Intervenção de António Filipe na Assembleia de República

As críticas às decisões do Tribunal Constitucional

Sr.ª Presidente,
Sr.ª Deputada Isabel Moreira,
Quero saudar a sua intervenção, que trouxe a este Plenário uma questão que já tinha sido de certa forma abordada na declaração do Sr. Deputado António Braga, respeitante à gravidade da atitude tomada por altos responsáveis do PSD em relação ao Tribunal Constitucional.
Sublinho que, ao contrário daquilo que a direita procura fazer crer à opinião pública, não se trata do exercício do direito à crítica ou à discordância relativamente a uma decisão judicial.
Todos temos direito à discordância e a emitir uma opinião contrária a uma decisão judicial. Mas aquilo com que estamos confrontados não é isso. Esta atitude já passou por várias fases. Começou pela crítica, pela discordância, depois passou à chantagem. Depois da chantagem passou à ameaça. Agora estamos perante algo de uma enorme gravidade do ponto de vista democrático e do ponto de vista do funcionamento das instituições democráticas, que é termos altos responsáveis políticos do PSD a dizer: «Enganámo-nos na escolha porque, afinal, os juízes que escolhemos para o Tribunal Constitucional não fazem aquilo que nós queríamos, não decidem politicamente segundo aas nossas orientações, decidem — imagine-se! — pela sua consciência, decidem de acordo com o entendimento que fazem da Constituição».
Imagine-se o crime de «lesa pátria» que o é o facto de os juízes do Tribunal Constitucional decidirem de acordo com a Constituição e não de acordo com aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro e os Membros do Governo pretendiam que se decidisse!
Depois, disseram ainda que deveriam pensar em sanções jurídicas a aplicar aos juízes do Tribunal Constitucional — imagine-se! — porque eles decidem aplicar a Constituição e fazer cumprir a Constituição.
Sr.ª Deputada, isto é, de facto, de uma gravidade extraordinária, tanto mais que estas declarações são feitas sem que haja, da parte do PSD, qualquer desautorização dos dirigentes que fazem declarações deste teor.
A questão que se deve colocar é a de saber se esta atitude de confronto, diria, de guerra aberta, contra o Tribunal Constitucional não configura uma violação gravíssima do relacionamento que deve existir entre instituições da República. Pergunto se não estamos perante uma atitude que põe seriamente em causa o regular funcionamento das instituições democráticas e se é concebível que o Sr. Presidente da República, que tem como função constitucional fazer cumprir a Constituição e zelar pelo regular funcionamento das instituições democráticas, permaneça em total silêncio perante uma tão grave afronta a um órgão de soberania com a importância do Tribunal Constitucional.
Era esta a questão que queria colocar.

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