Criminaliza o incitamento público à prática de infracções terroristas, o recrutamento para o terrorismo e o treino para o terrorismo, dando cumprimento à Decisão-Quadro n.º 2008/919/JAI, do Conselho, de 28 de Novembro de 2008, que altera a Decisão-Quadro n.º 2002/475/JAI, relativa à luta contra o terrorismo, e procede à terceira alteração da Lei n.º 52/2003, de 22 de Agosto.
(proposta de lei n.º 44/XI/2.ª)
Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:
A propósito da matéria do combate ao terrorismo e da proposta de lei que aqui nos é apresentada, ocorre-nos dizer que as sociedades democráticas estão hoje confrontadas com dois problemas nesta matéria. Um, é o do terrorismo. Aliás, foi o reconhecimento unânime desse problema que levou a que a lei de 2003, cuja alteração hoje se propõe, tenha sido aprovada em votação final global, nesta Assembleia, por unanimidade. O segundo problema é o dos abusos que estão a ser cometidos a pretexto e à sombra do combate ao terrorismo e que já nada têm que ver com o combate ao terrorismo mas que põem verdadeiramente em causa princípios civilizacionais basilares das sociedades democráticas.
Em nome do combate ao terrorismo, têm sido cometidas verdadeiras atrocidades, têm sido cometidos crimes de guerra e estão a ser cometidos atentados às liberdades democráticas.
Nos dias que correm, assistimos a graves atentados contra a própria liberdade de expressão, sempre em nome do dito combate ao terrorismo, e aí já numa cruzada que nada tem a ver com o combate ao terrorismo mas com as limitações à liberdade de expressão e às liberdades democráticas.
Daí que a proposta de lei que nos é hoje, aqui, apresentada nos suscite as maiores dúvidas quando conjugada com o conceito excessivamente amplo, diríamos, que enquadra esta matéria, designadamente, o constante do artigo 2.º da Lei n.º 52/2003, que estabelece, de uma forma extremamente ampla, aquilo que se considera como organização terrorista, incluindo até crimes contra as telecomunicações, nomeadamente as informáticas, as telegráficas, as telefónicas, as de rádio e as de televisão. E, se conjugarmos isto com o que é proposto no n.º 3 do artigo 4.º, que criminaliza quem, por qualquer meio, difundir mensagem ao público incitando à prática dos factos referidos na disposição que acabei de citar, estamos perante uma formulação de
tal modo vaga que pode conduzir, inclusivamente, àquilo a que normalmente se chama a punição do mensageiro que dá as más notícias.
Portanto, estamos aqui perante a possibilidade de introduzir no ordenamento jurídico disposições que poderão ter muito pouco a ver com o combate ao terrorismo, mas ter muito a ver com a punição daqueles que denunciem crimes ou atrocidades que possam ser cometidos precisamente em nome ou a pretexto desse combate.
Logo, esta disposição que nos é proposta suscita-nos as maiores reservas e daí que não possamos nesta fase, pelo menos na generalidade, viabilizá-la. Obviamente, reservar-nos-emos para o debate na especialidade, esperando que estas posições possam ser corrigidas e que seja possível aprovar um diploma que, tal como em 2003, recolha algum consenso nesta Câmara e que não contemple os perigos que acabámos de referir.