Gostaria de lhe colocar quatro questões em relação à matéria que estamos a discutir.
O Conselho Europeu vai discutir o referendo na Grã-Bretanha. Estamos, mais uma vez, perante uma grande operação de condicionamento da opinião do povo britânico, a que convencionaram chamar de «negociação». Os pacotes políticos que estão a ser negociados apontam para mais neoliberalismo, menos direitos dos trabalhadores, mais benesses para as transnacionais e uma institucionalização da discriminação dos imigrantes.
A primeira pergunta que lhe deixo é se o Governo português vai acompanhar a chantagem e o oportunismo das propostas do Governo britânico ou se, pelo contrário, irá defender o que é correto: que o povo britânico se pronuncie livre de pressões e de manobras de condicionamento.
A segunda questão é sobre migrações. O Conselho Europeu irá discutir uma proposta típica de uma guerra contra as vítimas da guerra. A esse respeito queria perguntar-lhe se o Governo está de acordo com a criação de uma agência de guarda europeia costeira e fronteiriça e, em particular, com a criação de uma guarda costeira europeia com poderes de intervenção nas fronteiras marítimas do nosso País, mesmo sem consentimento do Governo português.
A terceira questão tem a ver com o combate ao terrorismo. Todos estamos de acordo com a necessidade de combate ao terrorismo. Por parte do PCP, entendemos que esse combate tem de começar pelas causas sociais, económicas e políticas e pelo fim da política intervencionista e belicista e de ingerência externa. Todos estamos de acordo em garantir a segurança dos nossos cidadãos, mas segurança é uma coisa e deriva securitária é outra. A esse respeito desejamos saber qual é a posição do Governo português sobre a diretiva dos registos de identificação indiscriminada de passageiros, que sujeita todos os cidadãos ao mesmo nível de controlo e vigilância, recolhendo todos os seus dados pessoais e de viagens dentro da União Europeia, retendo-se durante cinco anos essa mesma informação, pondo-a à disposição das agências supranacionais de segurança e informações.
A quarta e última questão tem a ver com o chamado «aprofundamento da União Económica e Monetária». Fala-se muito em mudança, mas a verdade é que aquilo que o Conselho Europeu vai discutir é o chamado «relatório dos cinco presidentes», ou seja, mais do mesmo, cuja primeira fase, destinada a aprofundar todo o processo de governação económica, está já em andamento. Estamos perante uma nova dinâmica, que vem reforçar os mecanismos de condicionamento de políticas orçamentais dos Estados-membros, a perda de soberania nacional, a institucionalização de políticas de austeridade e de empobrecimento.
As propostas concretas da criação de um conselho orçamental europeu e de conselhos nacionais de competitividade, compostas por chamados «peritos» e destinados a monitorizar o desempenho das execuções orçamentais e as políticas de trabalho são, para além de um aprofundamento do caracter antissocial e antidemocrático do semestre europeu e da governação económica, mais uma afronta à nossa soberania e à capacidade de decisão sobre políticas que deem resposta aos problemas dos trabalhadores e do povo e que possibilitem o crescimento, o investimento e o desenvolvimento da nossa economia. Por isso, a questão impõe-se: não considera que estas novas medidas, nomeadamente as duas concretas que lhe referi, são contrárias ao desenvolvimento económico soberano e de justiça social? É que assim, Sr. Primeiro-Ministro, não há mais Europa. Quando muito, pode haver menos Portugal.