I – Nota introdutória
Em 2013, no âmbito da reorganização administrativa territorial autárquica, e a pretexto de uma falsa promoção da coesão territorial e do desenvolvimento local, a Freguesia da Glória foi extinta, conjuntamente com a Freguesia de Vera Cruz, tendo dado lugar a uma nova freguesia denominada União das Freguesias de Glória e Vera Cruz.
Porque da parte dos órgãos autárquicos e das populações se considera ilegal, ilegítima, injusta e injustificada a alteração forçada e unilateral em desrespeito pelas populações e pela autonomia das autarquias consignada na Constituição da República Portuguesa e comprovadamente não resolver nenhum problema económico ou financeiro, antes constituindo uma redução e diminuição do Poder Local Democrático e da democracia, se apresenta o projecto lei de recuperação da Freguesia da Glória no Concelho de Aveiro, Distrito de Aveiro.
II- Razões de ordem histórica
Com mais de 170 anos de história, a Freguesia de Nossa Senhora da Glória integra a parte mais alta da cidade, situando-se na margem esquerda do “canal central” da Ria de Aveiro que atravessa toda a cidade.
Desde os tempos da reconquista cristã e da reorganização da Igreja no território de Entre-Os-Rios Douro e Mondego, o povoado de Aveiro constituía uma única freguesia, cuja matriz era a igreja de S. Miguel, construída provavelmente nos finais do século XI por iniciativa de D. Sisnando, Conde de Coimbra e vassalo de D. Fernando Magno, Rei de Leão. O primeiro edifício erguia-se num outeiro relativamente elevado, onde talvez tenha existido uma fortificação e uma mesquita, no local conde se encontra hoje localizada o velho edifício da Câmara Municipal de Aveiro.
No século XVI, a região de Aveiro continuava dentro dos limites da Diocese de Coimbra. Por se achar que Aveiro, em 1572, tinha 11.365 pessoas de comunhão; o bispo reconheceu ser excessiva tal população para uma só freguesia e determinou dividir a então vila em quatro paróquias ou freguesias: São Miguel, composta pela quase totalidade da vila muralhada e pelo bairro do Alboi, a ocidente; Espírito Santo, que agrupava uma parte da vila muralhada com os Conventos de S. Domingos, de Jesus e de Santo António e se estendia para sul; Nossa Senhora das Candeias ou da Apresentação e Veracruz, ao norte do canal central da ria.
Nos princípios do século XIX, notava-se que a velha divisão do País se tinha tornado anacrónica e incompatível com as necessidades sociais. Logo na Constituição de 1822 se futurava a divisão do território em distritos e o modo de neles se fazer a administração judicial, política e civil. A Carta Constitucional de 1826 manteve tal projeto. Mais tarde, em 18 de Julho de 1835, o Governo fez publicar um decreto, com base na lei de 25 de Abril anterior, fixando em dezassete o número de distritos no continente português. Após a instituição do distrito de Aveiro foram as quatro freguesias da cidade reduzidas a duas, por alvará de 11 de Outubro de 1835, assinado pelo governador civil. Por esta forma, constituir-se-ia, ao norte do canal central da ria, a freguesia da Vera-Cruz e, ao sul, a de Nossa Senhora da Glória.
Com a criação e o alargamento de uma rede de escolas dos diversos níveis de ensino, a abertura e o melhoramento da barra nova, a situação e o progresso do porto, o lançamento de estradas, a passagem do caminho-de-ferro e o desenvolvimento de outros meios de comunicação, aliados decerto ao espírito de iniciativa e de aventura dos aveirenses, a Freguesia da Glória viveu uma enorme evolução industrial, comercial e demográfica durante todo o século XIX. A instalação, mais recentemente, em 1973, da Universidade de Aveiro provou tratar-se de mais uma Freguesia no reforço da qualidade de vida da sua população e da sua identidade cultural, alavanca ao desenvolvimento económico e social da freguesia, que, pela presença em massa de estudantes universitários, se dotou de importantes infraestruturas reforçando o papel desta Junta de Freguesia.
A extinção de freguesias protagonizada pelo Governo e por PSD e CDS-PP assenta no empobrecimento do nosso regime democrático. Envolto em falsos argumentos, a extinção de freguesias conduziu à perda de proximidade, à redução de milhares de eleitos de freguesia e à redução da capacidade de intervenção. E contrariamente ao prometido, o Governo reduziu ainda a participação das freguesias nos recursos públicos do Estado.
O Grupo Parlamentar do PCP propõe a reposição das freguesias, garantindo a proximidade do Poder Local Democrático e melhores serviços públicos às populações. Assim, propomos a reposição da Freguesia da Glória no Concelho de Aveiro.
Nestes termos, ao abrigo da alínea n) do artigo 164.º da Constituição da República e da alínea b) do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo-assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Lei:
Artigo 1.º
Criação
É criada no Concelho de Aveiro a Freguesia da Glória, com sede na Glória.
Artigo 2.º
Limites territoriais
Os limites da Nova Freguesia coincidem com os da Freguesia da Glória até à entrada em vigor da Lei n.º 11 – A/2013 de 28 de Janeiro.
Artigo 3.º
Comissão instaladora
1- A fim de promover as ações necessárias à instalação dos órgãos autárquicos da nova freguesia, será nomeada uma comissão instaladora, que funcionará no período de seis meses que antecedem o termo do mandato autárquico em curso.
2- Para o efeito consignado no número anterior, cabe à comissão instaladora preparar a realização das eleições para os órgãos autárquicos e executar todos os demais atos preparatórios estritamente necessários ao funcionamento da discriminação dos bens, universalidades, direitos e obrigações da freguesia de origem a transferir para a nova freguesia.
3- A comissão instaladora é nomeada pela Câmara Municipal de Aveiro nomeará com a antecedência mínima de 30 dias sobre o início de funções nos termos do n.º 1 do presente artigo, devendo integrar:
a) Um representante da Assembleia Municipal de Aveiro.
b) Um representante da Câmara Municipal de Aveiro.
c) Um representante da Assembleia de Freguesia da União das Freguesias de Glória e Vera Cruz.
d) Um representante da Junta de Freguesia da União das Freguesias de Glória e Vera Cruz.
e) Cinco cidadãos eleitores da área da nova Freguesia da Glória, designados tendo em conta os resultados das últimas eleições na área territorial correspondente à nova Freguesia.
Artigo 4.º
Exercício de funções da comissão instaladora
A comissão instaladora exercerá as suas funções até à tomada de posse dos órgãos autárquicos da nova freguesia.
Artigo 5.º
Partilha de direitos e obrigações
Na repartição de direitos e obrigações existentes à data da criação da nova freguesia entre esta e a de origem, considera-se como critério orientador a situação vigente até à entrada em vigor da Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro.
Artigo 6.º
Extinção da União das Freguesias de Glória e Vera Cruz
É extinta a União das Freguesias de Glória e Vera Cruz por efeito da desanexação das áreas que passam a integrar a nova Freguesia da Glória em conformidade com a presente lei.
Assembleia da República, 24 de abril de 2014