Este debate, que se realiza no âmbito de uma acção nacional do PCP «Pelo direito à cultura, combatendo a sua desvalorização«, cujo tema é Cultura e Património, realiza-se num momento em que se fazem sentir as consequências de décadas de abandono do Património Cultural em Portugal.
De facto, como aqui foi afirmado, também na Cultura os problemas mais sentidos não resultam do surto epidémico. A epidemia apenas os agravou.
As carências fazem-se sentir a todos os níveis, nomeadamente a falta de trabalhadores, tanto na área do Património Cultural, como dos Museus e Palácios, Monumentos e Sítios Arqueológicos, cujos trabalhadores, sindicatos e directores têm vindo a denunciar em muitas e variadas ocasiões.
Faltam vigilantes, recepcionistas, conservadores-restauradores, técnicos de fotografia, pessoal dos serviços educativos. A esta falta acresce uma outra questão bastante preocupante, que é o facto da média etária do quadro de pessoal ser bastante elevada, com uma percentagem significativa de trabalhadores com idade para se aposentarem.
Situação que reclama a urgência da contratação de trabalhadores para os Museus e Palácios, Monumentos e Sítios Arqueológicos.
Se nada for feito no imediato, o serviço público inestimável que é prestado por estas entidades será severamente comprometido. A passagem de testemunho, de cultura de organização, de saber fazer, são aspectos que se estão a perder e que podem mesmo assumir uma dimensão de irreversibilidade.
Um outro aspecto para o qual o PCP tem vindo a alertar diz respeito à precariedade no sector, como é o exemplo do trabalho em arqueologia, onde esta situação impera, através do recurso ao recibo verde, mas também a desregulação e da falta de condições de higiene, saúde e segurança.
Por proposta do PCP, foi aprovado um Programa Nacional de Emergência do Património Cultural para diagnosticar, conhecer e monitorizar as reais necessidades de intervenção e salvaguarda do património material e imaterial, tal como a elaboração de uma Carta de Risco com as prioridades de intervenção de salvaguarda e de investimento no património edificado público classificado ou em vias de classificação a nível nacional.
Não só é essencial o cumprimento integral destas propostas (aonde ainda não foi concretizado), como garantir o investimento necessário para a real intervenção e salvaguarda do Património Cultural. A proposta do PCP que garantia este investimento foi rejeitada com votos contra do PS no Orçamento do Estado de 2020.
Não podem ocorrer situações como a que se viveu na Sé de Lisboa, em que, não fosse a intervenção dos trabalhadores e dos seus sindicatos, que levou ao recuo do Ministério da Cultura, teriam sido destruídas estruturas de extraordinário valor patrimonial, histórico e arqueológico, correspondentes à antiga Mesquita de Al Usbuna.
Estas e outras questões são inconcebíveis e dão razão ao PCP, quer relativamente aos problemas que surgem com a utilização do modo de produção agrícola superintensiva, tal como a necessidade urgente de valorização e preservação do Património Cultural e a contratação com direitos de mais trabalhadores.
O PCP irá apresentar um conjunto de propostas no sentido da defesa e valorização do Património Cultural em sede de Orçamento do Estado para 2021 que têm como um dos principais objectivos a responsabilização do Estado pelo património.
Propostas a apresentar pelo PCP no sentido de reactivação do Plano Nacional de Trabalhos Arqueológicos com dotações orçamentais dignas e ainda a insistência no recrutamento urgente de trabalhadores, tal como o PCP tem apresentado em várias iniciativas legislativas, bem como em sede de Orçamento do Estado.
De realçar ainda que, tal como o PCP tem apresentado, se torna necessária a implementação de um verdadeiro plano contra a precariedade que combate estas e outras formas de exploração.
Tal como em outras áreas de actividade no nosso País, a resolução destas e outras questões passa fundamentalmente por romper com a política de direita na Cultura que sucessivos governos aplicaram ao longo de anos: desinvestimento e ataque às funções constitucionais do Estado; abandono de qualquer elemento de serviço público; esvaziamento da diversidade e destruição do tecido cultural; mercadorização e mercantilização culturais; inserção subalterna e de mero consumo no mercado internacional das indústrias culturais; formação de uma dupla estratificação – elitização e massificação – no acesso à Cultura, em ambos os casos contrária à democratização.
E se houve, na anterior legislatura, aspectos pontuais e limitados em que esta política foi contrariada, como nos casos do aumento da verba para os apoios às Artes, do alargamento da gratuitidade de acesso aos museus e monumentos, da baixa do IVA para os instrumentos musicais e para os espectáculos, do regresso das bolsas de criação literária e do programa Pró-Museus, por proposta do PCP, o Governo minoritário do PS inseriu-se, em geral, na continuidade da política de direita, condicionando desta forma o acesso à criação e fruição culturais.
Neste sentido é imprescindível que se alargue o regime de gratuitidade de acessos aos museus e monumentos, sob tutela da Administração Central, mesmo que não estejam sob a responsabilidade da Direcção-Geral do Património Cultural do Ministério da Cultura, aos domingos e feriados para todos os cidadãos.
Importa ainda que, a par da revitalização da rede de museus, o Programa Pró-Museus, reactivado por proposta do PCP, continue o seu papel, garantindo aos Museus o apoio financeiro de complementaridade à implementação de projectos técnicos que melhorem a documentação, a conservação e a comunicação de acervos.
É necessário que sejam abertos os concursos e que o financiamento seja devidamente reforçado.
Sobre a Arqueologia, é importante que a proposta do PCP de reactivação do Plano Nacional de Trabalhos Arqueológicos, com dotações orçamentais dignas, seja uma realidade, considerando que os trabalhos específicos no contexto deste Plano são de extrema importância para o desenvolvimento da Arqueologia enquanto domínio do conhecimento no nosso País, bem como para a própria prática arqueológica, devendo encontrar funcionamento regular e financiamento digno por parte da tutela da Cultura.
As soluções de investimento que o Governo PS apresenta no Orçamento do Estado para 2021, criando um jogo de sorte e azar, uma “raspadinha” denominada “Do Património Cultural”, cujos resultados líquidos de exploração do jogo, a existirem, serão utilizados para intervenção e valorização do Património Cultural, demonstram a profunda desresponsabilização do Governo nesta matéria. Uma proposta que só pode envergonhar quem a fez e defende.
Não é com uma “raspadinha” que se intervém, preserva e valoriza o património cultural. É com o cumprimento das propostas do PCP, de um Programa Nacional de Emergência do Património Cultural para diagnosticar, conhecer e monitorizar as reais necessidades de intervenção e salvaguarda do património material.
Para o PCP a Cultura é um pilar da democracia. Exige uma política de forte responsabilidade e capacidade de acção pública. Requer a existência de um Ministério da Cultura digno desse nome, invertendo e rectificando a linha de esvaziamento e desresponsabilização da Administração Central seguida pela política de direita. Com a reformulação das suas estruturas e quadros efectivamente dotados dos necessários meios orçamentais, técnicos, políticos e humanos, com capacidade e flexibilidade de intervenção tanto nos planos nacional, regional e local, como no plano da articulação interministerial de políticas.
É inquestionável que vivemos hoje tempos difíceis. Tempos de agravamento de injustiças e desigualdades e das condições de vida das populações. Tempos que viram acumular-se problemas que não são de hoje, mas que se foram arrastando e ampliando, porque não houve a necessária resposta para os debelar, atingindo os mais diversos domínios da nossa vida colectiva.
Os trabalhadores, os intelectuais e quadros técnicos, os micro, pequenos e médios empresários, os reformados e um vasto conjunto das camadas populares estão a ser atingidos pelo efeito da epidemia que persiste e pelo aproveitamento que fazem dela os grandes interesses económicos e as forças políticas que os representam e assumem as suas conveniências.
A pretexto da epidemia de COVID-19, é conhecida a vasta operação de ataque a salários e direitos, de tentativa de limitação das liberdades, de degradação dos serviços públicos, de desvalorização da Cultura e várias actividades onde dominam os pequenos interesses na área do comércio e restauração, entre outros.
Por estes dias, a pretexto da subida de casos de pessoas infectadas, novamente se levantaram as vozes dos que reclamam mais restrições às liberdades, mais cortes de direitos e mesmo medidas mais musculadas, trocando a pedagogia pela via repressiva, estando para isso em preparação a declaração do Estado de Emergência.
O Governo anunciou já um conjunto de medidas que se afiguram desproporcionais e para além do estritamente necessário no combate de saúde pública contra a epidemia e prepara-se para as agravar.
No caso da Cultura, ela não aguenta mais confinamentos. Tomando, naturalmente, todas as medidas de defesa sanitária o sector não suporta o nível de condicionamento que lhe está a ser imposto. O que se destruiu nestes últimos meses é demasiado desastroso para prosseguir neste caminho. É o seu afundamento e destruição que está em perspectiva.
Esta epidemia, como o PCP tem reiterado ao longo dos meses, coloca problemas sanitários, económicos e sociais que não são resolvidos pela limitação de direitos e a criação de climas de medo.
Queremos aqui reafirmar a posição do Partido. Face à epidemia o que se impõe é reforçar o SNS, assegurar a protecção individual, fazer a pedagogia da protecção; dinamizar as actividades económicas, sociais, culturais, desportivas; exercer os direitos políticos e sociais e combater o medo e os seus propagandistas.
Para o PCP aquilo que é essencial é que sejam adoptadas as medidas necessárias e adequadas a enfrentar os problemas, incluindo os de saúde pública, porque não basta invocar a gravidade da situação, como o Governo faz, é preciso fazer corresponder as palavras aos actos.
Para o PCP a prioridade no combate à COVID-19 é o reforço do Serviço Nacional de Saúde, com o recrutamento urgente dos profissionais em falta, o aumento do número de camas hospitalares, nomeadamente camas de cuidados intensivos, normalizar o funcionamento dos Cuidados de Saúde Primários e o alargamento da estrutura de saúde pública, instrumento fundamental para a detecção dos surtos e interrupção das cadeias de contágio.
Opções políticas que deviam estar, desde logo, espelhadas no Orçamento do Estado para 2021, bem como outras para dar resposta aos graves problemas que o País enfrenta e não estão.
O Governo escolheu outro caminho. O caminho de atender ao défice das contas públicas em vez de às necessidades dos trabalhadores e do povo.
Esta é, desde logo, uma opção errada em quaisquer circunstâncias, torna-se particularmente grave e incompreensível na actual situação com os problemas que enfrentamos.
Esta opção pelo défice, que nega ao País cerca 6 mil milhões de euros, demonstra que há recursos para responder ao que o País precisa e a resposta a muitas das propostas para o efeito que o PCP tem apresentado e que o Orçamento não contempla e omite.
Fará sentido que, num momento em que o País enfrenta graves problemas sociais, que está mergulhado numa recessão económica, com impacto muito negativo no emprego e na vida de tanta gente, a opção do governo seja a de continuar a dar prioridade à redução do défice em três pontos percentuais, em vez de responder aos problemas da quebra de salários e rendimentos e avançar com medidas para promover o crescimento económico?
Não faz sentido!
É conhecida a nossa determinação de não desistir de nenhuma batalha antes de a travar e muito menos quando estão em causa os interesses dos trabalhadores, do nosso povo e do País.
Não é nosso costume abdicar de travar os necessários combates, mesmo quando eles se apresentam difíceis como é o caso, face à natureza da proposta de Orçamento apresentada pelo governo do PS.
Foi com essa perspectiva que o PCP anunciou antecipadamente a sua decisão de abstenção na votação na generalidade da proposta de Orçamento.
Uma decisão que deve ser entendida não como um ponto de chegada, mas como um manter aberta a porta ao encontrar das soluções que o País precisa no debate na especialidade que está em curso, mesmo constatando a sistemática recusa do Governo em avançar nesse sentido.
É para nós claro que este não é o Orçamento que o País precisa, quer para dar solução problemas estruturais que se arrastam há anos, quer para a resolução dos problemas novos determinados pelo impacto da epidemia.
É um Orçamento aonde está ausente uma resposta global aos problemas nacionais.
Na última semana e com o início da discussão na especialidade da proposta de Orçamento do Estado para 2021, o PCP entregou o primeiro lote de propostas. Percorrendo matérias diversas, que vão da defesa dos direitos dos trabalhadores e reformados ao reforço do Serviço Nacional de Saúde e da Escola Pública, a que se juntam propostas que visam o alargamento de prestações sociais, a recuperação do controlo público de empresas e sectores estratégicos, uma maior justiça fiscal, o apoio às MPME, a criação de vagas em redes públicas de creches e lares, a eliminação de portagens, o apoio à Cultura, a resposta a problemas ambientais.
Trata-se de uma primeira abordagem que não esgota o universo de áreas e matérias que apresentaremos ao longo dos próximos dias e que procuram inverter opções e medidas constantes de uma proposta do Governo.
É perante as opções concretas que o PS tem de clarificar se é com o PCP que vai convergir ou se são outros os seus objectivos e outras as suas convergências.
Da parte do PCP, não irá faltar nesta fase do debate com a sua iniciativa e proposta, e deixamos aqui também a garantia aos portugueses de que o sentido de voto final no Orçamento que venha a ser tomada, dependerá da avaliação da versão final do Orçamento face à resposta global aos problemas nacionais.
É este o nosso compromisso. Um compromisso que mantemos com os trabalhadores e com povo.